MEMÓRIAS DE

CHARLES  FINNEY

 CAPÍTULO XI.

AVIVAMENTO EM KALB

Partindo de Gouverneur, fui para De Kalb, aldeia que ficava uns 25 quilômetros mais para o norte. Ali havia uma pequena igreja presbiteriana que contava com a assistência de um ministro. Ele, porém, parecia não exercer muita influência sobre os membros da igreja. Creio, contudo, que era um homem bom. Comecei a realizar reuniões em várias partes de De Kalb. A aldeia era pequena e muitos habitantes da região moravam a consideráveis distâncias uns dos outros. A região era recém-povoada e as estradas, construídas pouco tempo antes, estavam em péssimo estado. Um avivamento, no entanto, começou imediatamente e progrediu com bastante poder, considerando-se as grandes distâncias que separavam os habitantes do lugar.

Poucos anos antes, ocorrera ali um avivamento dirigido pelos metodistas. Fora acompanhado com bastante emoção e com vários casos do que os metodistas chamavam "cair no poder de Deus". Os presbiterianos haviam resistido ao movimento e, como conseqüência, surgiu entre metodistas e presbiterianos um sentimento de hostilidade. Os metodistas acusavam os presbiterianos de terem rejeitado o avivamento por causa das pessoas que caíam "no poder". Pelo que consegui descobrir, existia verdade na acusação e os presbiterianos haviam decididamente incorrido em erro.

(Nota: Este tipo de "cair no poder" não é o mesmo fenômeno que ocorre hoje em certas igrejas desviadas, pois este povo realmente ficava sem forças após haverem tido alguma visão ou algo forte demais para eles - viam algo concreto. A visão era concreta e era similar ao que aconteceu com Daniel e outros que, após haverem visto algo concreto, ficavam sem forças. O que acontece hoje em muitas igrejas desviadas não é o mesmo fenômeno).

Certa noite, não muito tempo depois de eu ter começado a pregar na aldeia, pouco antes de encerrar meu sermão, vi um homem cair da cadeira perto da porta. As pessoas juntaram-se à sua volta para cuidar dele. Pelo que vi, tive a certeza de tratar-se de um caso de "cair no poder", conforme a expressão usada pelos metodistas, pelo que julguei que se tratava de um irmão daquela denominação. Confesso que receei assistir ao retorno do estado de divisão citado anteriormente. No entanto, tomei conhecimento de que quem era: fora um dos membros mais destacados da igreja presbiteriana. É digno de nota o fato de que, durante esse avivamento, tenham ocorrido vários casos semelhantes entre os presbiterianos e nenhum entre os metodistas. Esse fato gerou tantas confissões e esclarecimentos entre os membros de ambas as igrejas que nasceu entre eles um ambiente de grande cordialidade e bons sentimentos.

Foi durante os trabalhos evangelísticos que desenvolvi em De Kalb que conheci John Fine, de Ogdensburgh. Ele ouvira falar do avivamento que estava acontecendo em De Kalb e viera acompanhado de perto. Fine era um homem rico e muito benevolente. Ofereceu-se para sustentar-me financeiramente como missionário às cidades daquele condado. No entanto, eu não quis assumir o compromisso de pregar em locais predeterminados nem submeter meus trabalhos a determinadas diretrizes. O irmão Fine passou vários dias comigo, fazendo visitas de casa em casa e freqüentando nossas reuniões. Formara-se na Filadélfia e era presbiteriano da Escola Antiga, exercendo a função de presbítero em Ogdensburgh. Quando foi embora de De Kalb, deixou escrita uma carta, que me foi entregue pela dona da casa em que eu me hospedava.

Ao abrir a carta, encontrei dentro dela três cédulas de dez dólares. Poucos dias depois, o irmão Fine voltou a De Kalb e passou dois ou três dias conosco. Acompanhou nossas reuniões e demonstrava grande interesse pela obra. Ao partir, deixou, como antes, outra carta contendo três cédulas de dez dólares. De posse dos sessenta dólares, comprei imediatamente uma carruagem leve, puxada por um só cavalo. Embora já tivesse o cavalo, até então não tinha conseguido comprar uma carruagem. Assim, minha jovem esposa e eu tínhamos de caminhar grandes distâncias até os locais de reunião.

O avivamento provocou grande despertamento na região e, a exemplo de outros irmãos, um dos presbíteros, cujo nome era Burnett, teve o coração transformado. Desfez-se do orgulho e passou por um processo de quebrantamento até que se tornou um homem humilde, muito melhor do que era. Dia após dia, o sentimento religioso se aprofundava na mente do povo.

Num sábado, pouco antes do entardecer, Father, um alfaiate alemão que também comercializava tecidos, vindo de Ogdensburgh, veio visitar-me e informou-me que Fine o enviara para que tomasse minhas medidas a fim de confeccionar um terno. Eu já havia sentido a necessidade de providenciar roupas novas, pois as minhas estavam ficando surradas. Até apresentara o problema a Deus, mas, havia-me esquecido disso. O irmão Fine, no entanto, percebera a condição de minhas roupas e enviara-me o alfaiate, que era católico romano. Convidei-o a passar o domingo comigo, podendo tirar as medidas na segunda-feira. "Já é tarde demais para você voltar esta noite. E, se eu deixar que você tire as medidas agora, só poderá voltar para casa amanhã", disse-lhe. Ele reconheceu que era essa sua intenção. Continuei: "Nesse caso, não vou deixar que faça o trabalho hoje. Se não quiser ficar até segunda-feira de manhã, não vou aceitar que tire as medidas". Ele resolveu permanecer ali.

Naquela tarde, outras pessoas chegaram de Ogdensburgh, aldeia que ficava junto ao rio St. Lawrence, 25 quilômetros mais para o norte. Entre os recém-chegados, estava o sr. Smith, presbítero na mesma igreja que o sr. Fine. O filho do sr. Smith, jovem ainda não convertido e vários outros jovens tinham vindo com ele, a fim de assistirrm à reunião. Smith participou do culto da manhã e foi convidado pelo presbítero Burnett para almoçar em sua casa. O presbítero Burnett era um homem cheio do Espírito Santo e, no caminho, pregou para o presbítero Smith, que na época achava-se muito frio e desinteressado das coisas espirituais. As palavras do sr. Burnett penetraram profundamente em seu coração. Pouco depois de entrarem em casa, foi posta a mesa para o almoço e eles sentaram-se para comer.

Quando se colocaram à mesa, Smith perguntou a Burnett:

— Como você conseguiu essa bênção?

— Parei de mentir para Deus — respondeu Burnett. E explicou: — Durante toda a minha vida cristã andei fingindo e pedia a Deus coisas que não estava realmente disposto a receber. Mas, continuava orando, igual a todo o inundo. Por isso, não era sincero e mentia para Deus. Tão logo tomei a decisão de não mais colocar diante Deus nenhum pedido em que não houvesse sinceridade, ele atendeu-me. E recebi a plenitude do Espírito Santo.

Nesse momento, o sr. Smith, que ainda não começara a comer, afastou a cadeira, caiu de joelhos e começou a confessar que também mentia para Deus e que era hipócrita em suas orações e em sua vida. O Espírito Santo caiu sobre ele imediatamente, enchendo-o com a plenitude divina.

Fiquei sabendo disso quando a congregação já estava reunida para o culto da tarde e eu, do púlpito, anunciava um hino. Com as janelas do salão abertas, pude ouvir que alguém se aproximava falando muito alto. Imediatamente, dois homens entraram no salão: o presbítero Burnett e outro senhor que me era estranho. Logo que entraram no salão, o segundo homem levantou os olhos para mim, subiu ao púlpito e, abraçando-me, exclamou: "Deus o abençoe! Deus o abençoe!". E começou a contar-me, diante da congregação, o que o Senhor acabara de fazer em sua vida. Suas feições brilhavam e sua aparência estava tão mudada que aqueles que o conheciam estavam atônitos com a transformação que presenciavam. Seu filho, ao ouvir o testemunho, levantou-se da cadeira e apressou-se a deixar a reunião. O pai exclamou: "Não saia, meu filho! Quero confessar que nunca o amei de verdade". O poder com que se expressava era espantoso. Os ouvintes sentiram-se tocados por suas palavras e seu filho experimentou um imediato quebrantamento.

Logo depois, o sr. Father, o alfaiate católico romano, levantou-se e declarou: "Preciso contar-lhes o que o Senhor fez em minha alma. Fui criado no catolicismo romano e nunca ousei ler a Bíblia. Diziam-me que, se a lesse, o Diabo literalmente me carregaria. Às vezes, quando arriscava olhar dentro dela, parecia que o Diabo olhava por cima de meu ombro, pronto para levar-me. Vejo, porém, que fui iludido". Ali mesmo, passou a narrar a obra que Deus fizera em sua vida espiritual e os conceitos que o Senhor lhe transmitira a respeito do caminho da salvação em Cristo. Ficou evidente a todos que ele se convertera. Esse fato impressionou a congregação a ponto de eu não conseguir pregar. O culto já tomara o rumo que o Senhor impusera. Sentei-me e vi a salvação da parte de Deus. Pessoa após pessoa contava o que o Senhor fizera em sua vida e o trabalho continuou a desenrolar-se.

Durante toda aquela tarde, as conversões multiplicaram-se na congregação. À medida que uma pessoa após outra se levantava e contava o que o Senhor fizera e continuava a fazer em sua vida, aumentava a impressão que o momento causava sobre o povo. Posso dizer que poucas vezes presenciei um movimento tão espontâneo do Espírito Santo convencendo e convertendo os pecadores. No dia seguinte, o presbítero Smith voltou para sua cidade. Mas, fiquei sabendo que fez muitas visitas pelo caminho e que conversou e orou com muitas famílias. Assim, o avivamento estendeu-se até Ogdensburgh. Não faço idéia do número de conversões ocorridas naqueles dias, mas, grande parte dos colonos do novo município entregou sua vida a Jesus.

Nos primeiros dias de outubro, o sínodo a que eu estava filiado reuniu-se em Utica. Levei minha mulher comigo para que, além de participar da assembléia, pudesse visitar a família de seu pai que morava perto daquela cidade. O irmão Gale, meu professor de teologia, que saíra de Adams pouco tempo depois de eu deixar o lugar, passara a morar num sítio na cidade de Western, condado de Oneida, para recuperar a saúde e ocupava-se como professor de alguns jovens que pretendiam pregar o evangelho. Passei uns poucos dias na reunião do sínodo, empreendendo, depois, a viagem de volta com o propósito de passar pelo meu antigo campo de atuação, no condado de St. Lawrence.

Mal havíamos percorrido vinte quilômetros, encontramos o irmão Gale em sua carruagem, a caminho de Utica. Com um pulo, ele desceu da carruagem e disse: "Deus o abençoe, irmão Finney! Estava a caminho de Utica para ver o irmão. Precisa ir para minha casa e não aceito desculpas. Creio que nunca me converti e outro dia enviei uma carta para Adams, a fim de informar-me de seu endereço, pois queria abrir meu coração a respeito do assunto". Insistiu tanto comigo que consenti e fomos para Western.

Refletindo sobre o que escrevi a respeito dos avivamentos religiosos em Jefferson e no condado de St. Lawrence, não estou certo de ter ressaltado o suficiente e tanto quanto pretendia a atuação do Espírito Santo nesses lugares. Em tudo que vier a dizer sobre os avivamentos dos quais já participei, espero revelar de maneira clara os métodos neles utilizados, que se mostraram tão produtivos.

Já mencionei algumas vezes que um espírito de oração prevalecia nos avivamentos e era uma característica marcante desses movimentos. Era comum ver-se jovens convertidos sendo movidos a orar a favor da conversão das almas ao seu redor. Algumas vezes, eram constrangidos a orar noites inteiras ou até que suas forças se esgotassem. O Espírito Santo operava na mente dos cristãos, que pareciam assumir a responsabilidade de zelar pelas almas. Vigiavam com o máximo de empenho os próprios pensamentos, palavras e ações. Era muito comum, quando se reuniam em algum lugar, todos caírem de joelhos e entregarem-se à oração, em vez de ficarem conversando.

Além de as reuniões de oração se multiplicarem grandemente, de serem bem concorridas e de haver grande espiritualidade nelas, um espírito poderoso de oração envolvia cada cristão particularmente. E muitos deles dedicavam longas horas à oração. Também era comum ajuntarem-se de dois em dois para tomar posse desta promessa: "Também lhes digo que se dois de vocês concordarem na terra em qualquer assunto sobre o qual pedirem, isso lhes será feito por meu Pai que está nos céus" (Mt 18.19). Os que assim combinavam iam juntos a um lugar isolado orar por determinada pessoa. E era maravilhoso ver como sua oração era atendida pelo Senhor. Os resultados de tais orações eram tão notórios que ninguém podia negar que o Senhor estava atendendo àqueles pedidos de dia em dia, de hora em hora.

Caso alguma coisa ameaçasse prejudicar a obra que se realizava, se fosse percebida a mínima aparência de que estava brotando entre os crentes alguma raiz de amargura ou a mínima tendência para o fanatismo ou para a desordem, os cristãos alarmavam-se e, de imediato, iam buscar na oração a direção e o controle divinos para todas as coisas. Muitas vezes, os meios que Deus utilizava para remover obstáculos do caminho, em resposta às orações, eram surpreendentes.

Quanto à minha experiência, posso dizer que, se eu não tivesse o espírito de oração, nada teria realizado. Se eu passasse um só dia ou hora sem esse espírito de graça e de súplica, logo me sentia incapaz de pregar com poder e eficácia ou de conquistar almas pelo testemunho pessoal. E, até agora, minha experiência tem sido a seguinte: tenho mais poder ou menos poder na pregação e na obra pessoal na medida exata do espírito de oração que prevalece em mim. Descobri que, a não ser que mantivesse um relacionamento com Deus que me permitisse o acesso constante a ele em oração, meus esforços para ganhar almas eram inúteis. Mas, enquanto prevalecia esse espírito de intercessão, os resultados eram surpreendentes na pregação, na exortação e no testemunho de vida.

Já mencionei que meu último campo de trabalho no condado de St. Lawrence foi De Kalb e que o avivamento ali foi poderoso entre a população espalhada por aquela região recém-colonizada. Várias semanas antes de partir de De Kalb para participar do sínodo no condado de Oneida, fui poderosamente usado na oração e passei por uma experiência que, na ocasião, era relativamente nova para mim. Vi-me tão sobrecarregado com o peso das almas que fui constrangido a orar sem cessar. Não conseguia sentir sossego em casa e era obrigado a recolher-me ao celeiro, mesmo durante o dia, para orar. Ali podia aliviar os fardos de minha alma e derramar meu coração diante de Deus.

Naquele período, Deus fez-me desenvolver uma fé maravilhosa e passei por experiências que me deixaram alarmado. Quando estava sozinho, esforçava-me e lutava e minha fé vinha à tona a ponto de  sentir-me encorajado a exigir que Deus atendesse à minha oração com base em sua promessa e a dizer que não aceitaria dele uma resposta negativa. Sentia-me perturbado a ponto de empregar linguagem contundente diante de Deus. Tinha tanta certeza de que ele me atenderia e de que a fidelidade dele às suas promessas e a si mesmo tornava impossível que não me escutasse que não raras vezes fui surpreendido falando-lhe desta maneira: "Espero que não imagines que eu vá aceitar uma recusa tua. Tenho em minhas mãos tuas fiéis promessas e não podes negá-las a mim". De tal maneira o Espírito de Deus aplicava suas promessas à minha mente e me revelava o real significado de cada uma delas que pude aplicá-las de modo eficaz à minha vida.

Desde que me converti realmente, passei a permitir que em minhas orações o Espírito me fizesse desenvolver grande apreço pelas promessas divinas, o que nunca teria alcançado apenas por meio dos estudos. O Espírito ensinava-me a aplicar as promessas de tal forma que descobri que elas tinham significado muito maior do que a letra podia revelar. Constatei que os escritores do Novo Testamento, muitas vezes, citavam as promessas do Antigo Testamento de um modo que elas se tornavam bem mais abrangentes que o eram originariamente. Minha experiência em De Kalb foi extraordinária quanto a isso.

Não posso dizer até que ponto a incredulidade me parecia absurda e até que ponto eu tinha certeza de que Deus atenderia às minhas orações — especialmente as proferidas por mim em grande agonia e fé, dia após dia, hora após hora. Não fazia idéia de como seria a forma, a hora ou o local em que a resposta chegaria. Mas, tinha a impressão de que ela era iminente e sentia-me fortalecido na vida espiritual. Vestia a armadura para um forte conflito contra os poderes das trevas enquanto esperava acontecer, sem demora, um novo e poderoso derramamento do Espírito de Deus.

 

CAPÍTULO XII

AVIVAMENTO EM WESTERN

Já me referi à visita que fiz a Western ao regressar do sínodo de Utica. Foi quando começou aquela série de avivamentos que posteriormente ficaram conhecidos como os avivamentos do Oeste. Pelo que eu saiba, eles atraíram primeiro e principalmente a atenção e a oposição do sr. Nettleton e do dr. Beecher, que deram o grito de alerta contra o que chamavam Novos Métodos. Os que trabalhavam com bravura na obra jamais conseguiram saber de onde havia surgido a oposição. Tínhamos certeza de que os irmãos foram enganados pelas informações falsas que lhes chegaram de algum lugar. Nós os considerávamos homens bons e leais, mas, sabíamos que alguém lhes passava informações distorcidas.

Não vou mencionar aqui os esforços que fizemos para descobrir os autores das cartas, ou seja lá o que tenha sido, que levaram aqueles irmãos a opor-se publicamente ao avivamento. De qualquer forma, não descobrimos nada. As igrejas da região eram quase todas presbiterianas. No entanto, havia no condado três pastores congregacionais que formavam a chamada Associação de Oneida, que publicou, na época, um panfleto contra o avivamento. Pelo menos disso tínhamos conhecimento, mas, os panfletos não causaram nenhuma impressão sobre o público, pois ninguém comentava o assunto. No entanto, achávamos que a referida associação tinha muita coisa que ver com a oposição levantada no Leste.

O líder do grupo, rev. William R. Weeks, conforme era conhecido, abraçava e propagava as doutrinas estranhas do dr. Emmons, insistindo muito no que chamava "esquema da eficiência divina". Percebíamos que suas opiniões quanto a esse assunto o levavam naturalmente a considerar suspeito tudo quanto, nas pregações e nos meios usados para promover o avivamento, ia de encontro às idéias que ambos difundiam. Parecia rejeitar qualquer conversão que não levasse a pessoa a ter o mesmo ponto de vista que eles acerca da soberania divina. Como não tínhamos a mínima simpatia por aquelas opiniões, era muito natural que ele desconfiasse das coisas que via acontecerem em nosso meio. No entanto, nunca imaginamos que a oposição movida pelo irmão Nettleton e pelo dr. Beecher tivesse origem nas objeções levantadas pelos membros da referida associação.

Nenhuma resposta pública foi dada às cartas do dr. Beecher que chegaram à imprensa nem a qualquer outra coisa que fosse publicada em oposição ao avivamento. Estávamos ocupados demais com o trabalho espiritual e tínhamos as mãos demasiadamente ocupadas e o coração transbordante, por isso não podíamos desviar nossa atenção para aquelas publicações que descreviam de forma distorcida a natureza da obra. O fato de não darmos nenhuma resposta aos ataques fez com que o povo que morava à distância, sem contato direto com o avivamento, tivesse uma falsa impressão do caráter dos irmãos. Assim, divulgaram-se conceitos errôneos de bons homens ligados ao avivamento, a tal ponto que grandes desordens se manifestavam entre eles e muita coisa deplorável acontecia.

Tudo isso, porém, foi puro engano. Vou relatar, com toda a isenção possível, as características dos avivamentos e os métodos utilizados na sua promoção e revelar, com o melhor de minha capacidade, seu verdadeiro caráter e resultados. Estou consciente da existência de multidões de testemunhas vivas que podem comprovar a veracidade de minhas palavras ou corrigir-me se, em alguma coisa, estiver errado.

Agora passarei a relatar o que aconteceu em Western, onde, pela primeira vez, ocorreu um avivamento no condado de Oneida. Já fiz menção ao fato de o irmão Gale ter mudado para uma fazenda em Western; ali, ele empregou alguns jovens para ajudar a cultivar a fazenda e ocupou-se, também, de ensiná-los, além de tentar recuperar a saúde. Fui diretamente à sua casa e fiquei sendo seu hóspede durante várias semanas. Segundo me recordo, chegamos ali numa quinta-feira e na tarde daquele dia havia uma reunião de oração marcada nas instalações da escola que ficava perto da igreja. Não havia ali nenhum ministro residente e o irmão Gale não conseguia pregar — realmente, ele não mudara para lá como pregador, mas, unicamente por motivo de saúde. Acredito que nunca houvera ali um ministro, a não ser em tempo parcial e, durante algum tempo antes de minha ida para lá, não havia pregações regulares na igreja presbiteriana. Nessa igreja, havia três presbíteros e uns poucos membros, mas, a igreja era muito pequena e, a vida espiritual, pouco desenvolvida. Parecia não haver vida, nem coragem, nem dinamismo da parte dos cristãos e nada estava sendo feito para que fosse confirmada a conversão dos ímpios e nem a santificação da igreja.

Depois do almoço, o irmão Gale convidou-me para a reunião de oração e atendi ao convite. Quando lá chegamos, os irmãos pediram que eu assumisse a direção da reunião, mas, recusei-me dirigi-la, porque imaginava que só estaria ali aquela tarde e preferia escutá-los orar e falar, em vez de participar efetivamente da reunião. Um dos presbíteros iniciou o culto lendo um capítulo da Bíblia. Depois, foi cantado um hino. Seguiu-se uma longa oração, que não posso de fato definir como oração, exortação ou narrativa. A pessoa que orou contou ao Senhor que realizavam aquela reunião todas as semanas, durante muitos anos, sem receber nenhuma resposta às suas orações. Fiquei grandemente chocado com aquelas declarações.

Terminada a oração, outro presbítero tomou o lugar. Ele dirigiu os cânticos e entregou-se a outra oração prolongada, na qual repassou quase a mesma ladainha, com declarações que complementaram o que o primeiro omitira. Orou, então, o terceiro presbítero, seguindo a mesma linha. Àquela altura, eu podia dizer, como Paulo, que meu espírito estava profundamente indignado. Haviam chegado ao fim e estavam para encerrar a reunião. Mas, um dos presbíteros pediu-me que desse uma palavra antes do encerramento. Coloquei-me em pé e aproveitei, como texto, as declarações dos presbíteros. Pareceu-me que Deus me inspirara a examiná-los de modo extraordinário.

Quando me coloquei em pé, não tinha a mínima idéia do que falaria, mas, o Espírito de Deus veio sobre mim com tamanho poder que retomei as orações, declarações e confissões que haviam feito e comecei a analisá-las minuciosamente. Desmascarei cada uma delas e perguntei aos presbíteros se haviam combinado fazer aquela reunião para zombar de Deus, ao concluir que toda a culpa pelo que se passava ali devia ser atribuída à soberania divina.

De início, notei que todos pareciam zangados. Alguns deles, mais tarde, disseram que estavam a ponto de levantar-se e sair. Mas, fui seguindo o caminho de tudo que fora dito nas orações, até que o presbítero que iniciara a reunião irrompeu em lágrimas e exclamou: "Irmão Finney, essa é a pura verdade!" Em seguida, caiu de joelhos e chorou em voz alta. Foi o sinal para o quebrantamento geral. Homens e mulheres colocaram-se de joelhos. Talvez não houvesse na reunião mais que uma dúzia de pessoas, porém eram as mais influentes na igreja. Todos choraram, confessaram e quebrantaram o coração diante de Deus. A cena continuou, creio eu, por uma hora e raras vezes presenciei quebrantamento semelhante.

Tão logo se recuperaram, rogaram-me que ficasse até domingo para entregar-lhes a mensagem. Senti que se tratava da voz do Senhor e concordei em permanecer ali. Isso aconteceu na noite da quinta-feira. Na sexta-feira, minha mente estava grandemente perturbada. Fui várias vezes à igreja para orar em particular e mantive naquele dia intensa comunhão com Deus. A notícia espalhou-se e, no domingo, a igreja estava lotada. Preguei o dia inteiro e Deus desceu com grande poder sobre a congregação. Ficou manifesto diante de todos que a obra da graça começara ali. Aceitei convites para pregar em várias partes da cidade durante a semana, em instalações escolares, no centro e a obra propagou-se, dia após dia.

Nesse mesmo tempo, senti minha mente mais inclinada à oração e descobri que o espírito de oração predominava ali, principalmente entre as irmãs. Descobri que a sra. Brayton e a sra. Harris, ambas casadas com presbíteros da igreja, estavam muito envolvidas na oração. As duas tinham filhos não convertidos ainda e mantinham-se tão firmes na intercessão por eles que, para mim, já era o sinal da promessa da conversão de seus filhos. A sra. Harris, no entanto, tinha a saúde muito frágil e havia muito tempo não se arriscava a sair para uma reunião na igreja. No entanto, como naquele dia o tempo estava bem agradável, ela estava presente na reunião a que me referi e parecia ter captado a inspiração que tomara conta do culto, levando-a para casa consigo.

Creio que foi na semana seguinte que passei em casa do sr. Harris e vi que ele estava pálido e agitado. "Irmão Finney, acho que minha esposa vai morrer. Está com a mente tão atormentada que não consegue repousar, nem de dia nem de noite, entregando-se inteiramente à oração. Passa a manhã inteira no quarto, gemendo e debatendo-se enquanto ora e temo que isso acabe com suas forças", disse-me. Tendo ouvido minha voz na sala, a sra. Harris saiu do quarto. Em seu rosto havia um brilho celestial, que parecia não ser deste mundo. Suas feições estavam iluminadas com uma esperança e com uma alegria que evidentemente provinham dos céus. Ela exclamou: "Irmão Finney, o Senhor chegou até nós! Essa obra irá espalhar-se por toda a região! Uma nuvem de misericórdia paira sobre nós e veremos tão grande obra de graça, como jamais presenciamos". O marido parecia surpreendido e confuso, sem saber o que dizer. Era novidade para ele, mas, não para mim. Já vira cenas semelhantes e tinha certeza de que o espírito de oração prevalecia ali.

A obra continuou, propagou-se e deu bons resultados, até que comecei a ter inconfundíveis indicações do Espírito de Deus de que estava na hora de partir. Rome ficava a quase 15 quilômetros dali. A meio do caminho, havia uma pequena aldeia chamada Elmer's Hill. Ali havia uma escola, um prédio grande onde passei a pregar semanalmente e logo ficou evidente que a obra se propagava em direção a Rome e Utica. Cerca de quatro quilômetros a nordeste de Rome, havia um povoado de nome Wright's Settlement. Um grande número de pessoas vinha de Rome e de Wright's Settlement para participar das reuniões em Elmer's Hill e, em pouco, tempo a obra surtiu efeito entre eles.

Preciso, no entanto, relatar uns poucos incidentes que ocorreram no avivamento em Western. A sra. Brayton, esposa de um dos presbíteros, a quem já me referi, tinha uma família grande. Seus filhos não eram convertidos ainda. Pelo que entendi, um dos rapazes, que morava em Utica, professava a religião. O restante morava em casa. Tratava-se de uma família muito amável e a filha mais velha, em especial, era notoriamente considerada pela família um modelo de virtude. Fui à casa deles várias vezes para conversarmos, mas, percebi que a família mostrava-se tão sensível às opiniões da moça que não consegui desfazer seu conceito a respeito dela. Era óbvio que fora levada a crer que era uma crente quase perfeita. Sua vida era tão irrepreensível que havia dificuldade em convencê-la de pecado. A segunda filha também era uma moça muito simpática, mas, não se considerava à altura da mais velha quanto à amabilidade e ao caráter.

Certo dia, enquanto eu falava com Sarah, a mais velha, na tentativa de levá-la a ver a si mesma como grande pecadora a despeito de sua moralidade, Cynthia, a segunda filha, disse-me: "Sr. Finney, acho que está sendo severo demais com Sarah. Se o senhor falasse assim comigo, eu acharia que era merecedora; mas, não acho que ela mereça ouvir isso". Derrotado em várias tentativas de convencer Sarah e levá-la à conversão, resolvi aguardar o momento certo e aproveitar alguma oportunidade quando a encontrasse fora de casa ou sozinha. A oportunidade de encontrá-la longe de casa não se fez esperar muito. Conversei com ela e, com a ajuda de Deus, consegui que fosse removida de seu coração aquela casca de hipocrisia e Sarah foi poderosamente convencida de pecado. O Espírito tocou-a com grande poder.

A família ficou surpreendida e muito aflita por causa de Sarah, mas Deus foi trabalhando a consciência dela, até que, depois de uns poucos dias de resistência, ela mostrou-se totalmente quebrantada e veio a participar do Reino — talvez a mais admirável conversão que testemunhei. Suas convicções eram tão firmes que, quando realmente se converteu, mostrou-se forte na fé e cristalina na compreensão do dever e da verdade. Tornou-se imediatamente uma grande potência para o bem entre suas amigas e conhecidas.

Contudo, Cynthia, a segunda filha, ficou alarmada quanto à própria condição e demonstrou estar muito ansiosa pela salvação. A mãe, a sra. Brayton, parecia lutar dia e noite pela alma dela. Minhas visitas à família eram diárias, até duas ou três vezes no mesmo dia. Os filhos convertiam-se um após o outro e esperávamos, dia após dia, ver Cynthia apresentar-se como convertida. No entanto, por razões desconhecidas, ela relutava. Tornou-se claro que ela estava resistindo ao Espírito.

Certo dia, encontrei-a sentada sozinha na sala. Perguntei como estava passando e ela respondeu: "Sr. Finney, estou perdendo minha convicção. Não me sinto mais tão preocupada com meu destino espiritual". Nesse momento, abriu-se uma porta e a sra. Brayton entrou na sala. Contei-lhe o que Cynthia acabara de dizer e a mãe ficou tão chocada que caiu prostrada no chão, gemendo em voz alta. Não conseguia levantar-se e havia tanto sofrimento em sua súplica que não tive dúvidas de que Cynthia precisava converter-se naquele momento. A sra. Brayton não conseguia dizer muita coisa, mas, seus gemidos e lágrimas testemunhavam extrema agonia de espírito. Tão logo essa cena se desenrolou, o Espírito de Deus veio manifestamente sobre Cynthia e ela caiu de joelhos. Antes mesmo de levantar-se, mostrou ter sido quebrantada e tornou-se, pelo que sei, uma crente tão completa quanto Sarah. Assim, todos os filhos e filhas do casal Brayton converteram-se na época, menos a mais jovem, uma criancinha, que veio a converter-se depois. Um dos filhos do casal é pregador do evangelho há muitos anos.

Entre outros incidentes, lembro-me de uma jovem que residia numa parte distante da cidade e vinha ao culto no centro quase todos os dias. Conversando com ela várias vezes, percebi que estava profundamente convicta — quase desesperada, até. Dia após dia eu esperava receber dela a notícia de que se convertera, mas, ela permanecia estacionada em sua decisão, embora seu desespero aumentasse dia a dia. Sua atitude levou-me a suspeitar de que havia alguma coisa errada em sua casa. Perguntei-lhe se seus pais eram crentes e ela respondeu que eram membros da igreja. Perguntei-lhe se freqüentavam os cultos e ela respondeu que sim, aos domingos.

— Seus pais não participam de outras atividades na igreja?

— Não — respondeu ela.

— Sua família realiza o culto doméstico?

— Não, senhor — disse ela. — Já o fizemos, porém faz muito tempo que não realizamos mais esse tipo de reunião.

Aquela resposta revelou-me de imediato a pedra de tropeço. Perguntei-lhe quando poderia achar seu pai e sua mãe em casa. Ela disse que os pais raras vezes saíam de casa e podiam ser encontrados lá a qualquer momento. Fui visitar a família na manhã seguinte por considerar que era extremamente perigoso deixar o caso como estava. Penso que aquela jovem era filha única. Pelo menos, era a única que havia em casa. Achei-a naquele dia muito abatida e afundada no desespero, então falei à mãe:

— O Espírito do Senhor está lutando com sua filha.

Ela concordou, pois era o que também lhe parecia. Perguntei-lhe se estava orando pela filha e a resposta que me deu fez-me entender que ela nem sabia o que isso significava. Perguntei-lhe pelo marido. Respondeu que ele estava no campo, trabalhando. Pedi que o chamasse. No momento em que entrava, eu disse-lhe:

— Está vendo a situação de sua filha?

— Acho que ele está-se sentido muito mal — respondeu.

— E você está cuidando dela? Está em oração por ela?

A resposta revelou que, se algum dia ele foi convertido, agora não passava de um desviado sem a mínima comunhão com Deus. Perguntei:

— Então vocês não oram juntos, em família?

— Não, senhor.

— Pois bem! — retruquei. — Vejo que sua filha está curvada com o peso da convicção espiritual e fiquei sabendo que o problema está aqui, em sua casa. Vocês fizeram com que o Reino dos céus se fechasse contra vossa filha. Nem vocês entram, nem permitem que ela entre. A incredulidade e o mundanismo estão impedindo a conversão dela e arruinarão a alma de vocês. Vocês precisam arrepender-se. Não pretendo sair desta casa até que você e sua mulher se arrependam e deixem de ser pedras de tropeço para vossa filha. Vocês devem restabelecer o culto familiar, levantar o altar que foi derrubado. E agora, meu caro senhor, poderia, por favor, colocar-se de joelhos com sua mulher e orar? Prometam que a partir de agora cumprirão vosso dever de estabelecer o culto familiar e de buscar a Deus!

Fui tão sincero com eles que os dois começaram a chorar. Eu não estava brincando quando lhes disse que não sairia daquela casa até que se arrependessem e restabelecessem o culto familiar, tinha fé nisso. Estava convicto de que a obra precisava ser feita naquela hora. Ajoelhei-me e comecei a orar. Eles imitaram-me e choraram copiosamente. Confessei em nome deles o que podia e procurei levá-los a Deus, argumentando a favor deles. Foi uma cena comovente. O casal deu mostras de estar quebrantado e confessou seus pecados. Antes de nos levantarmos, a filha também alcançou libertação e converteu-se. Ao levantar-se, regozijava-se em Cristo. Muitas orações atendidas e muitas cenas interessantes aconteceram durante aquele avivamento.

Para a glória de Deus, não posso omitir o relato de um incidente vivido por mim mesmo. Durante o período que passei na casa o sr. Gale, eu pregava e orava quase continuamente. Tinha o costume de orar em voz alta. Para impedir que minha voz importunasse outras pessoas, estendi um couro de búfalo no celeiro e, quando não estava fazendo visitas ou pregando, passava ali boa parte do tempo em oração. O irmão Gale já me advertira várias vezes sobre o perigo de eu sofrer um esgotamento. Mas, o espírito de oração pairava sobre mim e eu não queria resistir a ele. Pelo contrário, entregava-me livremente à sua operação e derramava sem reservas minha alma diante de Deus.

Estávamos em Novembro e o frio estava chegando. O irmão Gale e eu havíamos passado o dia fora, usando a carruagem e o cavalo dele para visitar os interessados. Chegamos a casa e fomos até o estábulo acomodar o animal. Depois de tirar os arreios, em vez de entrar em casa, fui até o celeiro derramar minha alma sobrecarregada diante de Deus. Orei até sentir que o fardo fora tirado de mim. Sentia-me tão exausto que caí sobre o couro de búfalo e fui dominado pelo sono. Creio ter adormecido assim que senti a mente aliviada e percebi que o fardo desaparecera, a julgar pelo fato de não ter a mínima consciência de algum intervalo de tempo entre o fim da luta e o desmaio.

O irmão Gale entrou em casa e minha demora deixou-o alarmado. Ele subiu a escada do sótão e chamou: "Irmão Finney, o irmão morreu?" Acordei sem saber por que estava ali dormindo e sem a menor idéia de quanto tempo passara ali. Mas, de uma coisa eu sabia: minha mente estava calma e, minha fé, inabalável. Senti total confiança de que a obra progrediria.

Já mencionei o fato de ter sido ordenado por um presbitério. Isso aconteceu antes da divisão da igreja presbiteriana nas assembléias conhecidas como Escola Antiga e Escola Nova. A doutrina de Jonathan Edwards, no que se refere à capacidade e incapacidade moral e natural, era sustentada quase universalmente na região onde comecei meu ministério. Devo repetir também que, conforme orientação recebida do presbitério, o sr. Gale acompanhara-me, até certo ponto, em meus estudos teológicos e sustentava a doutrina da impossibilidade de o descrente obedecer a Deus. Esse assunto, do modo em que era por ele apresentado, bem como pela maioria dos ministros presbiterianos daqueles dias, dava a impressão de que a pessoa precisava esperar o tempo determinado por Deus para a salvação. Se ela pertencesse ao grupo dos eleitos, o Espírito de Deus, no momento prefixado, a converteria. Caso contrário, nada que ela mesma ou alguém pudesse fazer a seu favor lhe traria o benefício da salvação.

Sustentavam a doutrina de que a depravação era inerente ao gênero humano; que a vontade, embora estivesse livre para a prática do mal, era totalmente incapaz de praticar qualquer bem; que a obra transformadora do Espírito Santo era uma operação física na substância ou essência da alma; que o pecador era passivo no processo da regeneração, até que o Espírito Santo implantasse em sua natureza um novo princípio e que todos os esforços empreendidos pelo homem mostravam-se inúteis; que, a rigor, não existiam meios de regeneração, pois, esta seria uma recriação da alma pela atuação do Espírito Santo; que a expiação era limitada aos eleitos; que a salvação dos não-eleitos era impossível.

Em meus debates com o sr. Gale, sempre sustentei o inverso de todas essas doutrinas. Afirmava que a depravação moral era forçosamente uma atitude voluntária da mente e que consistia na submissão da vontade à gratificação dos desejos ou, como a Bíblia se expressa, à concupiscência da carne, à medida que esta se opõe às exigências da lei de Deus. Para ser coerente com isso, sustentava que a influência do Espírito de Deus sobre nossa alma era moral, ou seja, persuasiva; que Cristo o representava como um mestre; que sua obra era convencer e converter o pecador por meio dos ensinos divinos e da persuasão moral.

Tinha, ainda, a convicção de que existiam meios de regeneração e que as verdades da Bíblia, pela própria natureza, tinham o propósito de levar o pecador a abandonar a iniqüidade e voltar-se para Deus. Sustentava, também, a necessidade de uma adaptação dos meios ao fim pretendido: a inteligência devia ser iluminada e o pecador precisava ser conscientizado sobre a enorme distância entre o que é considerado racional e a depravação moral. A ele devia ser revelado, com clareza, quão perverso é o pecado e quão desastrosas são suas conseqüências. Só assim o pecador entenderia a missão de Cristo, que então lhe poderia ser apresentada com toda a ênfase. Por esse método, a tendência seria ele converter-se a Cristo e, depois de ter feito isso com fé e oração, podíamos esperar que o Espírito Santo cooperasse conosco.

Além disso, sustentava que o Espírito Santo operava no pregador, revelando-lhe verdades e capacitando-o a apresentá-las na proporção e na ordem certas para levar os ouvintes à conversão. Compreendia então — como compreendo agora — que a incumbência e a promessa que Cristo fez aos apóstolos e à Igreja são aplicáveis nos dias atuais: "Vão e façam discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a obedecer a tudo o que eu lhes ordenei. E eu estarei sempre com vocês, até o fim dos tempos" (Mt. 28.19,20).

No meu modo de ver, essa incumbência era entregue a mim, a todos os ministros e à Igreja, com a promessa de que, se nos lançássemos à obra com sinceridade de intenções e com um espírito de devoção, Cristo estaria conosco, por meio de seu Espírito e tornaria eficientes os esforços que empreendêssemos pela salvação das almas. Parecia-me, então, de acordo com o que sempre julguei, que a maior falha do ministério e da Igreja na promoção do Reino de Deus era, em grande medida, a falta de uma adaptação adequada dos meios àqueles fins. Ouvi os sermões do sr. Gale durante muitos anos e nunca vi em nenhum deles qualquer esforço para levar alguém à conversão.

Não me parecia que houvesse esse propósito. Descobri que podia dizer a mesma coisa a respeito de todos os outros sermões que ouvira.

Certa ocasião, falei com o sr. Gale a respeito disso. Disse-lhe que, em minha opinião, de todas as causas já pleiteadas, a causa espiritual tinha o menor número de defensores capazes e que, se os advogados adotassem o mesmo método dos que pleiteiam a causa de Cristo diante dos pecadores para defender seus clientes, jamais ganhariam uma causa. Naquela época, porém, o sr. Gale não conseguia enxergar isso. Sua opinião era que não havia a mínima conexão entre a regeneração e o modo de o Espírito Santo transformar o coração.

Para ilustrar o que estou dizendo, relato aqui a experiência que vivi no centro de um grande avivamento, pouco depois de começar a pregar, envolvendo um jovem aluno do seminário teológico de Princeton. O pastor que dirigira a igreja antes de mim, um senhor já idoso, morava ali e estava ansioso para ouvir uma pregação feita pelo jovem que chegara de Princeton. Na ocasião, a igreja não tinha pastor, de modo que eu era o único encarregado do púlpito e conduzia as atividades de acordo com meus critérios. Aquele pastor disse ter conhecido o jovem antes de ele cursar teologia e desejava muito verificar seu progresso. Por isso, pediu-me que o deixasse pregar. Respondi que receava entregar-lhe o púlpito, já que temia que ele viesse a prejudicar a obra, deixando de pregar o que o povo precisava ouvir. O ancião respondeu:

— Ele irá pregar a verdade. E, em matéria de religião, o irmão sabe, não há conexão entre os meios e os fins. Por isso, não há perigo de ele prejudicar a obra.

— A doutrina que defendo não é essa — retruquei. — Acredito haver tanta conexão entre os meios e os fins, em matéria de religião, quanto na natureza. Por isso mesmo, não posso permitir que ele pregue.

Com alguma freqüência, vejo-me obrigado a tomar atitudes como essa. E, às vezes, ao fazê-lo, alguém fica ofendido. Mas, não ouso agir de outra forma. Em meio a um avivamento espiritual, quando as almas precisavam de atendimento bem específico, adaptado à condição e às necessidades do momento, sempre evitei a responsabilidade de colocar no púlpito alguém inclinado a pregar sermões grandiosos, pois com certeza não teria preocupação de adaptar-se às necessidades do povo. Por causa dessa atitude, sou acusado de achar que prego melhor que os outros.

Preciso confessar que, realmente, supunha atender às necessidades de minha congregação melhor que outros pregadores, que menos ou nada sabiam a respeito delas. Acreditava, também, que meus sermões eram mais proveitosos que os sermões lidos no púlpito. Por essa razão, achava que Cristo colocara a obra em minhas mãos, entregando-me a tarefa de adaptar os meios aos fins e que, por isso, não devia convocar pregadores alheios à situação para instruir os crentes. Agia tal como gostaria de ser tratado. Não me permitia chegar a um lugar onde outro pregador já estivesse trabalhando para promover o avivamento. Não ousava interferir quando pouco ou nada sabia a respeito do povo.

Já fiz menção ao fato de, em Western, eu ter sido hóspede do sr. Gale e de este ter chegado à conclusão de que nunca fora convertido. Ele revelou-me o que se passava em sua mente: acreditara piamente, conforme sempre insistira comigo, que Deus não abençoaria meus esforços na obra por eu não querer pregar o que ele considerava a verdade do evangelho. Já mencionei, também, que pouco tempo depois de eu ter recebido minha licença de pregador, preguei no púlpito do sr. Gale, apresentando meus conceitos sobre o evangelho e sobre como ele deveria ser pregado. Foi quando ele declarou que ficaria envergonhado se alguém soubesse que ele tivera participação em minha formação teológica.

Ele supunha (e insistia nisso) que eu não devia esperar a companhia do Espírito Santo em meus esforços na obra do Senhor. Mas, quando descobriu que o Espírito Santo realmente era a minha companhia constante na causa do evangelho, foi levado a crer que se enganara e isso levou-o a rever suas opiniões como pregador. Assim, chegou à conclusão de que nunca se convertera e que não entendia o evangelho. Durante o avivamento em Western, compareceu a quase todos os cultos e, depois de algumas semanas, contou-me que assumira outra atitude em relação à sua alma e mudara suas opiniões a respeito do evangelho, concluindo que eu estava com a razão. Disse dar graças a Deus por eu não me ter deixado influenciar pelas opiniões dele, pois meu ministério estaria arruinado. A partir de então, dentro dos limites de sua saúde, tornou-se um obreiro muito útil ao avivamento naquela região.

A doutrina que eu insistia em defender, segundo a qual a ordem de obedecer a Deus implica capacidade para assim fazer, criou em alguns lugares, de início, oposição considerável. Negar, também, a idéia de que a depravação moral era física, ou seja, da natureza, para afirmar, como eu fazia, que o pecado era inteiramente voluntário, além de acreditar na influência do Espírito para ensinar, persuadir e convencer e, logicamente, na influência moral, eram novidades doutrinárias para muitos. De fato, mais tarde, em 1832, quando eu atuava em Boston pela primeira vez, o dr. Beecher disse que nunca ouvira alguém pregar que a influência do Espírito fosse moral, opondo-se à influência física. Por isso, os ministros e os crentes em geral consideravam a doutrina da influência moral do Espírito uma negação total à obra do próprio Espírito.

Embora eu insistisse muitíssimo e incessantemente na atuação divina para a convicção e a regeneração, bem como para o exercício da fé cristã, demorou muito tempo até cessarem as acusações de que eu negava a obra do Espírito Santo na regeneração e na conversão. Diziam que eu ensinava que a pessoa se convertia a si mesma e se regenerava a si mesma. Não raramente eu era repreendido por dirigir-me ao pecador como se a culpa de sua impenitência fosse exclusivamente dele e por conclamá-lo à submissão imediata. Eu, porém, persistia nessa linha de pensamento e os ministros e os demais cristãos percebiam que Deus a confirmava como verdadeira e a abençoava com a salvação de milhares de almas. Terei ocasião, em outros contextos, de voltar ao assunto, por isso irei deixá-lo de lado, no momento, a fim de continuar minha narrativa.

Já mencionei o fato de os habitantes de Rome e Wright's Settlement comparecerem em grupos numerosos às reuniões realizadas em Elmer's Hill e também falei do efeito da Palavra sobre eles. Para mim, essa era a indicação de que o avivamento caminhava rapidamente naquela direção.

 

CAPÍTULO XIII

O AVIVAMENTO EM ROMA

Nesse período, o rev. Moses Gillett, pastor da Igreja Congregacional em Rome, ao ficar sabendo o que o Senhor estava realizando em Western, veio acompanhado pela srta. Huntington, uma das irmãs de maior destaque em sua igreja, a fim de ver a obra de perto. Os dois ficaram impressionados com o que viram. Percebi que o Espírito de Deus os comovia até os alicerces mais profundos do coração. Poucos dias depois, o irmão Gillett e a srta. Huntington voltaram a Western.

A srta. Huntington era uma jovem cristã muito devota e sincera. Nessa segunda visita, disse-me o irmão Gillett: "Irmão Finney, parece-me que recebi uma Bíblia nova. Não conseguia entender as promessas como as entendo agora. Nunca as havia sentido ao meu alcance. Não consigo descansar, pois minha mente transborda com o assunto e as promessas são novas para mim". Essa conversa prolongou-se por algum tempo e entendi que o Senhor preparava o rev. Gillett para uma grandiosa obra em sua congregação.

Pouco depois, quando o avivamento estava em pleno vigor em Western, o sr. Gillett convenceu-me a trocar de púlpito com ele por um dia. Consenti, mas aceitei com relutância. No sábado anterior ao dia em que faríamos a troca, já a caminho de Rome, lastimei ter concordado em fazer a permuta. Achava que prejudicaria grandemente a obra em Western, porque o irmão Gillett pregaria seus sermões à maneira tradicional, os quais, conforme eu bem sabia, não atenderiam às necessidades do povo. No entanto, eu sabia que os membros da igreja estavam orando e que a troca de púlpitos não faria cessar a obra, embora talvez a retardasse.

Fui a Rome e preguei três vezes no domingo. Para mim, ficou perfeitamente claro que a Palavra surtiu grande efeito. Percebi que muitas cabeças baixavam e muitas pessoas andavam encurvadas sob profunda convicção de pecado. De manhã, preguei sobre este texto: "A amizade com o mundo é inimizade com Deus" (Tg 4.4). À tarde e à noite, abordei temas semelhantes, mas não recordo os textos utilizados. Na segunda-feira de manhã, esperei até que o irmão Gillett voltasse de Western e relatei-lhe minhas impressões a respeito da congregação. Ele não parecia convencido de que a obra estava começando com tanto poder quanto eu supunha. Mas, queria fazer um apelo aos interessados e fazia questão que eu estivesse na reunião.

Já fiz menção aos recursos que eu empregava na promoção dos avivamentos: muita oração — em particular e em público — pregação a grupos de pessoas, conversas pessoais e visitação de casa em casa. Tudo era feito com o mesmo propósito e, quando o grupo de interessados se tornava muito grande, eu marcava reuniões especiais e convidava-os a comparecerem. Então, dava-lhes instruções que supriam diretamente suas necessidades. Esses eram os únicos meios que eu utilizara até então para levar almas a Cristo. O irmão Gillett, sabendo disso, pretendia convocar a reunião, requerendo, para isso, minha presença. Confirmei minha presença e pedi-lhe que fizesse circular um aviso pela aldeia de que haveria na segunda-feira à noite uma reunião para os interessados no avivamento. O plano era eu ir a Western e voltar ao entardecer para pegar o povo de surpresa. Ficara combinado que o pastor Gillett não informaria o povo de que eu estaria presente. A reunião seria realizada na casa de um dos diáconos.

Quando chegamos, vimos que a grande sala de visitas, que ficava na parte anterior da casa, estava lotada até sua capacidade máxima. O sr. Gillett olhou ao redor, surpreso e obviamente agitado, porque descobriu que os membros de maior influência de sua congregação estavam ali, bem como os jovens da melhor camada social da cidade. Passamos algum tempo tentando conversar com eles, mas, logo percebi sentimentos tão profundos que havia o perigo de uma explosão incontrolável de emoções. Por isso, falei ao sr. Gillett: "Não é viável continuar a reunião nestas condições. Farei algumas observações que julgo necessárias e depois encerrarei a reunião. Vou exortá-los a dominar seus sentimentos de maneira que, ao voltarem para casa, não andem gritando pela rua".

Nada fora dito ou feito para suscitar o emocionalismo naquela reunião. Todos os sentimentos brotaram espontaneamente. A obra foi feita com tanto poder que poucas palavras bastaram para levar os homens mais fortes a contorcerem-se nos assentos como se uma espada lhes tivesse atravessado o coração.

Era impossível, para quem nunca havia tido semelhante experiência, dar-se conta do poder da verdade nas mãos do Espírito Santo. Era realmente uma espada e uma espada de dois gumes. A dor que ela produzia ao esquadrinhar a alma, com poucas palavras, gerava uma aflição quase insuportável. O sr. Gillett ficou muitíssimo agitado. Pálido e muito inquieto, perguntava:

— O que faremos? O que faremos? Coloquei a mão em seu ombro e sussurrei:

— Fique calmo. Fique calmo, sr. Gillett.

Passei, então, a dirigir-me àquelas pessoas com a máxima suavidade e clareza. Chamei-lhes a atenção indicando-lhes o único remédio e assegurando que esse remédio estava sempre à disposição e era totalmente eficaz. Indiquei-lhes Cristo como Salvador do mundo e esforcei-me para que entendessem o que lhes dizia, enquanto eles pudessem suportar — o que realmente durou pouco tempo. O irmão Gillett ficou tão agitado que fui até ele e, tomando-o pelo braço, falei: "Vamos orar!" Ajoelhamo-nos no centro da sala e comecei a orar em voz baixa, sem paixão, mas intercedendo junto ao Salvador para que ele, pelo poder de seu sangue, levasse todos aqueles pecadores a aceitar salvação.

A agitação aumentava a cada momento e já se podia ouvir nitidamente os soluços, os suspiros e a respiração profunda das pessoas ali reunidas. Por isso, encerrei a oração e levantei-me rapidamente. Todos colocaram-se de pé e falei: "Agora, por favor, voltem para casa, sem trocar uma palavra uns com os outros. Não digam nada. Procurem manter silêncio, sem deixar que haja entre vocês manifestações barulhentas de emoção. Já que não podem dirigir-se uns aos outros sem controlar a emoção, não troquem uma palavra sequer enquanto retornam para casa".

Nesse momento, um jovem chamado Wright, funcionário da loja do sr. Huntington, um dos jovens mais destacados da região, quase desmaiou, a ponto de apoiar-se nos jovens que estavam perto dele. Mas, eles tiveram, também, uma espécie de desmaio e todos caíram juntos. A cena provocou alguns gritos, mas, fiz com que todos se aquietassem e disse aos jovens: "Por favor, abram bem aquela porta e deixem que todos saiam em silêncio". Eles fizeram o que eu pedi. Não gritaram, mas saíram soluçando e suspirando e seus suspiros e soluços podiam ser ouvidos até depois de estarem na rua.

O sr. Wright contou-me mais tarde que foi obrigado a tapar a boca com as mãos, usando toda a força dos braços, até chegar em casa, por causa da grande aflição que sentia. Manteve silêncio até entrar em casa, mas, então não pôde mais conter-se. Fechou a porta, caiu ao chão e irrompeu em prantos, sentindo sua terrível condição. A família veio acudi-lo rapidamente e a convicção espiritual espalhou-se entre todos eles. Fiquei sabendo, posteriormente, que cenas semelhantes haviam acontecido em várias famílias. Conforme se verificou depois, várias pessoas converteram-se naquela reunião e voltaram para casa tão jubilosas que só com dificuldade conseguiam dominar-se.

Na manhã seguinte, tão logo o dia clareou, as pessoas começaram a chegar à casa do sr. Gillett, pedindo-nos que visitássemos sua família que, conforme diziam, estava dominada por forte convicção espiritual. Tomamos às pressas o café da manhã e começamos as visitas. Logo que saímos à rua, as pessoas correram ao nosso encontro, rogando que entrássemos na casa delas. Embora só pudéssemos visitar uma casa de cada vez, sempre que entrávamos em uma delas os vizinhos corriam e precipitavam-se para dentro dela, enchendo o cômodo em que estávamos, normalmente o maior da casa. Ali permanecíamos um breve espaço de tempo e dávamos-lhes alguma instrução. Passávamos, então, para outra casa e outra vez o povo seguia-nos. Descobrimos que aquelas pessoas viviam uma situação extraordinária. As conversões eram tão profundas e abrangentes que, às vezes, ao entrar numa casa, encontrávamos alguns ajoelhados, outros prostrados no tapete e outros ainda banhando as têmporas dos amigos com cânfora, para que estes não viessem a desmaiar nem — como receavam — a morrer.

Saímos para visitar, conversar e orar, de casa em casa, até o meio-dia. Eu disse, então, ao sr. Gillett:

— Não vamos dar conta do trabalho. Precisamos marcar uma reunião. Não temos condições de visitar todas as casas e não estamos conseguindo atender às necessidades espirituais do povo.

Ele concordou comigo, mas, surgiu um impasse: onde realizar a reunião? O sr. Flint, homem piedoso, dirigia um hotel na época, que ficava numa esquina no centro da cidade. O refeitório do hotel era bem grande. Por isso, o sr. Gillett resolveu:

— Vou entrar e pedir licença para fazer ali a reunião.

Não houve nenhuma dificuldade em consentirem que usássemos o salão. O sr. Gillett percorreu as escolas e avisou que à uma da tarde haveria uma reunião no refeitório do hotel do sr. Flint. Fomos para casa, almoçamos às pressas e saímos para a reunião. Vimos que as pessoas se dirigiam ao local indicado — algumas iam correndo, surgindo de todos os lados. Ao chegar ali, notamos que o refeitório, embora grande, estava superlotado. Homens e mulheres de todas as idades apinhavam o recinto. A reunião seria semelhante à da noite anterior. O sentimento era esmagador e a Palavra de Deus revelou ser verdadeiramente a espada do Espírito. Os homens que pareciam ter nervos mais fortes sentiram-se tão atingidos pela pregação que não resistiram: só conseguiam voltar para casa com a ajuda dos amigos. A reunião durou quase até o anoitecer e resultou em muitas conversões. Esse foi o meio que o Senhor usou para estender sua obra em todas as direções.

Preguei no fim da tarde e o sr. Gillett marcou outra reunião no fórum, para a manhã seguinte. O espaço era bem maior que o do refeitório, embora a localização não fosse tão central. No entanto, no horário marcado, o fórum estava superlotado e passamos boa parte do dia instruindo o povo. Dentro do possível, procurávamos adaptar o que falávamos às condições dos ouvintes e o resultado foi muito poderoso. Preguei de novo ao entardecer e o sr. Gillett marcou mais uma reunião, agora na igreja.

Se estou bem lembrado da ordem em que os fatos aconteceram naquela noite, combinamos uma reunião de oração e de conferência, buscando para isso uma escola espaçosa. Mal começamos e as emoções avolumaram-se tanto que, para evitar uma explosão indesejável de sentimentos opressivos, propus ao sr. Gillett que encerrássemos a reunião e despedíssemos o povo, recomendando um período de oração individual ou familiar, conforme preferissem. Aos não-crentes, exortamos que não fossem dormir sem antes entregarem o coração a Deus.

A partir de então, pelo que me lembro, a obra desenvolveu-se tanto que preguei vinte noites seguidas e duas vezes aos domingos. Nesse período, nossas reuniões de oração eram realizadas na igreja. Durante o dia, em determinado horário, realizávamos a reunião de oração e, em outro horário, uma reunião com os interessados em saber mais sobre o avivamento. Por causa do grande progresso, realizávamos todos os dias uma reunião de oração, uma reunião para esclarecimento e um culto de pregação, à noite.

Nessas reuniões, parecia que todo o ambiente estava revestido de reverência e de temor espiritual e todos sentiam a presença de Deus. Pastores vindos das cidades vizinhas declaravam-se atônitos com o que viam e ouviam. E tinham razão. As conversões multiplicavam-se tão rapidamente que era impossível identificar todos os convertidos. Por isso, todas as noites, ao encerrar o sermão, eu pedia aos que se haviam convertido naquele dia que viessem à frente e permanecessem junto do púlpito, a fim de termos com eles uma breve palestra. Todas as noites, o número e as diferentes classes de pessoas que vinham à frente surpreendiam-nos.

Numa das reuniões de oração matutinas, o salão térreo da igreja estava lotado. Coloquei-me de pé e estava falando à congregação quando um não-crente, comerciante, entrou no recinto. Foi avançando pelas fileiras de assentos até encontrar um lugar vazio, bem à minha frente, perto de onde eu pregava. Permaneceu sentado alguns momentos e então caiu ao chão como se tivesse levado um tiro. Contorcia-se e gemia de modo terrível. Fui até à ponta do banco e constatei que era pura agonia de espírito.

Um médico, que se dizia cético, sentado perto dele, saiu de seu lugar e prestou assistência ao homem, examinando-lhe o pulso e acompanhando seu estado geral por alguns momentos. Sem dizer nada, afastou-se e encostou a cabeça contra uma coluna que sustentava a galeria, mostrando-se muito agitado. Mais tarde, revelou que percebera imediatamente tratar-se de aflição de espírito e aquilo removera totalmente seu ceticismo. Pouco depois, converteu-se. Reunimo-nos em oração a favor do homem caído e, pelo que pude perceber, antes que saísse da reunião sua angústia já se dissipara e ele regozijava-se em Cristo.

Outro médico, que também era cético, embora fosse um homem muito amável, tinha uma filhinha, Hannah e era casado com uma mulher de muita oração. A pequena Hannah, menina de uns oito ou nove anos, tinha forte convicção de pecado e sua mãe demonstrava grande interesse pelo estado espiritual da filha. O pai, de início, ficou bastante indignado e disse à mulher: "Religião é assunto muito elevado para mim. Jamais consegui entendê-la. E agora você vem-me dizer que esta criancinha entende a questão a ponto de sentir-se, em sã consciência, convencida de pecado? Não creio nisso. Não caio nessa! Não suporto tal coisa! Isso é fanatismo, é loucura!" Apesar disso, a mãe da menina manteve-se firme em oração.

Fiquei sabendo, posteriormente, que o médico, ainda sentindo muita raiva, montou seu cavalo e cavalgou vários quilômetros para ver um paciente. Ao longo do caminho, conforme depois ele mesmo revelou, foi pensando no assunto e tudo ficou claro em sua mente. O plano da salvação em Cristo tornou-se compreensível para ele. Assim, não teve mais dificuldade para crer que uma criança era capaz de entendê-lo. Achou estranho o fato de o assunto até então haver-lhe parecido tão misterioso. Lamentava profundamente ter falado daquela maneira à sua mulher e desejou chegar logo em casa a fim de retratar-se. Ao chegar, já era um homem diferente. Contou à mulher a transformação que ocorrera em sua maneira de pensar e encorajou a filhinha a aceitar a Cristo. Desde então, pai e filha têm sido crentes sinceros, vivendo uma longa vida na prática do bem.

Nesse avivamento, no entanto, assim como em outros a que já assisti, Deus fez coisas espantosas em termos de sua justiça. Certo domingo, na hora em que eu e o sr. Gillett descíamos do púlpito e estávamos para sair da igreja, um homem chegou apressado e pediu-nos que fôssemos a certo lugar, onde um homem caíra morto. Estando eu ocupado em conversa com alguém, o sr. Gillett foi sozinho. Terminada a conversa, fui até a casa do sr. Gillett, chegando lá pouco antes de ele retornar. Ao chegar, ele relatou-me que três homens que se opunham à obra haviam-se reunido naquele domingo e passaram o dia bebendo e ridicularizando o trabalho que fazíamos. Continuaram assim até que, de repente, um deles caiu morto. Quando o sr. Gillett chegou à casa onde estavam os três, tomou conhecimento dos fatos e disse: "Vejam! Não há a mínima dúvida de que Deus abateu este homem e de que este homem foi para o inferno". Os companheiros ficaram sem palavras. Não sabiam o que responder. Era óbvio que a própria conduta deles provocara aquele golpe terrível da indignação divina.

A obra progrediu até alcançar quase toda a população. A grande maioria dos advogados, comerciantes e médicos e quase todos os homens de destaque na sociedade, bem como quase toda a população adulta da aldeia passaram a apoiar o avivamento, especialmente os que já pertenciam à igreja do sr. Gillett que disse antes de minha partida: "No tocante à minha congregação, o Milênio já chegou. Todos os membros já se converteram. Os sermões pregados por mim no passado já não têm a mínima aplicação para eles, pois todos são crentes". Posteriormente, o sr. Gillett relatou-me que, durante os vinte dias que passei em Rome, houve 500 conversões no município, ou seja, uma média de 25 por dia. Nos cultos vespertinos, quando eu pedia que aqueles que se haviam convertido durante o dia fossem à frente a fim de declarar sua fé, a congregação levantava-se, em vez de retirar-se, para ver quem viria à frente e expressava o máximo espanto ao ver os que respondiam ao apelo.

Enquanto a obra avançava, houve muita comoção em Utica e alguns tendiam a ridicularizar o trabalho que se desenrolava em Rome. Henry Huntington, que morava em Rome, era um destacado cidadão — talvez, devido à sua riqueza e conhecimento, o principal homem daquela sociedade. Era, no entanto, um cético quanto ao avivamento e tinha convicções unitaristas. Era um homem de boa moral, respeitável e de grande cultura. Mantinha suas opiniões sem as impor a ninguém e pouquíssima coisa falava a respeito. No primeiro domingo em que preguei ali, ele estava presente e, conforme relatou mais tarde, ficou tão atônito com minha pregação que resolveu não assistir a mais nenhum culto. Foi para casa e declarou aos seus familiares: "Aquele homem está louco e não duvido de que possa incendiar a cidade!" Não apareceu nos cultos durante duas semanas. A obra, porém, progredia tanto que seu ceticismo ficou abalado. Seu estado de perplexidade era grande.

O sr. Huntington era presidente de um banco em Utica e toda semana, em determinado dia, participava de uma reunião de diretoria. Numa dessas reuniões, um dos diretores questionou-o a respeito da situação em Rome, achando que todos na cidade estavam enlouquecendo. O sr. Huntington observou: "Cavalheiros, apesar de tudo que vocês possam dizer, existe algo de notável na situação em Rome: nenhum poder ou eloqüência humana produziu o que estamos presenciando. Não consigo entender. Vocês dizem que a situação logo se acalmará. Sem dúvida, o grau de agitação que agora prevalece em Rome diminuirá em breve, senão o povo ficará louco. Mas não há explicação — baseada em nenhuma filosofia — para semelhante estado de espírito, a não ser que se leve em conta a participação divina".

Depois que o sr. Huntington deixou de vir aos cultos, alguns entre nós resolveram orar juntos, fazendo dele o alvo especial das orações. O Senhor concedeu-nos uma fé poderosa enquanto orávamos por ele e tínhamos a certeza de que Deus estava operando na vida daquele homem. Assim, certa noite, o sr. Huntington estava de volta. Quando ele entrou no recinto, o sr. Gillett, que estava comigo no púlpito, sussurrou em meu ouvido: "Irmão Finney, o sr. Huntington chegou. Espero que o irmão não fale nada que o ofenda".

Naqueles dias, eu era obrigado a pregar totalmente de improviso, por não ter uma única hora na semana, além de minhas horas de sono, para organizar meus pensamentos. Eu costumava chegar quando a congregação já estava reunida e deixar que a impressão que ela me causasse sugerisse o tema do sermão. Penso que, no momento em que o sr. Huntington entrou, eu não tinha a mínima idéia a respeito do que pregaria. Assim que olhei para a congregação, escolhi o assunto e então preguei. A Palavra aplicou-se poderosamente e, de acordo com minha esperança e intenção, afetou fortemente o coração do sr. Huntington. Penso que naquela mesma noite, ao final do culto, quando pedi que viessem à frente os convertidos daquele dia, o sr. Huntington atendeu ao apelo, de modo muito deliberado e solene e deu testemunho de ter entregue o coração a Deus. Parecia humilde e arrependido e sempre entendi sua conversão como genuína.

A situação na aldeia e na vizinhança era tal que ninguém chegava à região sem sentir reverente temor ou sem ter a impressão solene de que Deus operava ali de modo especial e maravilhoso. O incidente que relato a seguir pode ilustrar o que estou dizendo.

O xerife do condado residia em Utica. Existiam dois fóruns no condado — um em Rome e outro em Utica. Conseqüentemente, o xerife, Charles C. Broadhead, sempre tinha assuntos a resolver em Rome. Ele contou-me, mais tarde, que tinha ouvido falar a respeito dos acontecimentos na aldeia e que ele e outros hóspedes do hotel haviam zombado das coisas que lhes contaram. Certo dia, ele precisou ir a Rome. Sentiu-se feliz em ter obrigações para cumprir ali, pois queria ver com os próprios olhos as coisas sobre as quais tanto comentavam e, também, avaliar a situação. Viajou em seu trenó puxado por um só cavalo, sem nenhuma idéia específica na mente. Porém, ao atravessar o chamado canal Antigo, a cerca de um quilômetro e meio da cidade, veio sobre ele um temor tão forte que ele teve a sensação de que Deus permeava a atmosfera inteira a seu redor. E a sensação aumentava à medida que se aproximava da aldeia.

Chegou ao hotel do sr. Flint e o empregado da estrebaria veio para guardar o cavalo. Broadhead observou que o moço parecia sentir exatamente o que ele estava sentindo, como se tivesse receio de falar. Entrou no hotel e encontrou o cavalheiro com o qual tinha assuntos a tratar. Disse que todos se mostravam tão impressionados que seria difícil tratar de negócios. Contou-me que, em vários momentos do breve período que passou ali, precisou levantar-se da mesa e ir até a janela, a fim de distrair-se e evitar o choro. Percebeu que as demais pessoas sentiam a mesma coisa. Terminou rapidamente o que tinha a fazer e retornou a Utica. Segundo me contou, nunca mais fez comentários levianos a respeito da obra em Rome. Ele converteu-se poucas semanas depois, em Utica. Contarei os pormenores desse fato no momento próprio de minha narrativa.

Já mencionei Wright's Settlement, aldeia que ficava uns quatro quilômetros a nordeste de Rome. Ali, o avivamento teve efeito poderoso e a maioria de seus habitantes foi levada à conversão. Os métodos utilizados no trabalho em Rome eram os mesmos empregados anteriormente: pregação, orações públicas e particulares, exortações e conversas pessoais. Ê difícil conceber um estado de sentimento espiritual tão profundo e abrangente sem nenhum caso de desordem, tumulto, fanatismo ou qualquer outra coisa censurável como se via em Rome. Ainda vivem hoje, por todas as partes desta nação, muitos dos que se converteram naquele avivamento. Eles podem dar testemunho de que naquelas reuniões predominava a boa ordem e a reverência e tomávamos o máximo cuidado para evitar qualquer coisa que, depois, fôssemos lamentar.

A obra do Espírito era tão espontânea, tão poderosa e tão irresistível que tornava-se necessário exercer a máxima cautela e sabedoria na condução das reuniões, a fim de impedir que alguma explosão emocional esgotasse a sensibilidade dos outros habitantes do lugar e viesse a provocar uma reação negativa da parte deles. Mas, como sabem todos os que presenciaram os fatos ali desenrolados, isso não aconteceu. A partir de então, foi mantida uma reunião de oração, que começava ao nascer do sol. Ela estendeu-se por vários meses — mais de um ano, acredito — e era uma reunião bem freqüentada e tão interessante quanto possa ser uma reunião desse tipo.

O estado moral do povo foi tão grandemente transformado que, conforme observava freqüentemente o irmão Gillett, aquele não parecia ser o mesmo lugar. Realmente, o avivamento fizera uma limpeza ali. Os que permaneciam em pecado eram obrigados a cobrir a cabeça, envergonhados. Nenhuma imoralidade era tolerada abertamente ali, por um momento sequer. Só apresentei aqui um esboço muito tênue do que realmente aconteceu em Rome. Colocar diante do leitor uma descrição fiel de todos os fatos comoventes que ocorreram naquele avivamento ocuparia um volume inteiro sobre o assunto, porque foram muitos.

Devo dizer algumas palavras a respeito do espírito de oração que predominava em Rome. Acho que foi no sábado em que fui para lá, saindo de Western, na troca de púlpito com o sr. Gillett, que me reuni com a igreja à tarde, na casa de cultos. Esforcei-me para levá-los a entender que Deus atenderia imediatamente às orações, desde que cumprissem o que ele requeria e, principalmente, que cressem que ele atenderia aos pedidos colocados diante dele. Notei que a congregação demonstrava muito interesse no que dizia e as feições revelavam um desejo intenso de ver suas orações respondidas.

Lembro-me de que, pouco antes do encerramento da reunião, fiz a seguinte observação: "Creio realmente que, se vocês se unirem nesta tarde em oração, com fé, visando ao derramamento imediato do Espírito, receberão uma resposta do céu mais rápida que uma carta de Albany pelo correio mais rápido que existe". (Isso aconteceu antes de existirem estradas de ferro). Falei com grande entusiasmo, conforme sentia em meu coração e notei que a congregação ficara assustada com minha declaração de sinceridade e fé no tocante à resposta imediata de Deus às orações. A verdade é que tinha visto tantas dessas respostas que não senti a mínima dúvida ao falar no assunto. Nenhum dos membros da igreja manifestou-se na ocasião, mas, fiquei sabendo, depois de a obra ter começado, que três ou quatro deles — o sr. George Huntington, irmão de Henry Huntington e outros dois ou três irmãos — passaram no gabinete do sr. Gillett e confessaram-se tão impressionados com o que eu dissera que resolveram aceitar literalmente o que Deus prometia em sua Palavra.

Um deles contou-me, depois, que o Espírito de Deus outorgara-lhes uma fé maravilhosa no sentido de orarem por uma resposta imediata e acrescentou: "A resposta realmente veio mais rapidamente que pelo correio de Albany".

A aldeia fervilhava em oração. Por onde quer que se passasse, ouvia-se alguém orando. Onde se juntassem dois ou três crentes, eles com certeza estariam orando. Onde quer que se reunissem, oravam. Onde quer que um pecador não convertido manifestasse alguma oposição, dois ou três irmãos ou irmãs logo concordavam em fazer dele o objeto especial de sua oração e era notável ver que Deus os atendia imediatamente.

Residia em Rome a mulher de um oficial do Exército dos Estados Unidos, filha de um cidadão de destaque na cidade. Ela manifestava forte oposição à obra e, segundo se relatava, fazia severas críticas ao movimento. Por isso, acabou tornando-se objeto específico de oração. Esse fato chegou ao meu conhecimento pouco tempo antes de ocorrer o que vou narrar. Creio que, nesse caso, algumas das irmãs mais atuantes na igreja fizeram daquela senhora o alvo de suas orações, por tratar-se de uma pessoa de influência notável na região. Era uma mulher culta, com grande força de caráter, que impunha sua vontade e, naturalmente, fez sentir sua oposição. Mas, tão logo se soube dessa oposição, um espírito de oração foi direcionado para ela e o Espírito de Deus assumiu o controle.

Certo dia, à tardinha, quase imediatamente depois de eu ter tomado conhecimento do caso, após o encerramento do culto e depois de a congregação ter voltado para casa, o sr. Gillett e eu permanecíamos no local de cultos, conversando com algumas pessoas que sentiam grande peso pela convicção de pecado. Enquanto elas se retiravam e estávamos para fazer o mesmo, o sacristão aproximou-se de nós e disse: "Uma senhora ficou presa naquele compartimento ali e não consegue sair. Poderiam ajudá-la?" Fomos para lá e deparamos com a senhora de quem falei, totalmente oprimida pela convicção de pecado.

O compartimento estivera lotado e ela tentara sair com os demais, porém, sendo a última e estando sem condições de ficar em pé, acabou no chão, sem ser notada pelos demais, que já tinham ido embora. Nós a ajudamos a levantar-se, conversamos um pouco com ela e descobrimos que o Senhor a afligira com indizível convicção de pecado. Depois de orar e exortá-la solenemente a entregar seu coração a Cristo imediatamente, despedi-me dela. Creio que foi o irmão Gillett quem a ajudou a chegar em casa, que ficava a poucas dezenas de metros dali. Soubemos depois que, chegando ali, ela entrou sozinha num quarto, onde passou a noite. Era uma noite fria de inverno, mas, ela trancou-se no quarto e ficou ali até o dia clarear. Ao sair, declarou ter feito de Cristo a sua esperança. E, segundo as notícias que fui recebendo, revelou ter experimentado uma firme conversão.

Acho que devo mencionar, também, a conversão da sra. Gillett, ocorrida durante aquele avivamento. Era irmã do missionário Mills, um dos primeiros da Junta Americana. Era uma mulher belíssima, consideravelmente mais jovem que o marido e sua segunda esposa. Em tempos anteriores, antes de casar-se com o sr. Gillett, passara várias semanas sob convicção de pecado e esteve às portas de um abalo mental. Se não me falha a memória, ela acreditava não pertencer ao grupo dos eleitos e, por isso, achava que não haveria salvação para ela. Pouco depois de iniciado o avivamento em Rome, passou a sentir novamente profunda convicção da parte do Espírito do Senhor.

Era uma senhora refinada e gostava de vestir-se bem. E, como era normal entre as mulheres, usava nos cabelos e no corpo alguns singelos ornamentos — nada que eu considerasse pedra de tropeço em sua vida espiritual. Estando hospedado na casa dos Gilletts, conversei repetidas vezes com ela, à medida que sua convicção aumentava, mas, nunca me ocorreu que o hábito de arrumar-se bem pudesse ser empecilho à sua conversão. Porém, quanto mais poderosa se tornava a obra, tanto mais sua aflição se tornava alarmante. O sr. Gillett, sabedor do que acontecera com ela anteriormente, ficou bastante preocupado, pois não queria vê-la recair em depressão. Lançava, então, todos os seus receios sobre mim, buscando minha orientação. Quase todas as vezes que eu chegava em casa, lá vinha ele ao meu encontro, implorando que eu orasse por ela e declarando que aquela aflição estava além da resistência dela.

Parecia que a sra. Gillett caminhava rapidamente para o desespero, mas, percebi que ela passara a depender muito de mim. Por isso, procurava evitá-la. Mas, todas as vezes que eu voltava para casa, depois de fazer visitas aos necessitados, tão logo ela ouvia-me entrar, corria a pedir oração e orientação, como se esperasse alguma coisa da minha parte. Assim continuou, dia após dia, até a ocasião em que entrei em casa e fui direto para o gabinete. Como de costume, logo ela estava à minha frente, pedindo que eu orasse e queixando-se de que não havia salvação para ela. Levantei-me abruptamente e deixei-a ali, sem orar por ela. Expliquei-lhe que não haveria proveito nenhum em minhas orações, pois ela ficara dependente delas. Diante disso, ela pareceu estar a ponto de desmaiar.

Mesmo assim, deixei-a sozinha e passei abruptamente do gabinete para a sala. Depois de alguns momentos, ela atravessou correndo o saguão, chegou à sala com o rosto iluminado e exclamou: "Oh, sr. Finney! Achei o Salvador! Achei o Salvador! O irmão não sabe que eram os enfeites de meus cabelos que impediam minha conversão? Percebi que, quando eu orava, eles surgiam diante de mim e eu era tentada a abrir mão deles. Pensava que isso era ninharia e que Deus não se importava com coisas assim. Pensei que se tratava de tentação satânica. E os enfeites vinham-me à lembrança sempre que eu procurava entregar meu coração a Deus. Quando o irmão me deixou ali sozinha, fui levada ao desespero. Lancei-me de joelhos ao chão e os enfeites vieram de novo à tona. Então eu disse: 'Vou-me desfazer dessas coisas para sempre!'". Ela continuou: "Renunciei aos enfeites, odiando-os, pois interpunham-se no caminho de minha salvação. Tão logo prometi abandoná-los, o Senhor revelou-se à minha alma. Oh! Não sei como não percebi isso antes! Este era o grande empecilho à minha conversão: meu apego aos enfeites! E eu não sabia disso!"

 

CAPÍTULO XIV.

O AVIVAMENTO EM UTICA, NOVA IORQUE

Depois de eu ter passado cerca de vinte dias em Rome, um dos presbíteros da igreja do sr. Aikin em Utica, homem de grande destaque e influência, faleceu. Fui até aquela cidade para acompanhar o sepultamento. O sr. Aikin dirigiu o culto fúnebre e fiquei sabendo por ele que o espírito de oração já era uma realidade em sua congregação e naquela cidade. Contou-me que uma das senhoras mais distintas da igreja, sentindo profunda preocupação com o estado espiritual da igreja e do povo daquela cidade, passara dois dias e duas noites em oração até suas forças esgotarem-se. Sentia verdadeira dor na alma, a tal ponto que, quando se via completamente sem forças, só conseguia suportar o fardo que pesava sobre seu espírito quando alguém a acompanhava em oração, ajudando-a a exprimir seus anseios diante de Deus.

Eu compreendia a situação e disse ao sr. Aikin que a obra já começara no coração daquela senhora. Ele, é claro, reconheceu o fato e queria que eu começasse imediatamente a trabalhar com ele e com a congregação. Não demorei a pôr mãos à obra e o avivamento começou de imediato. A Palavra surtiu efeito e o lugar encheu-se da influência do Espírito Santo. Os salões onde realizávamos as reuniões ficavam superlotados, noite após noite, e a obra propagou-se poderosamente, especialmente nas duas congregações presbiterianas, numa das quais o sr. Aikin era pastor, sendo que a outra era pastoreada pelo sr. Brace. Eu dividia meu tempo entre as duas igrejas.

Pouco depois de começar a obra em Utica, fiz uma observação ao sr. Aikin: nunca vira o sr. Broadhead, a quem já me referi, nos cultos. Mas, poucas noites depois, antes de eu começar a pregar, enquanto estava sentado ao púlpito, o sr. Aikin sussurrou ao meu ouvido que o sr. Broadhead acabara de chegar. E apontou o homem que percorria o corredor em busca de um lugar para sentar-se. Escolhi o texto bíblico e passei a falar à congregação. Momentos depois, notei que o sr. Broadhead se levantava do banco e, com movimentos decididos, envolvia-se em sua capa pesada e ajoelhava-se. Seu gesto despertou a atenção dos que estavam próximos dele e, conhecendo-o, causou considerável agitação naquela parte do templo.

O xerife continuou de joelhos o culto inteiro. Depois, recolheu-se ao seu quarto no hotel — ele tinha cerca de cinqüenta anos de idade e era solteiro. Mais tarde, contou-me que sua mente ficara sob grande peso, depois de sair do culto, ao lembrar-se de minha pregação. Eu conclamara a congregação a aceitar a Cristo exatamente conforme ele é apresentado nos Evangelhos. A questão da imediata aceitação a Cristo e a situação do pecador diante de Deus e do relacionamento deste com o pecador foi o assunto do sermão naquele dia.

O sr. Broadhead revelou que gravara na mente as questões levantadas por mim, dizendo para si mesmo: "Minha alma, você permitirá que isso aconteça? Aceitará a Cristo, abrirá mão do pecado e de si mesma? Quer fazer isso agora?" Em seguida, jogou-se na cama em total agonia de espírito. Passou a questionar-se a si mesmo e exortou sua alma a aceitar a Cristo "aqui e agora". Disse que, naquele exato momento, a aflição afastou-se dele de modo tão repentino que adormeceu e só acordou horas mais tarde. Foi, então, que sentiu a alma repleta da paz e descanso em Cristo. A partir de então, passou a trabalhar com sinceridade para o Senhor entre seus conhecidos.

Como já disse, ele hospedava-se num hotel, dirigido na época pelo sr. Shepard. O Espírito operou poderosamente naquele estabelecimento. O próprio sr. Shepard não demorou a tornar-se alvo das orações e converteu-se, bem como vários de seus familiares e hóspedes. De fato, aquele hotel, o maior do município, passou a ser um centro de influência espiritual e muitos converteram-se ali. As diligências, que passavam pela estrada cheias de passageiros, faziam parada no hotel. Era tão poderosa a impressão causada naquele ambiente que, segundo fiquei sabendo, houve vários casos de pessoas que pararam ali apenas para o café da manhã, o almoço, o jantar ou só para pernoitar e foram poderosamente convencidas de pecado e convertidas antes de partirem. Chegou-se a dizer que ninguém podia ficar em Utica ou em Rome, ou mesmo passar por uma dessas cidades, sem tornar-se consciente da presença de Deus. Uma influência divina parecia permear o ambiente das duas cidades e a atmosfera inteira parecia espessamente trespassada do vigor da presença divina.

Certo comerciante de Lowville, do condado de Lewis, chegou a Utica para comprar alguns produtos e fazer negócios. Passou no hotel onde o sr. Broadhead estava hospedado e descobriu que toda a conversa na cidade girava em torno de um assunto que o deixava bastante irritado, já que não era convertido. Aborrecido, declarou que não podia fechar negócios ali, porque tudo era religião. Ia voltar para casa, pois não podia entrar numa loja sem que lançassem sobre ele alguma coisa de religião. Não dava mais para negociar com ninguém ali. Falou em retornar à sua cidade ainda naquela noite e penso que ele disse isso na presença de alguns jovens convertidos que se hospedavam no hotel, especialmente na presença do sr. Broadhead.

A diligência partiria tarde da noite. Ele foi, então, até o bar para pagar sua conta, visto que à hora em que a diligência passasse por ali o sr. Shepard com certeza já se teria recolhido. O comerciante desejava liquidar sua conta enquanto o hoteleiro estivesse acordado. O sr. Shepard contou-me que, enquanto fechava a conta, sentira a consciência tocada e sugeriu a alguns hóspedes que fizessem do comerciante o alvo de suas orações naquele momento. Pelo que entendi, levaram-no ao aposento do sr. Broadhead, conversaram e oraram com ele e antes que a diligência chegasse o comerciante já estava convertido. Logo de seguida sentiu-se tão preocupado com o estado espiritual do povo de sua cidade que, quando a diligência chegou, comprou uma passagem e foi imediatamente para casa.

Assim que chegou em casa, contou aos familiares o que o Senhor fizera por sua alma e convidou-os a orar com ele. O comerciante era um cidadão de grande destaque em Lowville. Muito franco em sua maneira de falar, tratou logo de proclamar por todos os lados o que o Senhor fizera em sua vida. Seu testemunho foi tão poderoso que causou tão reverente temor que aquela cidade em pouco tempo experimentou um avivamento.

Foi no meio ao avivamento em Utica que, pela primeira vez, ficamos sabendo da oposição que surgia no Leste. O sr. Nettleton escreveu algumas cartas ao sr. Aikin, com quem eu cooperava, nas quais deixava bem claro que o pastor estava muito enganado quanto à natureza do avivamento. O sr. Aikin mostrou-me as cartas, que, como já era esperado pelo seu teor, foram passadas como circulares entre os ministros da região. Entre elas, havia uma em que o sr. Nettleton especificava as coisas que considerava censuráveis em nossos métodos. Porém, embora soubéssemos que nada daquilo havia sido feito, nem se sabia de nenhuma das coisas de que o sr. Nettleton se queixava, não nos preocupamos mais com as cartas — apenas líamos e as passávamos adiante. O sr. Aikin, no entanto, respondeu por conta própria a algumas delas, para assegurar ao sr. Nettleton de que nenhuma das coisas a que ele se referia era praticada. Eu confirmei a palavra do sr. Aikin: as reclamações de Nettleton não tinham fundamento.

Não me lembro se ele reclamava do fato de, ocasionalmente, as mulheres orarem nas reuniões sociais. Quer tenha sido essa uma de suas queixas, quer não, a verdade é que, em algumas circunstâncias, as senhoras, algumas bem influentes na comunidade, sentindo a unção espiritual, faziam orações públicas nas reuniões que mantínhamos diariamente de casa em casa. Que eu saiba, nenhuma oposição foi declarada a isso, nem em Utica, nem em Rome. Esse costume não era algo que eu tivesse introduzido ali e não sei se, antes disso, essa prática era observada ou não. Na realidade, pelo que sei, esse assunto não gerou grande polemica na região.

Já me referi ao sr. Weeks, pastor congregacional que sustentava as doutrinas mais radicais sobre a eficiência divina e como se opunha abertamente ao avivamento. Para maior esclarecimento àqueles que talvez não saibam que houve quem sustentasse tais doutrinas, afirmo que o sr. Weeks, bem como os que com ele concordavam, defendiam o princípio de que tanto o pecado quanto a santidade eram, na mente humana, resultado de um ato direto de poder onipotente. Deus fazia dos homens pecadores ou santos, segundo sua vontade soberana, tão irresistível quanto a ação divina na própria criação. Na realidade, acreditavam eles, Deus era o único agente atuando no Universo e todas as criaturas agiam tão-somente conforme eram compelidas a agir por atos de irresistível onipotência. Cada pecado no Universo, tanto de homens quanto de demônios, resultava de um ato direto de poder irresistível da parte de Deus. Os defensores de tal doutrina empregavam sofismas para justificar suas idéias através da Bíblia Sagrada.

O conceito de conversão e regeneração defendido pelo sr. Weeks era de que o mesmo Deus que criara os homens pecadores levava-os à regeneração, para provar que tinha o direito de fazer isso para a própria glória, ou os enviava ao inferno por causa dos pecados que criara neles diretamente ou os obrigava a cometer por força de sua onipotência. Weeks não confiava, de modo algum, na conversão de quem não adotasse esse conceito. Os que leram os nove sermões do sr. Weeks a respeito do assunto perceberão que não há engano no que digo sobre as opiniões dele. Mas, sendo o conceito proposto pelo sr. Weeks adotado em medida considerável pelos ministros e outros cristãos professos da região, a oposição movida por ele e mais alguns ministros cresceu em grande medida.

A obra, porém, prosseguiu com grande poder e pessoas de todas as classes eram levadas à conversão, a ponto de o sr. Aikin, no decurso de poucas semanas, relatar a conversão de quinhentas pessoas, a maioria delas, penso eu, pertencente à sua congregação. Na época, os avivamentos eram novidade na região e a grande parte do povo ainda não se convencera de que era obra de Deus. As pessoas, de início, não demonstravam temor reverente diante deles, conforme passou a acontecer tempos depois. Parece que a impressão predominante era de que logo desapareceriam, revelando não ter sido mais que mera manifestação de instinto animal. Contudo, não estou querendo dizer que essa era a concepção dos que se sentiam atraídos pelo movimento.

No decorrer daquele avivamento, certo fato causou poderosa impressão. O presbitério de Oneida reuniu-se justamente quando o avivamento estava no auge. Entre os ministros, estava ali um pastor idoso chamado Southword (James Southworth), que eu não conhecia. Ele percebeu que a mente da população estava totalmente voltada para os assuntos espirituais: havia oração e conversas sobre temas religiosos por todos os cantos, até mesmo nas lojas e nos demais lugares públicos. O sr. Southworth nunca testemunhara um avivamento nem o que viu e ouviu ali. Era escocês e penso que não havia passado ainda muito tempo em terras americanas. Na tarde de sexta-feira, pouco antes de ser suspensa a sessão, colocou-se em pé e fez um discurso inflamado contra o avivamento. Suas palavras chocaram e magoaram os cristãos ali presentes. O desejo deles era colocar o rosto no chão e rogar ao Senhor que não permitisse que o pronunciamento de Southworth provocasse maiores danos.

Ao pôr-do-sol, o presbitério entrou em recesso. Alguns foram para casa e outros passaram a noite ali, em oração. Houve muitos clamores a Deus para que ele desfizesse qualquer influência maligna resultante do discurso do sr. Southworth. Na manhã seguinte, o sr. Southworth foi encontrado morto em sua cama. O fato produziu outro grande choque, mas, dessa vez sob o aspecto da justiça. A morte do sr. Southworth serviu não apenas para contrabalançar a influência que seu discurso causara sobre o presbitério. No decurso daquele avivamento, tendo ouvido o que o Senhor estava realizando, pessoas vindas de grandes distâncias, atraídas pela curiosidade ou pela admiração, vinham ver em primeira mão o que estava acontecendo e muitas delas convertiam-se a Cristo. Entre elas estava o dr. Garret Judd [Gerrit Parmele Judd], enviado às ilhas Sandwich como missionário pouco tempo depois, tornando-se bem conhecido por aqueles que amam a obra missionária. Ele pertencia à congregação do sr. Weeks, a quem já me referi. Seu pai, o velho dr. Judd, era um crente sincero. Ele veio a Utica e passou a ser grande simpatizante do avivamento.

Mais ou menos na época da conversão do dr. Judd, a jovem Fanny Thomas, que viera da região da Nova Inglaterra, chegou a Utica nas circunstâncias que descrevo a seguir. Ela era professora numa escola secundária nos arredores de Newburgh, NY. Os jornais davam ampla cobertura ao avivamento em Utica e região. A srta. Thomas e outras pessoas, admiradas com o que era noticiado, ficaram curiosas para ver de perto o que acontecia. Ela decretou um recesso de dez dias na escola e embarcou numa diligência para Utica.

Ao passar pela rua Genesee, a caminho do hotel onde se hospedaria, viu que o nome Briggs Thomas constava da fachada de um estabelecimento comercial. Sendo totalmente estranha ao lugar, não fazia idéia de ter algum parente naquela localidade. Porém, depois de informar-se a respeito de quem era Briggs Thomas, passou a considerar a possibilidade de ele ser mesmo parente seu e enviou-lhe um recado, dizendo ser filha do sr. Thomas — e citou o nome de seu pai — informando que estava hospedada no hotel e gostaria de conhecê-lo. Briggs Thomas, que prontamente foi atendê-la, constatou ser ela uma parente distante e convidou-a a hospedar-se em sua casa. Ela aceitou e ele, crente sincero, passou a levá-la a todas as reuniões, tentando despertar nela o interesse pela vida espiritual. Fanny Thomas ficou muito surpresa e irritada com o que viu.

A jovem tinha personalidade e bastante cultura, porém demonstrava ser uma pessoa orgulhosa. Perturbava-a muito o fato de as pessoas insistirem com ela quanto à necessidade de entregar o coração a Deus. Em especial, as pregações que escutava, noite após noite, causavam-lhe profunda impressão. A culpa pelo pecado, o merecimento da perdição eterna e o iminente perigo a que o pecador está sujeito eram questões colocadas diante da jovem continuamente. Isso fazia sua rejeição aumentar. No entanto, a obra do convencimento de pecado progredia em seu coração.

Eu não visitara, ainda, a jovem Fanny Thomas, porém ficara sabendo de seu estado de alma pelo sr. Thomas. Depois de contorcer-se alguns dias sob a força da verdade, Fanny foi procurar-me na casa em que eu estava hospedado. Sentou-se no sofá na sala. Coloquei minha cadeira diante dela e comecei a falar claramente sobre os direitos que Deus tinha sobre ela. Fanny referiu-se ao que eu dissera em minha pregação sobre os pecadores merecerem o inferno e declarou não poder aceitar tal coisa — não acreditava que Deus fosse capaz de agir daquela forma. Respondi-lhe: "Você ainda não compreendeu o que é pecado, nem sua verdadeira natureza, nem o castigo que, por causa dele, o pecador passa a merecer. Se compreendesse, não se estaria queixando por Deus enviar o pecador para o inferno". Passei, então, a explicar a questão do modo mais claro que podia.

Não demorei a ver que a convicção de pecado estava amadurecendo em sua mente. Por mais que ela detestasse a idéia de acreditar nisso, não lhe era possível resistir à pureza dessa verdade. Durante algum tempo, conversamos nesses termos, até eu perceber que ela estava pronta para abraçar a convicção que experimentava. Acrescentei umas poucas palavras a respeito da situação espiritual dos que mereciam a perdição. Fanny empalideceu. Momentos depois, levantou as mãos, soltou um grito e caiu para a frente, sobre o braço do sofá. Seu coração estava quebrantado.

Penso que Fanny jamais havia chorado. Seus olhos estavam secos, sua fisionomia abatida e pálida e sua sensibilidade enfraquecida, mas, agora as comportas haviam sido abertas e ela permitiu que seu coração se derramasse, aos jorros, diante de Deus. Já não havia motivo para falar-lhe qualquer outra coisa, então ela levantou-se e foi para a casa onde estava hospedada. Quase imediatamente, abandonou o trabalho na escola e ofereceu-se para ser missionária. Casou-se com o sr. Gulick e foi para as ilhas Sandwich, creio que na mesma ocasião em que o dr. Judd saiu para o mesmo campo missionário. A história de Fanny como missionária é bastante conhecida. Seu trabalho no campo de missões foi muito produtivo. Criou vários filhos que agora também são missionários. Um deles esteve em nossa casa poucos meses atrás antes de partir para a obra missionária no México. Ouvir o relato que ele fez do trabalho de sua mãe nas ilhas Sandwich foi um refrigério para mim. Não conheci pessoalmente seu pai, o sr. Gulick, mas, de sua mãe não me esquecerei tão cedo.

Enquanto estava hospedado em Utica, preguei várias vezes em New Hartford, aldeia que ficava cerca de sete quilômetros ao sul de Utica. Ali estava acontecendo uma obra poderosa da graça divina e o pastor da igreja presbiteriana local era o sr. Coe. Preguei, também, em Whitesboro, outra bela aldeia, quase sete quilômetros ao leste de Utica, onde também acontecia um poderoso avivamento. O pastor da aldeia, sr. John Frost, era um obreiro eficiente e poderoso na obra do Senhor.

Não posso deixar de relatar outro fato ocorrido ali. Havia uma fábrica de produtos de algodão no riacho de Oriskany, pouco acima de Whitesboro, lugar hoje conhecido como New York Mills. O dono da fábrica era o sr. Wolcott, cavalheiro de alta posição e bons princípios morais, porém não convertido. Meu cunhado, George Andrews, era supervisor da fábrica na época e convidou-me para pregar ali. Certo dia, à tardinha, subi até a escola da aldeia, que era de bom tamanho, mas, ainda assim, estava superlotada. Percebi que a Palavra operou poderosamente nos ouvintes, principalmente entre os jovens que trabalhavam na fábrica.

Na manhã seguinte, depois do café, entrei na fábrica a fim de conhecer as instalações. Ao percorrê-la, notei bastante agitação entre os que estavam ocupados nos teares e em outros equipamentos. Numa das repartições, onde muitas jovens cuidavam dos serviços de fiação, notei que duas delas olhavam para mim e conversavam com seriedade. Deu para perceber que estavam bastante agitadas, embora estivessem rindo. Lentamente, caminhei na direção delas. Viram que eu me estava aproximando e ficaram claramente emocionadas. O fio de uma das máquinas partiu-se e notei que as mãos da moça que lidava com ele tremiam tanto que ela não conseguia consertá-lo. Aproximei-me lentamente por entre as máquinas e percebi que a referida moça ficava cada vez mais nervosa, a ponto de não poder continuar seu trabalho. Quando cheguei a cerca de três metros da jovem, olhei para ela com seriedade. Ela notou meu olhar, prostrou-se e irrompeu em lágrimas. Aquela reação foi-se alastrando como pólvora e, em poucos momentos, quase todos os que trabalhavam naquela repartição estavam chorando.

Aquele sentimento propagou-se pela fábrica inteira. O sr. Wolcott, dono do estabelecimento, estava presente e, vendo a situação, disse ao supervisor: "Faça parar a fábrica e deixe o pessoal cuidar de seu estado espiritual. É mais importante a salvação das almas que o funcionamento da fábrica". As portas foram imediatamente fechadas e a fábrica parou de funcionar. Mas, onde iríamos nos reunir? O supervisor sugeriu a sala das máquinas de fiar, já que elas estavam paradas e o espaço era grande. Assim fizemos e raramente presenciei uma reunião mais poderosa que aquela. Deus continuou a operar. O prédio era grande e um número considerável de pessoas ocupava-o, desde o sótão até o subsolo. O avivamento envolveu a fábrica com poder espantoso e em poucos dias quase todos os funcionários da fábrica haviam-se convertido.

Uma vez que muita coisa tem sido dita a respeito da conversão de Theodore Weld, em Utica, talvez seja bom eu apresentar aqui a versão correta desse fato. Theodore tinha uma tia que morava em Utica, mulher muito piedosa, de oração. Ele era filho de um eminente pastor da Nova Inglaterra e sua tia considerava-o convertido. Ele dirigia os cultos realizados em família. Antes de o avivamento chegar a Utica, tornara-se aluno da Faculdade Hamilton, em Clinton. A obra na aldeia atraíra tanta atenção que muitos moradores de Clinton, entre eles alguns professores da universidade, foram a Utica e relataram o que ali acontecia, o que produziu grande alvoroço entre os alunos.

Theodore Weld ocupava um lugar de destaque entre os alunos da faculdade e exercia bastante influência sobre eles. Ao ouvir falar sobre o que acontecia em Utica, sentiu-se perturbado, o que despertou nele forte rejeição. Segundo fui informado, ele tornou-se até agressivo ao expressar sua oposição à obra. Isso tornou-o conhecido em Utica e sua tia, com quem antes se hospedava, ficou bastante preocupada com o sobrinho.

Theodore era inteiramente desconhecido para mim. A tia escreveu-lhe pedindo que fosse à casa dela passar um domingo. Queria que o sobrinho escutasse a pregação e se interessasse pela obra. De início, ele recusou-se, mas, depois reuniu alguns estudantes e revelou-lhes que resolvera ir a Utica.

Estava certo de que o avivamento se tratava de fanatismo ou de entusiasmo exagerado e que ele não seria afetado pelas idéias ali propagadas. Os colegas veriam como ele iria desmascarar o movimento. Chegou à casa da tia com tal espírito de antagonismo e logo ela percebeu que Theodore não pretendia ouvir-me pregar.

O irmão Aikin ocupava o púlpito no domingo pela manhã e eu, à tarde e à noite. A tia de Theodore soube que o sobrinho pretendia ir à igreja participar do culto matutino, já que nesse horário o sr. Aikin é que pregaria. Ele não iria à tarde nem à noite, porque estava resolvido a não ouvir-me pregar. Diante disso, o irmão Aikin sugeriu que eu pregasse pela manhã, pois desejava muito que Theodore me ouvisse. Consenti e fomos juntos para a reunião. Como de costume, o sr. Aikin dirigiu a parte inicial do culto. A sra. Clark chegou com a família e o sr. Weld. Teve o cuidado de colocar Theodore sentado na parte mais ao centro do banco, de modo que, se ela e mais dois familiares não saíssem dali, ele também não poderia sair. Ela temia que ele se retirasse do salão ao perceber que o pregador seria eu. Eu sabia que era grande a influência dele sobre os jovens em Utica e que sua chegada ali representava a chance de formarem uma quadrilha de oposição à obra. Quando Theodore entrou e tomou assento, o sr. Aikin identificou-o para mim.

Depois da parte introdutória, fiquei de pé e li o seguinte texto: "Um só pecador destrói muita coisa boa" (Ec 9.18). Eu nunca pregara sobre esse texto nem ouvira outro pregador usá-lo como base para um sermão, mas, suas palavras impregnaram minha mente com tanto poder que, como costumava fazer em semelhantes ocasiões, adotei-as como tema para o sermão. Comecei a pregar e a explicar que às vezes um único pecador podia destruir muita coisa boa e que a má influência de um único homem pode arruinar muitas almas. Imagino ter pintado um quadro bastante vívido de Weld, de sua influência negativa e dos danos que podia provocar. Uma ou outra vez, ele fez menção de sair, mas a tia, percebendo sua intenção, lançava-se para a frente e apoiava-se no encosto do banco diante dela, a fim de orar silenciosamente. Assim, ele não podia sair sem incomodá-la. Por isso, Weld permaneceu em seu lugar até o final do culto.

No dia seguinte, entrei numa loja na rua Genesee, a fim de conversar com alguns jovens e com outras pessoas que ali estavam. Era meu costume ir de lugar em lugar para conversar com o povo. E quem encontrei ali? O sr. Weld! Ele atacou-me sem a menor cerimônia e, acho que por uma hora inteira, ou quase isso, dirigiu-se a mim de maneira ofensiva. Eu nunca ouvira nada semelhante. Ele não me dava oportunidade de falar, pois a língua dele corria solta. Tinha muita desenvoltura no falar e logo se tornou o centro das atenções na loja. A notícia percorreu as ruas, de modo que os funcionários de outras lojas foram também ajuntando-se ali. Muitos jovens entraram correndo e todos ficaram em pé escutando o que Theodore dizia.

O movimento na loja cessou e todos prestavam atenção apenas aos insultos dirigidos a mim. Raras vezes tive a oportunidade de pronunciar-me. Mas, finalmente, apelando, disse-lhe: "Sr. Weld, é assim que você, filho de um ministro de Cristo, se comporta?" Falei algumas poucas palavras nesse sentido e vi que ele ficou muito ofendido. Gritou algo muito forte, deixou imediatamente a loja e foi-se embora. Eu também saí e fui para a casa do sr. Aikin, onde estava hospedado na ocasião.

Poucos momentos depois de eu chegar, ouvi alguém chamar à porta e, não havendo nenhum empregado por perto, fui eu mesmo atender. Estava sozinho na sala e coloquei-me de pé para abrir a porta. E quem entrou? O sr. Weld! Ele parecia deprimido. Apresentou-me o mais humilde pedido de desculpas pela maneira em que me havia tratado, usando os termos mais contundentes de auto-condenação. Apertei-lhe a mão com delicadeza e mantive com ele uma rápida conversa, assegurando-lhe que não tinha mágoa dele e exortando-o a entregar seu coração a Deus. Creio que orei com ele antes que se despedisse. Nada mais ouvi a seu respeito naquele dia. Preguei naquela noite, se não me engano, em New Hartford, de onde retornei bem tarde.

Na manhã seguinte, fiquei sabendo que ele fora para a casa da tia muito impressionado e enternecido. Ela pediu-lhe que orasse pela família, o que, de início, o chocou. Mas, o sentimento de antagonismo ressurgiu dentro dele tão fortemente que lhe ocorreu que aquele seria um meio de ele poder expressar mais uma vez sua aversão pelo movimento. Por isso, concordou em orar. Ajoelhou-se e começou o que a tia esperava que fosse uma oração. Mas, segundo o relato que ele mesmo fez mais tarde, de sua boca saiu apenas uma torrente de blasfêmias e insultos, que prosseguiu até todos ficarem atônitos. Ele demorou-se tanto em seu desabafo que o lampião se apagou e isso encerrou sua oração.

Sua tia tentava dialogar com ele, mas, a dureza de seu coração era terrível. Ela assustou-se com o estado mental e emocional do sobrinho. Orou com ele, exortou-o a entregar o coração a Deus e foi dormir. Theodore foi para o quarto, começou a caminhar pelo aposento e deitou-se no chão. Levantou-se, caminhou mais um pouco e deitou-se outra vez. Ele repetiu várias vezes esses movimentos. Passou a noite inteira naquele estado terrível de perturbação. Estava revoltado e furioso, porém tão convicto de pecado que achava que não iria suportar.

Ao raiar o dia, enquanto caminhava para trás e para a frente no quarto, conforme ele mesmo contou, veio sobre ele uma pressão tal que sentiu-se preso ao chão. A pressão era acompanhada por uma voz que parecia ordenar-lhe que se arrependesse naquela hora. Ele ficou ali no chão, totalmente quebrantado, até que no final da manhã a tia encontrou-o na mesma posição. Ele chamava a si mesmo de insensato e seu coração parecia haver-se derretido. À noite, no culto, levantou-se e pediu licença para fazer uma confissão. Concordei e ele declarou diante da congregação que precisava remover a pedra de tropeço que lançara diante do povo.

Realmente, foi uma confissão plena de humildade, sinceridade e quebrantamento. A partir de então, passou a ser ótimo obreiro. Esforçava-se diligentemente na obra e tornou-se poderoso pregador. Dedicou-se ao ministério da oração e durante vários anos foi usado por Deus na prática do bem e na conversão de muitas almas. Os grandes esforços empregados na causa, no entanto, enfraqueceram sua saúde. Por isso, foi obrigado a sair da universidade e embarcou numa expedição de pesca até a costa do Labrador. Quando voltou, com a saúde renovada, continuou a ser o obreiro zeloso que era antes de embarcar. Por um considerável período de tempo, tornou-se meu ajudante eficaz onde quer que eu estivesse fazendo a obra. Terei ocasião de mencionar seu nome em outras partes desta narrativa. Limito-me, por agora, a escrever apenas isto sobre Theodore Weld.

Já tive ocasião de dizer que nenhuma resposta pública foi dada às acusações publicadas pelos opositores do avivamento, ou seja, nada se respondeu ao que o dr. Beecher ou o sr. Nettleton escreveram. Mencionei, também, que foi publicado um panfleto escrito pelos ministros integrantes da Associação de Oneida, no qual a obra era contestada. A esse panfleto, que se saiba, também nenhuma resposta foi publicada. Lembro-me de que um ministro unitarista, residente em Trenton, naquele condado, publicou um panfleto ofensivo, no qual deturpava grandemente a obra e dirigia-me um ataque pessoal. A esse o rev. Wetmore, membro do presbitério de Oneida, publicou uma resposta.

Esse avivamento ocorreu no inverno e na primavera de 1826. Depois de os convertidos terem sido recebidos nas igrejas em todas as partes do condado, o rev. John Frost, pastor da Igreja Presbiteriana em Whitesboro, publicou um panfleto com uma descrição parcial do avivamento e, se não me falha a memória, declarou que, dentro do território abrangido por aquele presbitério, os convertidos chegaram a 3 mil. Não tenho nenhum exemplar desse panfleto. Conforme já disse, a obra disseminou-se a partir de Rome e Utica, como se estivesse partindo de um centro para todas as direções. Os ministros vinham de distâncias consideráveis e passavam períodos de tempo, maiores ou menores, acompanhando os cultos e ajudando de várias maneiras na promoção da obra.

Quanto aos esforços envidados por mim na obra do avivamento, dividi minha mobilização por uma região tão ampla que pude alcançar, em maior ou menor grau, todas as fronteiras do presbitério. Não consigo lembrar quanto tempo passei em cada lugar. Os pastores de todas aquelas igrejas simpatizavam profundamente com a obra. Homens bons e leais que eram, colocavam-se no altar do Senhor como sacrifício, a fim de fazer o máximo que pudessem a favor daquela grande e gloriosa obra e Deus os recompensava ricamente.

No tocante aos ensinamentos doutrinários, eu diria que a doutrina da depravação moral total era explicada detalhadamente e ensinada com insistência aos ouvintes. A espiritualidade e a autoridade da lei divina também ocupavam posição de destaque. A doutrina da expiação por Cristo, suficiente para toda a humanidade e os convites gratuitos segundo o evangelho, baseados nessa doutrina, eram apresentados na devida proporção. Todas as pessoas eram definidas como sendo, por natureza, mortas em seus delitos e pecados, sujeitas à condenação e tendo a ira de Deus sobre elas. Aos ouvintes era indicada a cruz de Cristo e apresentados todos os atrativos para levá-las a renunciar totalmente a justiça própria, bem como a todas as formas de egoísmo e a dedicar, de imediato, todo o seu ser e todas as suas posses ao Senhor Jesus Cristo.

Os ministros e os cristãos que haviam adotado a interpretação literal do catecismo presbiteriano achavam muito difícil falar da fé aos descrentes. Não gostavam de dizer aos interessados que nada havia que pudessem fazer. Por isso, instruíam-nos a apossarem-se da graça que lhes era oferecida por Deus, a orar pedindo um novo coração e a esperar até que Deus os levasse à conversão. Durante aquele avivamento, procuramos demolir todos esses ensinos e, em vez de dizer aos pecadores que usassem os meios da graça para obter um coração novo, nós os ensinávamos a esforçarem-se para tornar o coração um novo coração e o espírito um novo espírito.

Insistíamos na necessidade de se entregarem imediatamente a Deus. Dizíamos que o Espírito estava lutando com eles para levá-los a entregarem-lhe o coração imediatamente, a crer e a começar uma vida de submissão e devoção a Cristo, com fé, amor e obediência cristã. Ensinávamos que, enquanto orassem pedindo o Espírito Santo, estariam resistindo a ele e que, se obedecessem imediatamente à própria convicção de dever, então, seriam crentes. Procurávamos demonstrar-lhes que tudo quanto fizessem ou falassem antes de entregar o coração a Deus era pecado. Não era o que Deus queria e eles estariam resistindo ao Espírito Santo. É lógico que muitos se opunham a esses ensinamentos, mas, nem por isso deixamos de ensinar assim e fomos grandemente abençoados pelo Espírito de Deus.

Antes disso, acreditava-se que seria necessário o pecador permanecer muito tempo sob o convencimento de pecado. Não raras vezes, as pessoas que professavam a fé declaravam que haviam ficado tantos meses ou tantos anos debaixo dessa convicção antes de encontrar alívio. Parece que a crença era que, quanto mais tempo passassem sob o convencimento de pecado, maior seria a evidência de que se haviam convertido. Ensinávamos o inverso disso. Eu insistia em que, se passassem muito tempo sob essa convicção, corriam o risco de tornarem-se fariseus, achando que já haviam orado bastante e praticado boas ações suficientes para induzir Deus a dar-lhes a salvação e que, finalmente, se acomodariam a uma falsa esperança.

Dizíamos que viver um longo período sob convencimento de pecado apresentava o perigo de entristecer o Espírito de Deus, até que este se afastasse deles — o que resultaria na sensação de que a aflição mental chegara ao fim.

Como resultado, sentir-se-iam mais à vontade, achando que estavam convertidos e esse pensamento, possivelmente, produziria neles um tipo de alegria que confundiriam com o gozo e a paz que há em Cristo. Por fim, esse estado de espírito, talvez os iludisse ainda mais, ao ser interpretado como evidência de que haviam experimentado a conversão.

Procuramos afastar totalmente a falsa doutrina da necessidade de permanecer muito tempo sob convicção de pecado. Insistíamos em que a submissão imediata era a única coisa que Deus podia aceitar das mãos deles e que, qualquer demora, não importando qual fosse o pretexto, era uma forma de rebeldia contra Deus. Com esses ensinamentos, tornou-se habitual que as pessoas se convencessem e se convertessem no decurso de poucas horas — às vezes, em poucos minutos. Essas conversões repentinas alarmavam muitas pessoas de boa índole. Como era de esperar, elas temiam que os convertidos se desviassem, pois tal conversão não podia ser genuína. Mas, os resultados comprovaram que entre aquelas conversões repentinas estavam alguns dos cristãos mais cheios de poder da região. E essa tem sido minha experiência ao longo de meu ministério.

Já mencionei que o sr. Aikin respondeu, em particular, a algumas das cartas do sr. Nettleton e do dr. Beecher. Algumas das cartas do dr. Beecher acabaram sendo publicadas na imprensa, mas, não causaram impacto. As respostas do sr. Aikin, enviadas pelo correio, pareciam não fazer a mínima diferença na oposição movida pelo sr. Nettleton e pelo dr. Beecher. Tendo por base uma carta que o dr. Beecher escreveu naquela época ao dr. Taylor, de New Haven, parece que alguém lhe passara a idéia de que os irmãos ocupados na promoção do avivamento eram meros enganadores. Nessa carta, asseverava que um espírito de mentira predominava em nossos avivamentos e que, por essa razão, não se podia acreditar em nada do que era dito pelos seus líderes. A carta do dr. Beecher ao dr. Taylor acabou sendo publicada.

Entre meus documentos, tenho uma cópia dela, como também algumas das cartas do sr. Nettleton. Se a carta do dr. Beecher chegasse a ser publicada outra vez, o povo da região onde predominaram os avivamentos estranharia bastante que o dr. Beecher, mesmo numa carta particular, pudesse ter escrito semelhantes coisas a respeito dos ministros e dos crentes ocupados na promoção daquela grande e maravilhosa obra. Em outro contexto, terei de falar mais a respeito da oposição do dr. Beecher e do sr. Nettleton àqueles gloriosos avivamentos.


 

CAPÍTULO XV.

O AVIVAMENTO EM AUBURN EM 1826

O dr. Lansing, pastor da Primeira Igreja Presbiteriana em Auburn, foi a Utica para ver de perto o avivamento que estava acontecendo ali e insistiu que eu o acompanhasse durante algum tempo e trabalhasse com ele. No verão de 1826, aceitei seu convite e fui para Auburn, trabalhando ali com o dr. Lansing algum tempo. Pouco depois, descobri que alguns dos professores no seminário teológico daquela cidade eram hostis ao avivamento. Já tivera conhecimento de que vários pastores do leste de Utica trocavam cartas entre si, usando palavras agressivas para se referir a ele.

Alguns deles diziam que as faculdades e seminários teológicos seriam profundamente prejudicados se eu tivesse permissão para visitar as igrejas e pregar, já que eu não recebera nenhuma educação teológica em faculdade ou seminário. Naturalmente, muitos relatórios falsos circularam, contendo acusações absurdas, mas, nada daquilo mereceu minha atenção. Em circunstância alguma apresentei resposta. Estava demasiadamente envolvido na obra e não tinha tempo para contestar as críticas de que estava sendo alvo.

Embora aparecessem artigos freqüentes nos jornais contra mim e contra os esforços que empreendia, nunca fiz mais que passar os olhos por eles para ver o que havia de justo ou injusto. E, repito, em nenhuma circunstância ofereci resposta. No entanto, antes de chegar a Auburn, não tinha consciência da intensidade da oposição que receberia da parte do ministério — não dos pastores das regiões onde eu atuava, mas, dos que trabalhavam fora de meu campo de trabalho e não me conheciam pessoalmente. Eles haviam sido influenciados pelos falsos relatos que ouviram, originários de alguma fonte desconhecida por mim e por meus amigos. Pouco depois de chegar a Auburn, descobri, por várias fontes, que fora colocado em ação um sistema de espionagem com o propósito de unir pastores e igrejas para cercar e impedir a propagação dos avivamentos que se desenvolviam relacionados com os trabalhos realizados por mim.

Por essa mesma ocasião, fui informado de que o sr. Nettleton dissera que não poderia avançar mais para o Leste: todas as igrejas — as da Nova Inglaterra, em especial — estavam fechadas para mim. O sr. Nettleton veio a Albany e caiu em minhas mãos uma carta do dr. Beecher na qual este exortava o sr. Nettleton a tomar uma posição corajosa contra mim e contra Avivamentos na região central do estado de Nova York. Dizia, também, quando os membros do poder judiciário da Nova Inglaterra se reunissem, "todos falariam com franqueza e o apoiariam em sua oposição". Mas voltemos aos acontecimentos em Auburn.

Pouco depois da minha chegada ali, fiquei muito impressionado com a operação do sistema de espionagem a que me referi há pouco. O rev. Frost, de Whitesboro, obteve considerável conhecimento dos fatos e comunicou-os a mim. Que eu me lembre, nada falei a respeito do assunto, em público ou em particular. Dediquei-me unicamente à oração. Punha em Deus a mais profunda confiança, dia após dia, para que ele me orientasse, mostrando-me o caminho a seguir e dando-me graça para enfrentar a tempestade. Jamais esquecerei a cena que se passou diante mim, durante um dia inteiro, em meu quarto, na casa do dr. Lansing, em Auburn. Eu havia chegado à cidade havia pouco. Numa visão, o Senhor mostrou-me os sofrimentos que me aguardavam. Enquanto eu orava, ele ficou tão perto de mim que minha carne literalmente estremeceu à volta de meus ossos! Como efeito da plena consciência da presença de Deus, eu tremia da cabeça aos pés, como se tivesse calafrios! De início e durante algum tempo, senti-me no cume do Sinai, em meio aos trovões divinos e não diante da cruz de Cristo.

Que eu me lembre, nunca em minha vida me senti tão cheio de reverente temor e humildade diante de Deus. No entanto, ao invés de sentir vontade de fugir, sentia-me cada vez mais atraído para perto de Deus — sempre mais perto daquela presença que me enchia de reverência e tremor inexprimíveis. Depois de um período de grande humilhação diante do Senhor, veio um grande acontecimento. Deus me deu a certeza de que estaria comigo e me sustentaria; nenhuma oposição prevaleceria contra mim; que eu nada tinha a fazer senão manter-me fiel ao meu trabalho e esperar o livramento da parte de Deus.

Nunca poderei descrever a consciência da presença de Deus e de tudo quanto se passou entre ele e minha alma naquela ocasião. A experiência capacitou-me a manter dentro de mim a total confiança e a perfeita tranqüilidade e a cultivar em meu coração apenas sentimentos de bondade para com todos os irmãos que se deixaram enganar, cerrando fileiras contra mim. Tinha a certeza de que tudo terminaria em bem e que o caminho certo era deixar tudo nas mãos de Deus e continuar o trabalho. Assim fiz e, à medida que deparava com a tempestade e via a oposição aumentar, não tive dúvida, um momento sequer, quanto ao resultado a que chegaríamos.

Nunca me deixei perturbar pelos movimentos contrários, nunca perdi uma hora de descanso pensando nisso, embora parecesse que todas as igrejas do país, com exceção das que ficavam nos lugares onde eu já havia atuado, estavam se unindo para impedir que eu subisse em seus púlpitos. E, conforme entendi depois, era isso mesmo o que meus principais opositores haviam resolvido. Estavam tão envolvidos no engano que pensavam não existir outra solução senão acabar comigo. Mas, Deus deu-me a certeza de que não me conseguiriam calar.

O texto de Jeremias 20 foi, repetidas vezes, aplicado à minha consciência com grande poder. Diz o seguinte: "SENHOR, tu me enganaste e eu fui enganado [ou seduzido]; foste mais forte do que eu e prevaleceste. Sou ridicularizado o dia inteiro; todos zombam de mim. Sempre que falo é para gritar que há violência e destruição. Por isso, a palavra do SENHOR trouxe-me insulto e censura o tempo todo. Mas, se eu digo: 'Não o mencionarei nem mais falarei em seu nome', é como se um fogo ardesse em meu coração, um fogo dentro de mim. Estou exausto tentando contê-lo; já não posso mais! Ouço muitos comentando: 'Terror por todos os lados! Denunciem-no! Vamos denunciá-lo!' Todos os meus amigos estão esperando que eu tropece, dizem: 'Talvez ele se deixe enganar; então nós o venceremos e nos vingaremos dele'. Mas o SENHOR está comigo, como um forte guerreiro! Portanto, aqueles que me perseguem tropeçarão e não prevalecerão. O seu fracasso lhe trará completa vergonha; a sua desonra jamais será esquecida. Ó Senhor dos Exércitos, tu que examinas o justo e vês o coração e a mente, deixa-me ver a tua vingança sobre eles, pois a ti expus a minha causa" (v. 7-12).

Não estou querendo dizer que essa passagem descrevesse literalmente minha situação na época, mas havia tanta semelhança entre a condição descrita pelo profeta e aquela em que eu me encontrava que esse texto servia, freqüentemente, de consolo à minha alma. E, realmente, conforme já disse, o Senhor não permitiu que eu ficasse magoado com a oposição que me era feita ou que receasse algo que me pudesse acontecer ou ainda que sentisse o mínimo ressentimento ou raiva dos irmãos que levavam as coisas nessa direção. Posso dizer, com toda a sinceridade, que não me lembro de nenhum sentimento desagradável contra o sr. Nettleton, nem contra o dr. Beecher, nem contra qualquer um dos principais opositores da obra.

Lembro-me de me ter sentido notavelmente horrorizado com o panfleto publicado por William R. Weeks, a quem já me referi e à posição por ele tomada. Não nutria nenhum ressentimento contra ele, mas eram perceptíveis em sua conduta astúcia maligna, fingimento e determinação inabalável, quais não me recordo já ter falado. Lembro-me nitidamente, porém, de ter sentido diante de suas atitudes um arrepio de horror. Aqueles que conhecem a história do sr. Weeks lembram-se de que, pouco depois disso, ele escreveu um livro que intitulou ‘O peregrino no século XIX’. A obra foi publicada em fascículos e depois encadernada num só volume. É possível que muitos leitores desta narrativa conheçam o livro.

Pelo que sei, Weeks mostrou-se inimigo do avivamento até o dia de sua morte. Enquanto era pastor no condado de Oneida, porém, na época em que eu ali atuava, não conseguiu manter a sua oposição. Foi demitido pouco depois, indo para Newark, NJ, onde exerceu a função de professor primário. Fui informado de que ele reuniu ao seu redor bem poucos seguidores da sua doutrina e continuou a pregá-la até o dia de sua morte. Tinha um talento considerável e, até onde se podia esperar, era um homem bom, mas que foi iludido pelas próprias idéias e perdeu o rumo quanto à teologia. Não menciono seu nome aqui com o objetivo de criticá-lo, nem ao seu livro, mas, simplesmente para dizer que ele nunca deixou de se opor, em maior ou menor grau, de modo direto ou indireto, aos avivamentos, os quais não favoreciam as suas opiniões. Mesmo sem mencionar o seu nome, tomava o máximo cuidado em defender as medidas que o sr. Nettleton adotava como líder da oposição ao avivamento. Mas, Deus afastou toda aquela influência negativa. Há muitos anos que não ouço falar dela.

A despeito da atitude que alguns dos professores em Auburn adotavam contra os ministros que trabalhavam em outros lugares, o Senhor não demorou a reavivar sua obra naquela cidade. O rev. Lansing tinha uma grande congregação, madura e de bom senso. O avivamento surtiu rápido efeito entre seus membros, tornando-se poderoso ali. Foi nessa época que o dr. Steel, de Auburn, que ainda reside ali, teve sua alma grandemente abençoada e foi transformado em um novo homem.

Quando cheguei ali, o dr. Steel era presbítero da Igreja Presbiteriana. Era crente muito tímido, cheio de dúvidas, mostrando pouca eficácia como cristão, porque a sua fé era bem pequena. Logo, porém, sentiu profunda convicção de pecado e desceu até as profundezas da humilhação e da aflição, quase ao desespero. Continuou nesse estado durante semanas, até que, certa noite, numa reunião de oração, foi totalmente dominado por seus sentimentos e acabou prostrado no chão, desamparado. Foi então que Deus lhe abriu os olhos para a realidade da salvação em Cristo. Isso aconteceu pouco depois de minha partida de Auburn para trabalhar em Troy, NY. Não demorou muito até que o irmão Steel me procurasse em Troy e, quando nos encontramos, ele exclamou, dando às palavras uma ênfase que lhe era peculiar: "Irmão Finney, sepultaram o Salvador, mas Cristo ressuscitou!". Ele recebeu o batismo com o Espírito Santo tão maravilhosamente que, a partir de então, tem sido a alegria dos fiéis que o conhecem.

Como conseqüência da oposição ao meu trabalho, demonstrada por muitos ministros, havia em Auburn muita rejeição e vários líderes daquela grande aldeia tomaram posição irredutível contra a obra. Por esse tempo, Theodore Weld, a quem já me referi, chegou ali, onde passou vários dias. E um dos exemplos da espécie de oposição feita ao avivamento naquela aldeia foi quando um dos principais oponentes da obra encontrou-se com Theodore Weld e disse-lhe: "Weld, prometi que lhe daria um pontapé e vou cumprir minha palavra". Dito isso, aproximou-se de Theodore deu-lhe um chute. Weld não deu muita atenção àquilo e o assunto foi deixado de lado. Mas o Espírito do Senhor estava presente com grande poder entre o povo e vários incidentes notáveis aconteceram na época.

Certa manhã de domingo, enquanto pregava, eu mostrava como certos homens se opunham à conversão da mulher e dos filhos. Fiz uma vívida descrição de um caso e acrescentei: "Se eu conhecesse pessoalmente cada um de vocês, sem dúvida poderia citar pelo nome alguns que tratam a família dessa maneira". Naquele instante, um cavalheiro exclamou no meio da congregação: "Cite meu nome!" e caiu para frente, com a cabeça no encosto do banco diante dele, tremendo de emoção. Ele me revelou, depois, que estava tratando sua família exatamente da maneira descrita por mim e que, naquela manhã, fizera as coisas que eu citara sem ter conhecimento dos fatos. Disse-me que sua exclamação "Cite meu nome!" fora espontânea e irresistível, não conseguira reprimi-la. Receio, no entanto, que ele nunca tenha se convertido a Cristo.

Na época, um chapeleiro chamado Hawley residia em Auburn. Era casado com uma mulher piedosa, mas ele era universalista e se opunha ao avivamento. Levou a oposição a tal ponto que passou a proibir a mulher de freqüentar nossos cultos. Por isso, ela deixou de comparecer às reuniões várias noites seguidas. Certa noite, quando o sino tocou, anunciando o início do culto dali a meia-hora, a sra. Hawley, preocupada com o marido, recolheu-se para orar e passou aquela meia hora derramando a alma diante de Deus. Contou ao Senhor como o marido se comportava, que ele não a deixava freqüentar os cultos etc. Ficou muito próxima de Deus naquele momento. Perto da hora do início da reunião, saiu do quarto e viu que o marido já voltara da loja. Quando ela entrou na sala, ele perguntou-lhe se ela não gostaria de ir ao culto e que, se quisesse ir, ele a acompanharia.

Posteriormente, ele mesmo me contou que resolvera assistir ao culto naquela noite para ver se havia realmente algo que justificasse a restrição feita à mulher, ou pelo menos para descobrir alguma coisa engraçada que lhe servisse de motivo para ridicularizar a obra. A mulher surpreendeu-se quando o marido se ofereceu para acompanhá-la, mas foi-se arrumar e ambos foram ao culto. Naturalmente, na ocasião, eu não sabia o que se passara. Como ocorria com freqüência na época, fui para o culto sem ter a mínima idéia do texto bíblico sobre o qual pregaria. Depois de ter visitado os membros da igreja e conversado com os interessados no avivamento o dia inteiro, não tivera tempo para ordenar os pensamentos, nem mesmo para selecionar um texto para o sermão.

Entre a parte introdutória do culto e o momento de pregar, ocorreu-me um texto bíblico. Tratava-se das palavras do homem com o espírito imundo, que exclamou: "Deixa-nos sozinhos!" [na NVI, "Que queres conosco, Filho de Deus?"; Mt 8.29]. Lancei mão daquelas palavras e esforcei-me para desmascarar a conduta dos pecadores que preferiam ser deixados sozinhos, que não queriam nada com Cristo. O Senhor concedeu-me poder para apresentar uma descrição bem vívida do caminho que semelhantes pessoas trilhavam. No meio do sermão, vi que um homem caía de seu assento, perto do corredor central, gritando de maneira terrível. A congregação ficou tão chocada e o grito foi tão forte que interrompi o sermão e fiquei parado. Momentos depois, pedi à congregação que permanecesse sentada enquanto eu descia do púlpito para falar com o homem.

Descobri que se tratava do sr. Hawley. O Espírito do Senhor o convencera tão poderosamente que lhe foi impossível permanecer sentado. Quando cheguei perto dele, já recuperara as forças o suficiente para estar joelhos, com a cabeça no colo da mulher. Ele chorava em voz alta como uma criança, confessando seus pecados e acusando-se a si mesmo de modo terrível. Falei-lhe algumas palavras, às quais parecia prestar bem pouca atenção. O Espírito de Deus o conquistara de modo tão eficiente que logo desisti de tentar levá-lo a prestar atenção ao que eu dizia. Quando revelei à congregação de quem se tratava, lágrimas e soluços foram ouvidos por todo o recinto, pois todos conheciam seu caráter. Fiquei parado algum tempo, esperando que ele se aquietasse para eu continuar o sermão, mas seu choro impediu-me de retomar a palavra. Nunca me esquecerei da fisionomia da mulher d sr. Hawley, sentada ali, segurando nas mãos o rosto do marido. Suas feições revelavam júbilo e triunfo santos, impossível de expressar em palavras.

Depois de algumas orações, o culto foi encerrado. Ajudaram o sr. Hawle a chegar em casa e ele pediu que, imediatamente, fossem buscar alguns dos seus companheiros, com os quais costumava juntar-se para ridicularizar a obra do Senhor. Não iria sossegar até que viessem e que ele tivesse a oportunidade de lhes confessar seus erros, o que fez com o coração muito quebrantado. Estava tão vencido pela emoção que por dois ou três dias não conseguiu circular na cidade. E continuava mandando chamar todos aqueles a quem queria confessar o que fizera de errado e aconselhar a fugir da ira vindoura. Logo que conseguiu andar pela cidade, firmou-se na obra com a máxima humildade e singeleza de caráter e com grande sinceridade. Pouco depois, tornou-se presbítero ou diácono — não me recordo qual dessas funções exerceu — e, a partir de então, foi um crente exemplar e produtivo. Sua conversão foi tão marcante e tão poderosa, com resultados tão evidentes, que muito contribuiu para fazer silenciar a oposição.

Alguns homens abastados na cidade de Auburn, desgostosos com o dr. Lansing, comigo e com os demais obreiros que trabalhavam no avivamento, juntaram-se e formaram outra congregação depois de minha partida. A maioria deles não era convertida. É bom que o leitor mantenha esse fato na memória, porque no momento certo desta narrativa destacarei os resultados dessa oposição e da formação de uma nova igreja, bem como a conversão de quase todos esses opositores.

Durante minha estada em Auburn, eu pregava, com maior ou menor freqüência, nas igrejas da circunvizinhança e o avivamento se propagou-se em várias direções e até Cayuga e Skaneateles, ambas as localidades situadas à beira de lagos com o mesmo nome. Se não me engano, isso ocorreu no verão e no outono de 1826.

Pouco depois de minha chegada a Auburn, ocorreu um fato tão notável que me sinto no dever de apresentar um breve relato sobre ele. Minha mulher e eu estávamos hospedados com o dr. Lansing, pastor da igreja. A igreja estava muito conformada e parecida com o mundo e os membros eram acusados pelos descrentes de ter atração pelas roupas finas, pela moda e por tudo que era mundano. Como de costume, minha pregação visava à transformação da igreja e ao avivamento de seus membros. No domingo, preguei, da maneira mais profunda e minuciosa possível, sobre a atitude do crente diante do mundanismo. A Palavra causou profunda impressão nos ouvintes.

Ao concluir o sermão, pedi que o pastor orasse, como sempre fazia. O dr. Lansing sentira o impacto da mensagem e, obviamente, sabia que o mesmo acontecera à congregação. Em vez de passar imediatamente à oração, proferiu uma exortação — breve, porém muito sincera — ao povo, confirmando o que eu dissera. Naquele momento, um homem levantou-se na galeria e disse, em voz bem audível: "Sr. Lansing, não acredito que suas observações possam surtir algum efeito enquanto o senhor estiver usando uma camisa franzida e um anel de ouro e enquanto sua mulher e as senhoras de sua família ficarem sentadas diante da congregação vestidas como se pertencessem ao mundo da moda". O golpe foi fulminante sobre o dr. Lansing. Ele não respondeu, mas atirou-se para o lado do púlpito e chorou como criança.

A congregação ficou quase tão chocada e emocionada quanto seu pastor. Quase todos curvaram a cabeça contra o encosto do banco e começaram a chorar. E, excetuando-se os soluços e os suspiros, o resto era silêncio profundo. Esperei uns momentos e, como o dr. Lansing não se mexia, levantei-me, fiz uma breve oração e despedi o povo.

Fui para casa com aquele querido pastor. E, depois que toda a família voltou do culto, ele tirou o anel do dedo — uma jóia fina que realmente chamava a atenção — revelando que sua primeira mulher, no leito de morte, tirara aquele anel do dedo e o colocara no dele, pedindo-lhe que o usasse como lembrança dela. Assim fizera, sem a mínima idéia de que seria um tropeço para alguém. Quanto aos franzidos, disse que os usava desde criança, não os considerando coisa inadequada ao crente. Nem sequer conseguia lembrar com que idade começara a usá-los e, naturalmente, não os considerava um problema. "Mas, se essas coisas são pedras de tropeço para alguém, não as usarei mais", decidiu. O dr. Lansing era um crente de valor e um pastor excelente.

Logo depois, os membros da igreja dispuseram-se a fazer uma confissão pública de que haviam sido relapsos e destituídos de espírito cristão. A confissão foi redigida, apresentada à igreja para aprovação e lida diante da assembléia. Os membros da igreja colocaram-se de pé durante a leitura, muitos deles chorando. A partir de então, a obra avançou com muito mais poder. Sem dúvida, havia total sinceridade naquela confissão e Deus aceitou-a de modo gracioso e manifesto, fechando a boca dos que se opunham a ela.

A oposição à obra, por parte de alguns descrentes, era ferrenha, tendo sido ainda encorajada pela atitude errônea de muitos ministros, cuja oposição foi aproveitada pelos ímpios como justificativa para as suas ações. O fato é que, em grande medida, a situação espiritual das igrejas e dos ministros não era das melhores e o avivamento pegava-os de surpresa. Por isso, não me admirava, naquela época nem em épocas posteriores, que aquela obra maravilhosa de Deus não fosse bem compreendida e nem bem recebida pelos crentes que viviam tal situação.

Houve muitíssimas conversões notáveis em Auburn e seus arredores, nas cidades vizinhas e em toda aquela região, à medida que a obra se propagava em todas as direções. Na primavera de 1831, estive outra vez em Auburn e testemunhei outro avivamento poderoso naquela cidade. As circunstâncias, estranhas e profundamente interessantes, serão relatadas em lugar apropriado nesta narrativa.

 

CAPÍTULO XVI

O AVIVAMENTO EM TRÓIA E NO NOVO LÍBANO

No começo do outono de 1826, aceitei o convite do rev. Beman e do conselho da sua igreja para empreender, com eles, em Troy, um trabalho visando o avivamento da fé naquela localidade. Passei o outono e o inverno em Troy e o avivamento foi poderoso.

Já mencionei o fato de o sr. Nettleton ter sido enviado pelo dr. Beecher a Albany para levantar resistência contra o avivamento que se propagava pelo centro do estado de Nova York. Embora eu nunca tivesse visto o sr. Netdeton, na época ele me inspirava a máxima confiança. Sentia grande desejo de conhecê-lo e de receber dele informações sobre os melhores meios de promover um avivamento. Queria muito vê-lo e estava disposto a me sentar a seus pés, como o faria diante de um apóstolo. O que ouvira a respeito do sucesso que alcançara na promoção de avivamentos me fazia manter o desejo de aprender com ele. Minha confiança nele era tão grande que acho que poderia me ter deixado dirigir quase totalmente pela prudência de Nettleton. Pouco depois de minha chegada em Troy, fui visitá-lo em Albany.

Nettleton estava hospedado na casa de pessoas que eu conhecia. Passei parte da tarde com ele e conversamos sobre seus pontos de vista doutrinários, a respeito de determinados assuntos, principalmente os sustentados pelas igrejas holandesas e presbiterianas, no tocante à voluntariedade ou involuntariedade da depravação moral e temas afins. Nessas conversas, descobri que ele concordava inteiramente comigo em todas as questões teológicas. Realmente, nenhuma queixa havia sido feita pelo dr. Beecher ou pelo sr. Nettleton quanto aos ensinos que transmitíamos. Eles não podiam queixar-se de não termos ensinado o que consideravam ser o verdadeiro evangelho. Sua queixa era contra algo que supunham muito censurável nos métodos que empregávamos. Cada questão que levantávamos era discutida rapidamente.

Notei que, em nossas conversas, era evitado o que se referisse à promoção de avivamentos. Quando revelei ao sr. Nettleton minha pretensão de ficar em Albany e ouvi-lo pregar no culto vespertino, ele mostrou-se pouco à vontade e mencionou que eu não deveria ser visto com ele. Por isso, o juiz Cushman que viera comigo de Troy e havia cursado a faculdade com o sr. Nettleton, acompanhou-me quando fui assistir ao culto. Sentamo-nos na galeria e o que ouvi do sr. Nettleton foi o suficiente para me convencer de que não poderia esperar nenhum conselho ou instrução da parte dele e que ele estava ali para liderar a oposição contra mim. Logo descobri que não me enganara.

Enquanto produzia estas memórias, depois de eu ter ditado o parágrafo anterior, alguém me mostrou uma declaração feita na biografia do sr. Nettleton, revelando ter ele tentado, em vão, mudar minhas opiniões e práticas na promoção dos avivamentos. Não posso imaginar que o sr. Nettleton tenha autorizado semelhante declaração, já que não percebi em suas atitudes a mínima intenção de fazer isso. Conforme já revelei, na ocasião ele poderia ter tentado moldar-me segundo seus critérios, mas nunca me disse uma única palavra a respeito da maneira em que eu conduzia os avivamentos, nem me escreveu uma palavra a respeito do assunto.

Ele me mantinha a distância e, conforme já me referi, embora conversássemos a respeito de algumas questões teológicas, era evidente que não estava disposto a falar a respeito dos avivamentos e não permitiu que eu o acompanhasse ao culto. Foi essa a única ocasião em que tivemos contato antes de nos encontrarmos na convenção de New Lebanon. O sr. Nettleton em momento algum tentou corrigir meus conceitos. Depois de conhecer suas opiniões e práticas a respeito dos avivamentos, dei graças a Deus por não me ter deixado influenciar por ele.

Visto que Troy ficava bem perto de Albany, a influência das cartas enviadas pelo dr. Beecher não demorou a ser sentida por alguns dos membros de maior destaque da igreja do dr. Beman. A oposição foi aumentando, ate que, finalmente, resolveram levantar uma queixa contra o dr. Beman e levá-lo a julgamento diante do presbitério. Assim foi feito. E, durante várias semanas, o presbitério permaneceu reunido para examinar as acusações contra ele. Enquanto isso, eu continuava a trabalhar para que o avivamento seguisse sem interrupção. Os crentes continuaram orando fervorosamente eu continuei a pregar e a orar incessantemente por aquele trabalho. E o avivamento continuou com poder cada vez maior.

O dr. Beman, no entanto, era obrigado a dedicar sua atenção quase total ao processo que fora instaurado contra ele. Depois de examinar as acusações em detalhes, penso que, por unanimidade ou quase isso, o presbitério negou provimento à causa e absolveu o dr. Beman. A acusação formal não era de heresia e acredito não ter havido mesmo nenhum espírito de heresia. Penso que tudo não passou de invenção dos inimigos do avivamento e dos que haviam sido enganados por influência externa.

A frágil saúde de minha esposa exigiu que eu deixasse Troy por uma ou duas semanas a fim de visitá-la em Whitesboro, no condado de Oneida. Em minha ausência, o irmão Beman convidou o rev. Horatio Foote para pregar num dos cultos ali realizados. Não sei quantas vezes ele pregou. Lembro-me, porém, de ter ofendido grandemente os membros da igreja, os quais já se encontravam insatisfeitos. Como fiquei sabendo depois, as pregações incisivas do rev. Foote aborreceram-nos intensamente. Alguns resolveram retirar-se da congregação e fundar outra igreja. Não lembro quanto tempo depois de eu ter saído de Troy isso aconteceu. O total fracasso na tentativa de arruinar o dr. Beman deixou consideravelmente envergonhados os opositores do avivamento.

Muitos incidentes dignos de nota ocorreram durante aquele avivamento, mas, não devo citá-los para não dar a impressão de estar sendo severo demais com os oponentes da obra. Mas, no intuito de fazer entender a natureza da oposição e de registrar a verdade histórica, devo mencionar que, entre outras coisas, foi descoberto que um dos líderes da oposição proveniente da Nova Inglaterra, chegou a Troy e passou a freqüentar as reuniões de oração dos jovens. Ali, tomava nota de todas as expressões verbais e não-verbais emitidas por aqueles jovens e de tudo que ocorria naqueles encontros. Nunca estava entre os amigos do avivamento. E, pelo que eu sabia, não comparecia a nenhum dos cultos, a não ser de forma dissimulada.

Tratava-se claramente de um espião que viera olhar de perto a situação, não sei se a mando de alguém ou se por conta própria. No entanto, não conseguiu nada contra nós que chegasse a ser publicado nem houve, até onde sei, nada de censurável naquelas reuniões de oração ou em qualquer um de nossos cultos que pudesse ser levado a público em prejuízo do avivamento.

Tratava-se de um irmão de ministério que trabalhara arduamente com irmão Nettleton. Nem eu nem o pastor o vimos. Ficou claro que ele não veio a Troy como amigo. Mas, não vou expor aqui as muitas coisas que entristeceram grandemente o povo de Deus e o Espírito Santo.

A exemplo do que ocorreu nos avivamentos anteriores, imperava em Troy um fervoroso espírito de oração. Todos os dias às 11 da manhã realizávamos uma reunião de oração nas casas. Numa dessas reuniões, estando todos nós ajoelhados, lembro-me de que o sr. Stowe [Silas K. Stow], caixa de um banco naquela cidade, sentiu-se tão pressionado pelo espírito de oração que, quando a reunião foi encerrada, não conseguiu levantar-se. Permaneceu ajoelhado, contorcendo-se e gemendo em agonia. Num momento, exclamou: "Orem por ___", que era o presidente do banco em que trabalhava, tratando-se de um homem rico, porém não convertido.

Quando os presentes perceberam que a alma do sr. Stowe estava lutando a favor daquele homem, ajoelharam-se outra vez e continuaram orando pela sua conversão. Assim que percebemos que o sr. Stowe se acalmou, de maneira que ele pôde ir para casa, todos nos retiramos. Pouco tempo depois, o presidente do banco, a favor de quem havíamos orado, expressou sua esperança em Cristo. Entendo que o sr. Stowe nunca freqüentara nenhuma daquelas reuniões e ninguém sabia que ele se preocupava com a salvação. A oração, porém, prevaleceu e Deus não demorou a solucionar a questão.

Naquela época, o pai do juiz Cushman, que estava também em Troy, morava com o filho, na casa de quem eu estava hospedado. Era um senhor idoso que havia sido juiz em Vermont. Era homem respeitável, de viela pública notavelmente correta. Sua casa em Vermont abrigara os ministros que visitavam a cidade. Segundo as aparências, aquele homem, já de idade bem avançada, estava satisfeito com sua vida agradável e habituado a exercer justiça própria. Sua esposa me contara como ansiava pela conversão do marido e seu filho, J. P. Cushman, expressara repetidas vezes seu receio de que a justiça que seu pai tinha aos próprios olhos nunca fosse dominada e que sua amabilidade natural arruinasse a sua alma.

Certo domingo de manhã, o Espírito Santo desvendou-me a questão e me ensinou a lidar com ela. Em poucos momentos, tudo ficou claro em minha mente. Desci do quarto em que estava hospedado e contei à sra. Cushman, mulher também idosa e ao seu filho, J. R, o que estava pensando em fazer, exortando-os a orar com zelo a favor do idoso juiz. Coloquei em prática o que o Espírito Santo me mostrara. E a sra. Cushman e J. P. garantiram-me que a Palavra pregada havia impressionado de tal maneira o sr. Cushman que ele passara a noite sem dormir e amanhecera com a aparência desfigurada, denotando aflição. Sua mulher informou-me de que ele passara a noite angustiado - a retidão que, aos próprios olhos, ele julgava possuir fora totalmente aniquila da, levando-o quase ao desespero. Seu filho contou-me que o pai sempre se julgara melhor que os membros da igreja. Não demorou a se converter totalmente e passou a viver como cristão até o fim da vida.

Ocorreram muitas conversões semelhantes. Antes de eu partir de Troy, srta. Seward, de New Lebanon, condado de Columbia, filha única de um diácono ou presbítero da igreja em New Lebanon, segundo o que entendi chegara a Troy, a fim de comprar um vestido para um baile. Tinha um parente em Troy, uma jovem crente muito zelosa. Ela convidou a srta. Seward para assistir aos cultos. O convite despertou inimizade no coração da jovem, fazendo com que se mostrasse muito rebelde. A prima, porém, implorava que ela permanecesse ali mais um dia, a fim de que pudesse assistir aos cultos. Tanto a prima insistiu, que, ao sair de Troy, a jovem Seward já estava convertida a Cristo.

Assim que a srta. Seward teve os olhos abertos, passando a desfrutar de paz com Deus, retornou imediatamente para casa e começou a esforça-se na busca de um avivamento em New Lebanon. Até então, ali, nada que se referisse à vida espiritual despertava o mínimo interesse do povo. A maioria dos jovens não era convertida e os membros mais antigos da igreja estavam em condição de muita frieza. O pai da srta. Seward tornara-se insensível e negligente quanto às questões de fé. O ministro da igreja de New Lebanon era um homem bom, porém muito idoso e parecia não saber como levar a efeito a obra de um avivamento.

A srta. Seward começou sua busca desse avivamento em sua própria casa, implorando ao pai que deixasse de lado a "velha oração", como ela chamava e se permitisse despertar e envolver-se com as coisas espirituais. A sua conversão e seu pedido impressionaram-no grandemente, já que era ela a grande favorita da família, especialmente dele. Não demorou a despertar-se e a tornar-se uma pessoa diferente, denotando profunda convicção da necessidade de um avivamento na região. Sara, a jovem, foi também à casa do pastor e começou a aconselhar sua filha, a qual ainda vivia em seus pecados. Esta não demorou a converter-se e as duas uniram-se em oração, passando a suplicar por um avivamento. Lançaram-se à obra, indo de casa em casa e estimulando as pessoas a tomarem parte ativa no movimento iniciado por elas.

Em duas semanas, tanto interesse fora despertado que a própria Sara viajou a Troy, a pedido do pastor e de alguns membros da igreja e implorou que eu fosse pregar em New Lebanon. Atendi ao seu apelo. O Espírito do Senhor foi derramado e o avivamento não demorou a espalhar-se com grande poder. Fatos emocionantes ocorriam quase todos os dias. Conversões poderosas multiplicaram-se e experimentou-se por toda a cidade uma grande e bendita mudança espiritual. Converteram-se os habitantes mais cultos e influentes da região. Estávamos distantes da envenenadora influência da oposição levantada pelo dr. Beecher e pelo sr. Nettleton, razão pela qual pouquíssimos se opunham ali ao avivamento, principalmente entre os que professavam a fé. Pelo que pude perceber, tudo parecia progredir harmoniosamente na igreja. Os habitantes da região convenceram-se da necessidade de um avivamento e estavam muito gratos por Deus os ter visitado.

Assistimos à conversão da maioria dos homens de destaque naquela comunidade. Entre eles, estava o dr. Wright, que, como diziam e como eu supunha, era incrédulo. Era muito respeitado como profissional e tinha grande facilidade de comunicação. De início, manifestou muita hostilidade contra o avivamento e declarou que o povo estava louco. No entanto, o dr. Wright passou a ser assunto especial das orações da srta. Seward e de outros que se preocupavam com ele. Os que oravam por ele acreditavam que, a despeito de sua veemente oposição, ele não demoraria a converter-se.

Certo domingo, pela manhã, ele veio ao culto e percebi que os que intercediam por ele estavam com o rosto inclinado, orando durante quase todo o sermão. Antes do anoitecer, ficou claro que a oposição do dr. Wright começava a ceder. Ele ouviu várias pregações durante o dia e passou aquela noite num estado de muita perturbação de alma. Na manhã seguinte, foi-me visitar, mostrando-se submisso como uma criança e confessou que até ali vivera enganado. Com total franqueza, abriu o coração e declarou a mudança que se operara nele. Ficou claro que o dr. Wright passara a ser um homem diferente e, daquele dia em diante, ele dedicou-se com todas as suas forças à obra do avivamento.

Outro fato digno de nota deu-se com o sr. Tilden, comerciante, que na época era provavelmente o cidadão mais destacado e rico da cidade. Porém era um cético. Lembro-me de que, em certo culto vespertino, preguei sobre o tema: "A amizade com o mundo é inimizade com Deus" (Tg 4.4). O sr. Tilden estava presente. Era homem de boa moral, na acepção da palavra, por isso era difícil aplicar à sua consciência algo que o convencesse de pecado. Sua mulher era crente e sua filha já se convertera ao Senhor. As coisas que estavam acontecendo na cidade e na família atraíram a sua atenção, a ponto de ele passar a freqüentar os cultos para ouvir o que era dito. No dia seguinte àquele em que preguei o sermão contra a depravação moral, ele confessou-me que se convencera de pecado. Contou que aquela convicção o dominara com poder irresistível. Percebeu que os conceitos ensinados ali eram pura verdade e assegurou-me de que sua decisão de servir ao Senhor até o fim da vida fora tomada com muita firmeza.

Lembro-me, também, de que John T Avery, que seria um evangelista de renome e durante muitos anos trabalharia arduamente em vários lugares, estava presente naquele culto. Sua família morava em New Lebanon. Ele nascera e fora criado ali e talvez tivesse quinze ou dezesseis anos de idade na ocasião em que preguei aquele sermão. Na manhã seguinte, John Avery veio até mim — um dos jovens convertidos mais fervorosos que eu já vira. Contou-me, de início, o que se passara em sua mente durante vários dias e acrescentou: "Senti-me completamente envolvido por aquele sermão e ele me deixou abalado. Pude entendê-lo perfeitamente. Abri mão de mim mesmo e entreguei-me totalmente a Cristo". Jamais esqueci suas palavras.

Não preciso, porém, prolongar-me narrando casos semelhantes. Poderia gastar horas relatando incidentes, bem como a conversão de indivíduos em particular. Mas não devo entrar demasiadamente nos pormenores, pois correria o risco de aumentar em proporções impróprias esta narrativa. Preciso, no entanto, mencionar um pequeno incidente relacionado com a oposição que se manifestava em Troy.

O presbitério de Columbia estava reunido num local dentro de sua jurisdição e, informado de que eu promovia um avivamento em uma das igrejas a ele afiliadas, nomeou uma comissão para visitar o local onde eu trabalhava, a fim de se informar dos fatos. Isso porque, influenciados por algumas pessoas de Troy e de outros lugares, pela oposição do sr. Nettleton e pelas cartas do dr. Beecher, os membros do presbitério convenceram-se de que os métodos usados por mim na condução dos avivamentos eram censuráveis e que, por isso, tinham o dever de abrir um inquérito contra mim. Dois pastores foram nomeados para visitar o local e levantar informações. Conforme fiquei sabendo depois — não me lembro de ter sido informado a respeito disso na ocasião — a notícia da decisão do presbitério chegou a New Lebanon e os crentes dali temiam que a chegada da comissão criasse alguma divisão e desordem.

Os crentes mais envolvidos fizeram do assunto o alvo principal de suas orações e, durante um ou dois dias antes da data marcada, oraram muito, suplicando ao Senhor que anulasse aquele plano e não permitisse que a igreja viesse a dividir-se ou que algum elemento de discórdia fosse nela introduzido. Esperava-se que os dois pastores chegassem para os cultos de domingo. No dia anterior, porém, houve uma violenta tempestade e a neve caiu tão espessa que, embora já estivessem a caminho, foi-lhes impossível chegar a Troy. Sem poder retomar a viagem no domingo e na segunda-feira, resolveram voltar às suas respectivas congregações. Tratava-se do rev. Joel Benedict e do rev. Chester, este pastor da Igreja Presbiteriana em Hudson, NY, aquele pastor da Igreja Presbiteriana em Chatham, aldeia que ficava uns 25 quilômetros abaixo de Albany, no rio Hudson.

Pouco tempo depois, recebi uma carta do irmão Benedict, informando que o presbitério o nomeara membro de uma comissão instituída com a finalidade de me visitar e informar-se de meus métodos de trabalho. Convidou-me a passar um domingo com ele e a pregar em sua igreja. Aceitei o convite. Conforme fiquei sabendo, o relatório que ele deu ao presbitério dizia ser desnecessária e inútil qualquer medida diante da situação. Aquele irmão revelou estar convicto de que era o Senhor quem operava naquela obra e que os pastores do presbitério deviam tomar cuidado para não serem achados em luta contra Deus. Não ouvi mais notícias de oposição por parte daquele presbitério.

Nunca duvidei de que o presbitério de Columbia tivesse agido com honestidade ao mostrar-se alarmado com as notícias que ouviram a meu respeito. Jamais questionei ou considerei inapropriadas as medidas que adotaram. Pelo contrário, sempre admirei a transparência que demonstraram ao aceitar o testemunho de diversas fontes, que fizeram aquietar os seus receios. E, que eu saiba, passaram a simpatizar com a obra, que prosseguia. A oposição levantada pelo dr. Beecher e pelo sr. Nettleton estava superada.

Creio que ainda nessa época foi levantada a proposta, não sei por quem, de realizar uma convenção sobre a maneira de conduzir os avivamentos. Houve troca de correspondência entre os irmãos das igrejas do Oeste, que se haviam envolvido nos avivamentos e os irmãos do Leste, que lhes haviam feito oposição. Se não me falha a memória, ficou combinado que a convenção se realizaria em determinado dia do mês de julho, em New Lebanon, onde eu havia trabalhado e de onde eu saíra a fim de passar um breve período em Little Falls, no rio Mohawk, perto de Utica. Alguns incidentes emocionantes ocorreram durante minha breve estada ali, mas nada tão marcante que precise ocupar espaço nesta narrativa, visto que aquele período foi bem curto, já que precisei retornar a New Lebanon para participar da convenção.

Parece-me que o propósito da convenção foi, posteriormente, mal interpretado por um grande número de pessoas. Penso que ficou na mente dos que ali estavam a impressão de que alguma queixa fora levantada contra mim e que o objetivo principal daquele encontro era julgar meus atos, num processo formal colocado diante de um concílio. Mas, de modo algum, era essa a situação. Não fui eu quem convocou a convenção. Não tinha maiores interesses que qualquer outro participante. O objetivo da convenção era descobrir os fatos envolvidos nos avivamentos — contra os quais houvera tanta oposição — trocar idéias a respeito deles, comparar pontos de vista e ver a possibilidade de um melhor entendimento entre os que se opunham ao movimento e os irmãos que haviam sido instrumentos em promovê-lo.

Cheguei a New Lebanon um ou dois dias antes do evento. No dia determinado, chegaram os membros convidados. Não haviam sido nomeados por nenhum grupo eclesiástico e sim convidados pelos irmãos do Leste e do Oeste a fim de se consultarem mutuamente. Nenhum de nós representava qualquer igreja ou organização eclesiástica. Não estávamos reunidos para agir sob alguma autoridade ou em nome de uma igreja ou de suas unificações, mas apenas, como já disse, para trocar idéias, comparar pontos de vista e verificar se alguma coisa existia de errado — nesse caso trataríamos de corrigir qualquer erro, de um lado ou de outro. Quanto a mim, por ter a certeza de que as coisas das quais aqueles irmãos se queixavam em suas cartas não tinham a mínima base, supunha que, tão logo os irmãos se reunissem e trocassem opiniões e os fatos fossem esclarecidos, os irmãos do Leste, que se haviam oposto aos avivamentos — principalmente o dr. Beecher e o sr. Nettleton — perceberiam que estavam enganados, reconhecendo seu erro e o assunto seria encerrado.

Dos irmãos que fizeram parte da convenção, lembro-me dos seguintes: do Leste, vieram o dr. Beecher e o sr. Nettleton; o rev. Joel Hawes, de Hartford; o rev. Dutton, de New Haven; o rev. Humphrey, presidente da Faculdade de William; o rev. Justin Edwards, de Andover. E um número considerável de irmãos do Leste, de cujos nomes não me recordo. Do Oeste, ou seja, da parte central do estado de Nova York, onde os avivamentos estavam acontecendo, vieram o rev. Beman, de Troy; o dr. Lansing, de Auburn; o sr. Aikin, de Utica; o rev. Frost, de Whitesboro; o rev. Moses Gillett, de Rome; o rev. Coe, de New Hartford; o rev. George W. Gale, de Western; o rev. William R. Weeks, de Paris Hill. E, além de mim, talvez tenham vindo outros pastores, de cujos nomes não me lembro agora.

Logo descobrimos que o dr. Beecher havia elaborado algum plano para organizar a convenção à sua maneira. Nós, porém, não demos importância a isso. A convenção foi estabelecida e, acredito, o rev. Humphrey presidiu-a como moderador. Não se notava ali a mínima falta de bons sentimentos entre os participantes. É verdade que os membros vindos do Oeste suspeitavam de que o sr. Weeks, conforme dei a entender anteriormente, fosse o maior responsável pelos mal-entendidos divulgados entre os irmãos do Leste. Assim que a convenção teve início e o assunto foi esclarecido, os irmãos do oeste abriram uma sindicância para descobrir de que fontes o dr. Beecher e o sr. Nettleton haviam recebido as informações que os levaram a tomar aquela posição.

Tínhamos sido muito cuidadosos quando procuramos descobrir quem enganara os irmãos com idéias que os levaram a assumir aquela atitude contra os avivamentos. Descobrir isso era prioritário para nós. Queríamos saber de onde surgira toda aquela misteriosa oposição. Por isso, levantamos imediatamente a pesquisa para saber daqueles irmãos a fonte das informações. Percebeu-se de imediato, porém, que a pergunta era constrangedora.

Quero declarar agora, de maneira a ser nitidamente compreendido, o que deveria ter mencionado antes: nenhuma oposição havia sido manifestada por nenhum dos pastores do Leste presentes à convenção, a não ser da parte do dr. Beecher e do sr. Nettleton. Desde o início das reuniões, era fácil notar que o dr. Beecher assumira com dele mesmo o compromisso de defender sua reputação pessoal, que estava em jogo. Visto que algumas de suas cartas haviam sido divulgadas pela imprensa, ele seria responsabilizado por elas, caso ficasse comprovado serem de sua autoria. Ficou bastante claro que tanto ele quanto o sr. Nettleton estavam com a consciência muito intranqüila. Além disso, era evidente que o dr. Beecher conseguira o comparecimento dos ministros mais influentes da Nova Inglaterra a fim de obter o apoio do público e justificar a posição que adotara. Quanto ao sr. Nettleton, o dr. Beecher lhe assegurara que receberia o apoio da Nova Inglaterra e que todos os representantes legais das igrejas ali o apoiariam e sustentariam sua posição.

Conforme mencionei, já no início da convenção perguntamos aos irmãos onde haviam obtido as informações nas quais baseavam sua oposição e às quais se referiam tão constantemente em suas cartas. Quando a pergunta foi feita, o dr. Beecher respondeu: "Não viemos aqui para ser interrogados. Nossa dignidade espiritual impede-nos de responder a qualquer pergunta desse tipo". Quanto a mim, eu achava muito estranho que não nos fosse permitido saber a fonte daquelas informações. Afinal, cartas que faziam oposição aberta aos avivamentos haviam sido publicadas e afirmações que não se baseavam em fato algum foram consideradas legítimas. Grande tempestade de oposição levantara-se por toda a região e estávamos ali reunidos para esclarecer o assunto. A imagem de nosso trabalho fora totalmente deturpada e o resultado disso foi um grande prejuízo à causa de Cristo. Queríamos saber — e pensávamos ter esse direito — quem havia causado todos aqueles mal-entendidos. Vimo-nos, porém, totalmente impedidos de descobrir qualquer coisa a respeito.

A convenção durou vários dias. E, à medida que os fatos com referência aos avivamentos eram citados nas reuniões, o irmão Nettleton ficava com os nervos tão abalados, que teve de faltar a várias sessões. Percebia claramente que perdia terreno e que não era possível averiguar nada que justificasse a posição que adotara. Esse fato deve ter sido muito visível também para o dr. Beecher.

Eu já deveria ter mencionado que, no momento de esclarecer os fatos referentes aos avivamentos, o dr. Beecher declarou não concordar em que fosse aceito o testemunho dos irmãos do Oeste, que promoviam os avivamentos. Alegava que, em certo sentido, éramos réus na questão, por termos sido objeto da censura dele; que o fato de expressarmos nossos pontos de vista seria testemunhar em causa própria; que os fatos não deveriam ser aceitos tal como apresentados por nós. No entanto, os irmãos do Leste não se mostraram favoráveis a essa idéia. O dr. Humphrey declarou, com muita firmeza, que éramos as melhores testemunhas que se podiam apresentar, pois sabíamos o que nós mesmos havíamos feito, bem como todos os fatos ocorridos durante os avivamentos. Éramos, portanto, as testemunhas mais competentes e fidedignas e nossas declarações deveriam ser acolhidas sem hesitação. Pelo que sei, todos concordaram, excetuando-se o dr. Beecher e o sr. Nettleton.

Ficou bem claro que essa decisão perturbou grandemente o dr. Beecher e o sr. Nettleton. Eles perceberam que, se os fatos fossem relatados pelos irmãos que testemunharam os avivamentos e que sabiam, portanto, de tudo que ali havia sucedido, a realidade desfaria totalmente os mal-entendidos e todas as falsas declarações feitas e aceites a respeito do assunto. Nossas reuniões foram muito fraternais, do começo ao fim, sem nenhuma contenda ou amargura. Excetuando-se os dois que mencionei — o dr. Beecher e o sr. Nettleton — os irmãos vindos do Leste pareciam sinceros e desejosos de conhecer a verdade e alegraram-se ao saber dos pormenores dos avivamentos ocorridos no Oeste.

Durante a convenção, vários temas foram debatidos. Um dos principais dizia respeito a ser ou não permitido às mulheres participação ativa nos cultos. Foi o dr. Beecher quem levantou objeção, argumentando longamente e insistindo em que tal prática era antibíblica e inadmissível. O dr. Beman respondeu com um discurso breve, no qual demonstrou, conclusivamente, ser essa prática conhecida entre os apóstolos. Citou 1 Coríntios 11, onde Paulo chama a atenção da igreja para o fato de as mulheres cristãs terem enfrentado problemas por causa do preconceito oriental contra a prática de orarem nos cultos sem o uso do véu. Demonstrou claramente que o apóstolo não se queixava da participação feminina no culto e sim do fato de as mulheres não estarem cobertas com véu, o que vinha de encontro aos costumes e dera ocasião a queixas da parte dos pagãos. Paulo não estava querendo reprovar as mulheres que oravam em público, simplesmente as admoestava a usar o véu quando assim fizessem. Nenhuma contestação foi feita à resposta do dr. Beman — era por demais convincente para admitir contestação.

Perto do fim da convenção, o sr. Nettleton mostrou-se claramente agitado e disse que apresentaria as razões por que tomara aquela atitude. Segundo ele, tinha em seu poder "uma carta histórica", na qual reconhecia os motivos e declarava os fatos sobre os quais baseara sua oposição aos avivamentos. Fiquei contente quando ouvi o aviso de que ele iria ler a carta diante da convenção. Uma cópia dessa carta fora enviada ao sr. Aikin enquanto eu trabalhava com ele em Utica e ele a passara para mim. Eu tinha a carta em minhas mãos durante a convenção e teria levantado o assunto no momento oportuno, se o sr. Nettleton não o tivesse feito.

Pelo desenrolar dos fatos, ficou claro que o sr. Nettleton não fazia a mínima idéia de que eu possuísse uma cópia da carta ou de que já a tivesse lido. Era uma declaração, com temas distintos, das coisas a respeito das quais ele se queixava e que, segundo informações por ele recebidas, estavam sendo praticadas naqueles avivamentos, especialmente por mim. Ainda que meu norne não fosse mencionado muitas vezes, ficou claro que a carta fora redigida especialmente contra mim. As queixas eram apresentadas de tal maneira que era inconfundível o objetivo de me acusar de ser o causador daquela situação. A convenção ouviu com atenção a leitura de toda a carta, que durou o equivalente a um sermão. O sr. Nettleton passou a ver que a convenção tinha diante dela os fatos com base nos quais ele agira e que, supostamente, exigiam e justificavam sua atitude.

Depois que ele se sentou, levantei-me e expressei minha satisfação por haver sido lida aquela carta. Dei ciência de que possuía uma cópia dela e que a teria lido, no momento oportuno, se o sr. Nettleton não tivesse feito sua le¡tura perante a convenção. Afirmei que, no que dizia respeito a mim pessoalmente, nenhuma das coisas negativas ali mencionadas havia acontecido. Eu não fizera nada daquilo que era mencionado na carta. E acrescentei: "Estão presentes aqui todos os irmãos junto dos quais atuei em todos esses avivamentos espirituais e eles sabem se mereço alguma dessas acusações. Se souberem ou acreditarem que alguma dessas coisas pode ser atribuída a mim, que o digam aqui e agora e confessarei imediatamente meu erro". Todos afirmaram imediatamente, quer por declaração verbal, quer por manifesta aquiescência, que nada sabiam de tais coisas.

O sr. Weeks estava presente. Já mencionei que supúnhamos ter sido ele quem forneceu ao irmão Nettleton algumas ou muitas daquelas informações. Eu esperava, por conseguinte, que, se algo fosse dito em resposta à minha contestação pública das coisas de que o sr. Nettleton me acusava, seria da parte do sr. Weeks. Não tive dúvida de que ele se considerava detentor de todos os fatos e que passaria a relatá-los ali. Supunha ainda, que, se ele tivesse escrito ao dr. Beecher ou ao sr. Nettleton confirmando aqueles fatos, se sentiria no dever de tomar a palavra e justificar o que escrevera. Mas, ao contrário do que imaginei, o sr. Weeks não disse uma única palavra. Nenhum dos presentes fez menção de justificar uma única frase da "carta histórica" do sr. Nettleton. Naturalmente, isso deixou atônitos o sr. Nettleton e o dr. Beecher. E a leitura da carta, com suas conseqüências imediatas, preparou o caminho para o encerramento da convenção.

Seguem-se agora, algumas coisas que lamento ter a obrigação de mencionar. O irmão Justin Edwards estivera presente a todos os debates e, acredito, acompanhara todas as sessões da convenção. Era amigo íntimo do dr. Beecher e do sr. Nettleton e deve ter percebido com clareza em que pé ficara a questão. Não sei se a pedido do dr. Beecher, quase no fim da convenção esse irmão apresentou uma série de resoluções, pelas quais, passo a passo, propunha a desaprovação de vários métodos adotados nos avivamentos.

Nas resoluções, eram repassadas quase todas, senão todas, as práticas especificadas na "carta histórica" do sr. Nettleton e para todas elas pedia reprovação. Depois de lidas as resoluções, vários irmãos do Oeste disseram imediatamente: "Somos a favor de todas essas resoluções, mas qual o objetivo? É óbvio que seu propósito é criar a impressão de que tais coisas foram praticadas, que esta convenção, ao condená-las, condena os irmãos envolvidos nos avivamentos e que, portanto, esta convenção justifica a oposição contra aquela obra". O dr. Beecher insistiu em que o propósito das resoluções era inteiramente prospectivo e que nada do que fora afirmado ou subentendido se referia ao passado. As resoluções serviriam meramente de metas, para deixar claro que a convenção desaprovaria semelhantes coisas, se porventura viessem a existir, sem a mínima implicação com o passado.

A resposta imediata foi dada nos seguintes termos: semelhantes queixas já haviam circulado entre os presentes e em razão disso ficava evidente que as resoluções tinham o propósito de encobrir os opositores e dar a impressão de que haviam sido praticadas nos avivamentos as coisas condenadas por tais resoluções, sendo justificada dessa maneira a oposição movida pelo dr. Beecher e pelo sr. Nettleton. Na realidade, ficou perfeitamente claro que, da parte do dr. Beecher e do sr. Nettleton, era essa a intenção. Os irmãos do Oeste afirmavam: "É lógico que votaremos a favor dessas determinações. Acreditamos nelas tanto quanto vocês e desaprovamos tais práticas tanto quanto vocês. Por isso, não podemos deixar de votar a favor delas. Mas queremos dizer que acreditamos que elas têm a intenção de justificar a oposição levantada contra os avivamentos e que sua aplicação é retrospectiva, não prospectiva".

Acredito que as decisões, porém, foram aprovadas por unanimidade. Lembro-me de ter dito que, de minha parte, estava disposto a deixar que as resoluções fossem publicadas e todos os fatos deixados ao solene juízo do público que as lesse. Então, propus que, antes do encerramento, fosse aprovada uma deliberação contra a indiferença religiosa e esta fosse condenada tão fortemente quanto qualquer uma das práticas mencionadas nas referidas resoluções. O dr. Beecher declarou não haver perigo de indiferença religiosa. Então a convenção foi suspensa por prazo indeterminado.

Não preciso dizer como as atas da convenção foram recebidas pelo público. No segundo volume da biografia do dr. Beecher, na página 101, encontro a seguinte nota do editor: "O exame cuidadoso das atas dessa convenção deu-nos a certeza de não ter havido diferença radical de opiniões entre os irmãos do Oeste e os da Nova Inglaterra. E, não fosse a influência de um único indivíduo, poderia ter sido alcançado o mesmo entendimento posteriormente celebrado em Filadélfia". Sem dúvida, essa é a verdade. O caso é que se o sr. Nettleton não tivesse prestado atenção a relatórios falsos nem assumido uma postura contrária aos avivamentos, nenhuma convenção teria sido realizada nem sequer cogitada para discutir o assunto. Era muito estranho que ele tivesse atribuído tanto crédito a tais relatórios, os quais continham óbvias deturpações. Mas ele estava quase esgotado, com medo e com os nervos à flor da pele. Tinha ainda o defeito — mencionado pelo dr. Beecher em sua biografia — de nunca abrir mão da própria vontade. Tenho a certeza de estar dizendo isso com sentimentos amáveis para com o sr. Nettleton. Nunca tive outro sentimento a respeito do caso.

Depois da convenção, o sentimento público contra o irmão Nettleton tornou-se esmagador. Em fins do Outono do mesmo ano, encontrei-me com ele na cidade de Nova York. Contou-me que estava ali para publicar, em forma de panfletos, suas cartas contra os avivamentos. Perguntei-lhe se iria publicar sua "carta histórica", lida na convenção. Disse que precisava publicar suas cartas, a fim de justificar o que havia feito. E eu retruquei que, se ele publicasse aquela carta, a reação seria a ruína dele próprio, uma vez que todos os que testemunharam os avivamentos perceberiam a falta de motivo em suas ações. Ele respondeu que as publicaria assim mesmo e arriscaria a reação. Publicou várias cartas, mas, segundo estou informado, a "carta histórica" nunca veio a público. Se fosse verdadeira, sua publicação teria dado a impressão de que fora requerida pelos opositores. Mas como seu conteúdo era falso, foi melhor não tê-la publicado.

Neste ponto, devo comentar, de leve, algumas coisas que vejo na biografia do dr. Beecher e que, segundo minha crítica, envolviam mal-entendidos. A biografia retrata-o como tendo justificado, até o dia de sua morte, a oposição que fazia aos avivamentos, ou melhor, à maneira em que eram conduzidos, e como declarara que os males dos quais se queixava eram reais, tendo sido corrigidos graças à oposição que ele empreendera. Se essa foi a conclusão a que o dr. Beecher chegou depois daquela convenção, por certo ele considerava os irmãos que negaram as práticas descritas na carta enviada ao dr. Taylor um bando de mentirosos e por isso deve ter rejeitado nosso testemunho coletivo. Mas, se ele e o sr. Nettleton estavam realmente desejosos de justificar sua oposição e ainda acreditavam nas declarações feitas na "carta histórica", por que não a publicaram para apelar às pessoas que testemunharam os avivamentos? Se a carta fosse a expressão da verdade, sua publicação teria sido a justificativa de ambos. Se ainda acreditavam na veracidade daquela carta, por que ela não foi publicada com as demais cartas do sr. Nettleton?

Já me referi ao fato de que os acontecimentos naquela convenção abalaram a confiança do dr. Beecher no bom senso e na justiça da oposição feita pelo sr. Nettleton. Um ano e meio depois da convenção e da publicação das cartas do sr. Nettleton, estava eu em Boston quando ouvi o dr. Beecher dizer, ao se referir àquela convenção, que "nem por mil dólares teria aceitado que o sr. Nettleton viesse para Boston". Seria possível que o dr. Beecher tivesse acreditado até o dia de sua morte que os pastores das igrejas onde ocorreram os avivamentos eram mentirosos e não mereciam crédito com referência a fatos que, certamente, eram do conhecimento dele? O que as igrejas envolvidas dirão diante disso?

Descubro nas biografias do dr. Beecher e do sr. Nettleton muitas queixas contra o espírito de animosidade que predominava nos avivamentos. O erro desses irmãos foi atribuir um espírito de denúncia ao grupo errado. Pelo que me lembre, nunca ouvi o nome do dr. Beecher ou do sr. Nettleton ser mencionado publicamente durante os avivamentos e, certamente, não em tom de censura. Pelo que sei, nem sequer em conversas particulares seus nomes eram referidos com sentimento de amargura.

Os envolvidos nos avivamentos tinham um espírito cristão de amabilidade, tão longe quanto possível do espírito de denúncia. Se tivesse havido entre eles esse espírito de denúncia, jamais teriam conseguido promover tão bem-aventurados avivamentos, com resultados tão gloriosos. Pelo contrário, as denúncias provinham do lado da oposição. Uma citação da biografia do dr. Beecher pode ilustrar a animosidade que imperava do lado dele. Na página 101 do volume 2, está registrado que o dr. Beecher me disse na convenção em New Lebanon: "Finney, sei qual é seu plano e você sabe disso. Você pretende chegar a Connecticut e levar a Boston chamas de fogo. Mas, se você tentar isso, tão certo como vive o Senhor, enfrentarei você na fronteira do estado. Convocarei toda a artilharia e lutarei contra você, centímetro a centímetro, em sua caminhada até Boston e depois lutarei contra você naquela cidade". Não me recordo de ter ouvido o dr. Beecher dizer tal coisa. Mas, se ele se lembra disso, que as mesmas palavras sirvam para ilustrar o espírito de sua oposição.

A verdade é que ele estava totalmente enganado. Eu não tinha nenhum plano ou desejo de ir a Connecticut ou a Boston. Essas e outras tantas coisas que descubro em sua biografia demonstram sua completa ignorância a respeito do caráter, dos motivos e da atuação daqueles que envidaram tantos esforços naqueles gloriosos avivamentos. Escrever estas coisas não me traz o mínimo prazer. Descubro nessa biografia bastante informação que me surpreende e que me leva à conclusão de ter havido algum engano, a ponto de o dr. Beecher ter sido mal compreendido e difamado. Mas tratarei agora de outros assuntos.

Depois daquela convenção, nada mais ouvi falar da oposição do dr. Beecher e do sr. Nettleton. O sr. Nettleton publicou suas cartas, em forma de panfleto, com o propósito de se justificar a si mesmo. Mas, essas cartas devem ter caído mortas do prelo, por assim dizer, porque quase nunca ouvi qualquer alusão a elas. A oposição sob aquela forma já se esgotara. Mesmo recebendo tanta oposição, os resultados obtidos com os avivamentos foram suficientes para calar os críticos e convencer a todos de que eles eram, de fato, avivamentos espirituais puros e gloriosos — longe de serem censuráveis, em comparação com qualquer avivamento que já tivesse ocorrido no mundo.

Qualquer pessoa pode ler em Atos dos Apóstolos o que os discípulos fizeram na liderança dos avivamentos em seus dias, bem como o que eles dizem em suas epístolas a respeito das reações, dos desvios e das apostasias que se seguiram. Assim, poderão descobrir também a verdade em relação aos gloriosos avivamentos a respeito dos quais até aqui escrevi: seu início, seu progresso e seus resultados, que se têm manifestado em menor ou maior grau durante quase 40 anos. Não poderão deixar de perceber quanto são puros e que os resultados obtidos são tão notáveis quanto os dos tempos apostólicos.

A pureza e o poder dos avivamentos devem aumentar na mesma proporção em que aumentam as informações sobre eles. Nos tempos apostólicos, os que se convertiam eram ou judeus, com todo o seu preconceito e ignorância, ou pagãos, em toda a sua degradação. A arte da imprensa ainda não havia sido descoberta. Cópias do Antigo Testamento e da Palavra de Deus não podiam ser obtidas, a não ser pelos ricos que tinham possibilidade de comprar os manuscritos. Não havia ainda literatura cristã que pudesse ser oferecida às massas. Os meios de instrução não estavam disponíveis para o povo. Com tanta falta de luz e com tanta ignorância, tantas falsas noções de religião, tantas influências enganosas e aviltantes e tão poucas facilidades para manter uma reforma religiosa, não se podia esperar que os avivamentos fossem puros e isentos de erros lamentáveis como se espera nestes últimos dias, já que os cristãos hoje podem ter a Bíblia na mão e podem contar com tantos meios de instrução.

Temos e pregamos o mesmo evangelho que os apóstolos pregavam. Temos todas as condições de nos proteger contra erros de doutrina e de prática e de manter uma religião evangélica sadia. As pessoas entre as quais prevaleceram os grandes avivamentos de nosso tempo eram inteligentes e cultas. Entre elas havia muitas pessoas de instrução secular e religiosa. Quase todas as igrejas contavam com um pastor formado, capaz e fiel. Esses pastores tinham plena autoridade para julgar a capacidade, integridade e discrição do evangelista cujos serviços queriam aproveitar. Tinham plena autoridade para julgar se os métodos adotados pelos evangelistas eram apropriados ou não.

Do modo mais marcante e notável, Deus colocou o seu selo sobre as doutrinas pregadas e os métodos empregados naquela grande obra. Os resultados agora podem ser verificados em todas as partes do país. Os convertidos naqueles avivamentos continuam vivendo e trabalhando para Cristo e pela conversão de almas em todo o país. Não é lisonja nenhuma dizer que eles estão entre os cristãos mais cultos e esforçados deste ou de qualquer outro país. Os métodos adotados nesses avivamentos, em nenhum sentido real, podiam ser censurados. Tratava-se simplesmente de pregação, oração e reuniões para instrução, oração e confissão, conforme a necessidade do povo. Não havia rebeldia nem sinal de fanatismo ou de heresia. Nenhum espírito de ofensa ou de denúncia existia entre os convertidos.

Realmente, nunca vi nem ouvi falar a respeito de avivamentos espirituais mais isentos de tudo que é deplorável. Nunca ouvi falar de avivamentos que tenham despertado ou ocasionado, de modo tão misterioso, tanta oposição da parte de homens que podiam ser considerados bons, mas que estavam errados. Tantas coisas foram ditas e escritas a respeito dos novos métodos que parece ter sido tomado por certo que existia muita coisa lamentável nos meios utilizados para promover aquela obra bem-aventurada do Espírito Santo. Isso, porém, é puro engano.

Tenho trabalhado exaustivamente neste país e na Europa e nenhuma objeção foi levantada contra os métodos que utilizo. Tem sido até dito e asseverado que, depois da oposição levantada pelo sr. Nettleton e pelo dr. Beecher, eu me corrigi e abri mão das práticas de que eles se queixavam. Outra vez, é puro engano. Sempre e em todos os lugares, emprego os mesmos métodos utilizados naqueles avivamentos e, freqüentemente, acrescento outros métodos — como o "banco dos aflitos" — conforme considero apropriados.

Nunca senti necessidade de corrigir meus métodos. Se eu pudesse viver minha vida outra vez, acho que, com a experiência de mais de quarenta anos em avivamentos, meus métodos, em semelhantes circunstâncias, seriam substancialmente os mesmos. E que ninguém pense que tomo o crédito para mim. Nada disso! Nada foi feito por sabedoria minha. Fui levado a sentir minha ignorância e dependência e a buscar continuamente orientação da parte de Deus. Nunca tive a mínima dúvida de que Deus me orientava pelo seu Espírito quanto ao caminho que eu devia seguir. Ele me dirigia tão claramente, dia após dia, que nunca duvidei de que, em tudo, recebia orientação divina.

É completo erro supor que a oposição do dr. Beecher e do sr. Nettleton me tenha feito sentir envergonhado, como registra a biografia do dr. Beecher, ou que me corrigi, ou ainda que só em conseqüência disso ela tenha cessado. Com toda a segurança, posso apelar a todos que me escutaram naqueles avivamentos e testemunharam os métodos usados por mim, que eram os mesmos em todos os lugares, que declarem se os empreguei ou não na região central do estado de Nova York. Naqueles grandes avivamentos e em muitos outros lugares, tive o cuidado de implantar outras medidas conforme me pareceram necessárias.

Não duvido de que os irmãos que se opunham aos avivamentos fossem homens bons. Não duvido também de que alguém mal orientado e iludido os tenha enganado, por sua vez. Se eles morreram acreditando que tinham motivo justo para o que fizeram, escreveram e disseram e que corrigiram os males dos quais se queixavam, então morreram enganados. Não contribuiria para o bem-estar da igreja, nem para a honra dos avivamentos, nem para a glória de Cristo as gerações futuras acreditarem que aqueles males realmente existiram e foram corrigidos por causa do espírito e das atitudes acima descritos. Eu teria mantido silêncio, se não se tivessem esforçado para propagar e confirmar a ilusão de que a oposição aos avivamentos se justificava e que foi bem-sucedida. A verdade é que não era isso o que acontecia.

Não tenho a mínima dúvida de que o dr. Beecher tenha sido levado por alguém a acreditar que a oposição feita por ele aos avivamentos se justificava. Tomando por base sua biografia, parece que, em Filadélfia, durante a primavera depois da convenção, foi combinado entre ele, o dr. Beman e outros que abandonariam o assunto, nada mais publicando a respeito dos avivamentos. A verdade é que todas as controvérsias e todas as publicações partiram da oposição. Antes do encontro em Filadélfia, o sr. Netdeton já publicara as suas cartas e nada mais vi na imprensa a respeito do assunto.

Não participei do acordo firmado em Filadélfia. Mesmo assim, se a biografia do dr. Beecher não tivesse reaberto a questão, com o óbvio propósito de justificar a postura que adotara e de imprimir na mente do povo a idéia de que prestara um grande serviço com sua oposição aos avivamentos, não me sentiria com o dever de falar aquilo que, agora, não posso omitir. Escrevo com base naquilo que pessoalmente conheço e não me importa quem possa ter passado ao dr. Beecher o relato dos supostos fatos que o levaram a agir. Não há dúvida de que eram substancialmente idênticos aos mencionados na "carta histórica" do sr. Nettleton, lida diante da convenção.

Conforme declarei diante da convenção, os fatos ali citados nada provavam, e com isso concordaram todos os irmãos entre os quais eu trabalhara. Se algo pode ser provado pelo testemunho humano, aquilo era prova suficiente. Se sua biografia expressa a realidade de seus pensamentos, então o dr. Beecher não acreditou no testemunho daqueles irmãos. E, quanto a isso, o que dirão as igrejas do condado de Oneida? Acreditarão realmente que homens como o rev. Aikin, o rev. John Frost, o rev. Moses Gillett, o rev. Coe e os demais homens daquele condado presentes na convenção mentiram deliberadamente sobre um assunto que cada um deles tinha conhecido pessoalmente? Nunca poderão acreditar nisso.

Não importa quais tenham sido os informantes do dr. Beecher. O certo é que nenhum daqueles pastores lhe passou alguma informação que justificasse a sua oposição. E não houve quem entendesse a situação tão bem como eles. Por isso, visto que a convenção reconheceu serem eles as melhores testemunhas do que era dito e feito em suas respectivas congregações, sendo o testemunho deles unânime, conclui-se que nenhuma das alegações da "carta histórica" do sr. Nettleton era verdadeira.

Nunca descobrimos de quem o dr. Beecher e o sr. Nettleton receberam as informações. Isso em si já desperta suspeita. Se as coisas afirmadas pelos seus correspondentes eram verídicas, por que ocultar o nome deles? Teriam os dois o direito de acolher semelhantes informações, agir com base nelas de modo tão notório e, ainda assim, recusarem-se a revelar os nomes dos informantes? Li as terríveis acusações levantadas contra os irmãos que trabalhavam com ardor nos avivamentos. Em sua carta ao dr. Taylor, o dr. Beecher declarava que sua correspondência justificaria sua conduta, bem como o que escrevia contra aqueles irmãos. Quando fiquei sabendo que a questão seria desvendada em público, por meio da biografia do dr. Beecher, imaginei que finalmente ficaríamos sabendo o nome dos autores dos relatórios, mediante a publicação da correspondência por ele recebida. Nada, porém, existe nessa correspondência que justifique sua atitude. Assim, continuarão públicas as acusações, enquanto a correspondência que alegadamente as justificaria permanece oculta? E, se o dr. Beecher rejeitou nosso testemunho até o dia de sua morte, qual a razão de não podermos saber de quem partiu o testemunho contrário, que anula o nosso?

Na página 103 do volume 2 da autobiografia do dr. Beecher, encontramos o seguinte: "Na primavera de 1828, ao conversar sobre o assunto, o dr. Beecher disse: 'Descobri que os amigos do sr. Finney estavam planejando causar certa impressão na assembléia geral, que se reuniria em Filadélfia, para colocar um de seus homens no lugar do sr. Skinner. A igreja do sr. Skinner acabara de me convidar para pregar ali e respondi que assumiria o púlpito enquanto a assembléia estivesse reunida. Aquilo bloqueou os planos de alguém. Permaneci até o fim, quando Beman pregou durante metade do dia. Assim, foram frustrados os planos de alguém. Fracassaram. Não sei dizer o que isso significa. Ao ler as declarações acima, juntamente com a matéria que continua até o fim do capítulo e com outras coisas registradas na mesma biografia, fico atônito diante das suspeitas e ilusões que ocupavam a mente do dr. Beecher.

Não tenho a mínima idéia de ter ouvido falar que algum de meus amigos estivesse tentando ocupar o púlpito que o dr. Skinner deixara vago. Na época, eu era ministro da Igreja Presbiteriana e pregava em Filadélfia enquanto a assembléia estava reunida e o dr. Beecher também estava ali. Não sei até que ponto a influência do dr. Beecher sobre os membros daquela assembléia teve que ver com a misteriosa oposição que não demorou a surgir naquela agremiação contra os avivamentos, oposição que me senti obrigado a citar em minhas preleções. Continuei a atuar em Filadélfia e em outros lugares sem desviar minha atenção nem me mostrar atingido pelo que o dr. Beecher e o sr. Nettleton diziam ou faziam. Não me envolvi na controvérsia com eles.

Eu era inocente como uma criança no que se refere a toda aquela manipulação revelada na biografia do dr. Beecher. Parece que ele e o sr. Nettleton estavam assustados e cheios de suspeitas e falsos conceitos sobre meus motivos, planos e esforços, bem como sobre as intenções daqueles que eles consideravam meus amigos mais íntimos. Isso tudo ocorria enquanto eu atendia à obra de avivamento, sem ter nenhum plano ou propósito senão o de trabalhar onde e quando o Senhor me chamasse. Dediquei-me ao trabalho sem interrupção, a não ser durante os poucos dias que passei na convenção. Não compartilhei de nenhum dos terrores e perturbações que parecem ter acometido o dr. Beecher e o sr. Nettleton. Se algum de meus amigos compartilhava dessas aflições, eu não tinha conhecimento disso. O real testemunho dos esforços que empreendi até a data da convenção, e também a partir daí, demonstra quanto eu sabia do que o dr. Beecher e o sr. Nettleton diziam ou faziam contra mim. Louvo ao Senhor por ele me ter guardado, não permitindo que meu trabalho fosse impedido nem que eu experimentasse a mínima inquietação.

Conforme relatei, quando estava em Auburn, Deus me deu a certeza de que ele venceria toda a oposição sem que eu precisasse interromper a obra para responder aos meus oponentes. Nunca me esqueci disso. Com essa certeza vinda da parte de Deus, avancei com firmeza de propósito e espírito confiante, e agora, ao ler sobre as agitações, suspeitas e mal-entendidos que dominavam a mente do dr. Beecher e do sr. Nettleton, fico espantado com as aflições que meu trabalho lhes causava. Deus, porém, me mantinha cheio de amor e de fé, e fez com que meu coração e minhas mãos desfrutassem de muitas vitórias naquela obra.

Exatamente na época em que o dr. Beecher se encontrava em Filadélfia, maquinando com membros da assembléia geral, conforme relata em sua biografia, eu estava trabalhando com afinco, sem nenhuma prevenção contra a atuação do dr. Beecher naquela cidade, como fizera durante alguns meses, em várias igrejas, em meio a um poderoso avivamento espiritual. Segundo o que transpirou, ele estava ali para influenciar a assembléia geral contra mim e impedir que algum amigo meu ocupasse o púlpito que o dr. Skinner deixara vago. Não posso imaginar quem era esse amigo e quanto crédito ele mereceu em troca desse serviço.

Nunca poderei agradecer suficientemente a Deus por ele ter impedido que eu me sentisse perturbado ou que viesse a sofrer mudanças em meu espírito ou em meus conceitos a respeito da obra, diante da oposição que enfrentei naqueles dias. Conforme já relatei, não ouvi nem senti muita coisa da parte dos opositores depois daquela convenção. Soube depois que o sr. Nettleton lamentava profundamente a reação do público contra ele. Eu sabia que ele e o dr. Beecher haviam sido enganados por informações inverídicas e colocados, assim, em situação delicada. Mas só depois de ler suas biografias tomei consciência das aflições que ambos sofreram.

 

 

CAPÍTULO XVII.

O AVIVAMENTO EM STEPHENTOWN

 

Depois da convenção, permaneci um pouco mais em New Lebanon. Não creio que ela tenha prejudicado a situação espiritual dos habitantes daquela cidade. Haveria prejuízo para a obra se surgissem fatos que justificassem a oposição aos avivamentos, que sabidamente existia e fora o assunto daquele encontro. Acredito, porém, que a igreja em New Lebanon acabou edificada e fortalecida pelas notícias vindas da convenção. Realmente, tudo foi conduzido num espírito que tendia a edificar os fiéis, em vez de escandalizá-los.

Pouco tempo depois de suspensa a convenção, no domingo, quando desci do púlpito, uma jovem senhora chamada Sackett, de Stephentown, foi-me apresentada. Pediu-me que fosse pregar em sua cidade. Respondi que estava com a agenda cheia e que não via possibilidade de atender ao seu pedido. Percebi que as palavras dela estavam embargadas, demonstrando profundo sentimento, mas, sem tempo para conversar com ela naquele momento, fui para a casa onde estava hospedado. Pouco depois, informei-me a respeito de Stephentown, que fazia divisa a norte com New Lebanon.

Muitos anos antes, um homem rico falecera naquela cidade, deixando para a Igreja Presbiteriana um fundo financeiro cujos rendimentos bastariam para sustentar um pastor. Pouco depois, o sr. Bogue, que fora capelão no Exército Revolucionário, foi estabelecido ali como pastor da igreja. Sob a influência desse homem, a igreja foi sucumbindo. Finalmente, ele revelou-se um incrédulo assumido, causando uma impressão desastrosa na cidade. Bogue continuou morando ali e era abertamente hostil ao cristianismo. Depois que ele deixou o pastorado da igreja, atuaram em seu lugar um ou dois ministros. Mesmo assim, a igreja continuou em decadência e a condição espiritual de seus membros tornou-se cada vez pior. Por fim, abandonaram o templo, pois era muito reduzido o número de pessoas que freqüentavam os cultos dominicais. Passaram a realizá-los numa escola pequena que ficava nas proximidades.

O último pastor que atuou na igreja afirmou que continuaria ali até que o número de pessoas que se reunissem para ouvir suas pregações dominicais não chegasse mais a meia dúzia. Embora existisse um fundo financeiro para seu sustento e seu salário fosse pago com regularidade, ele não se sentia no dever de gastar seu tempo atuando em semelhante campo, por isso demitiu-se. Nenhuma outra denominação conseguiu despertar o interesse público e a cidade inteira era um deserto sem moralidade. Permaneceram ali três presbíteros da Igreja Presbiteriana e cerca de vinte membros. A única pessoa solteira na igreja era a srta. Sackett, a quem me referi. Quase todo o município estava mergulhado no erro. Era um município grande e rico, com muitas fazendas, mas sem nenhuma vila de grande população.

No domingo seguinte, a srta. Sackett procurou-me de novo quando desci do púlpito e implorou que eu fosse pregar em Stephentown. Perguntou-me se eu conhecia a situação do lugar. Informei-lhe que sim, mas não via maneira de ir até lá. Ela parecia estar demasiadamente emocionada para poder conversar, não conseguia controlar seus sentimentos. Esse fato, acrescido das informações que eu obtivera a respeito do lugar, começou a causar-me forte impressão. Senti-me de repente profundamente comovido com a situação de Stephentown e então respondi à srta. Sackett que, se os presbíteros da igreja desejassem minha visita, ela poderia fazer circular o aviso de que, se o Senhor permitisse, eu pregaria em sua cidade no domingo seguinte, às cinco da tarde. Assim, poderia pregar duas vezes em New Lebanon e depois cavalgar até Stephentown a tempo de pregar ali. Ao ouvir minha proposta, seu rosto ficou iluminado. Parecia que um peso lhe fora tirado do coração. Voltou para casa e logo tratou de espalhar a notícia.

No domingo seguinte, depois de ter pregado pela segunda vez, um dos jovens convertidos de New Lebanon ofereceu-se para me levar a Stephentown em sua charrete. Quando ele me veio buscar, perguntei-lhe:

— Seu cavalo é confiável?

— Oh, sim, perfeitamente! — respondeu ele. E perguntou, sorrindo: — Por que faz essa pergunta?

Respondi:

— Se o Senhor quer que eu vá a Stephentown, o Diabo tentará impedir. E, se seu cavalo não for de total confiança, o Diabo o usará para me matar.

Ele sorriu e continuamos viagem. Por estranho que possa parecer, antes de chegarmos ao nosso destino o cavalo fugiu do controle duas vezes e esteve perto de matar-nos. O dono, atônito, declarou nunca ter visto algo semelhante acontecer.

Mesmo assim, chegamos com segurança e em tempo útil à casa do sr. Sackett, pai da srta. Sackett. Ele morava a quase um quilômetro da igreja, na estrada para New Lebanon, de modo que tínhamos de passar por ali antes de chegar a Stephentown. Ao entrarmos, Maria — esse o nome da srta. Sackett — veio ao nosso encontro, acolheu-nos com lágrimas de alegria e indicou-me um quarto, onde eu poderia ficar sozinho. A hora do culto ainda não chegara e, sentado ali sozinho, pude ouvir Maria orando no quarto acima do meu. Na hora do culto, fomos todos juntos para o templo e encontramos ali um grande número de pessoas. E comecei a pregar.

A congregação manteve-se muito atenta, mas nada de muito significativo ocorreu naquela tarde. Passei a noite na casa do sr. Sackett e pareceu-me que Maria passou a noite inteira orando em seu quarto. Eu podia escutar-lhe a voz baixa e trêmula, freqüentemente interrompida por soluços e choro audíveis. Eu não havia combinado de pregar outra vez, porém antes de minha partida, na manhã seguinte, Maria implorou tanto que prometi voltar no domingo seguinte, no mesmo horário. Uma semana depois, retornei e a reação do povo foi quase a mesma, com a diferença de que o número de ouvintes era bem maior. O templo, por ser antigo, recebera escoras fortes nas galerias, instaladas durante a semana, para evitar um possível desabamento. Percebi um aumento notável de seriedade e de interesse no segundo sermão ali. Combinei, então, pregar ali mais uma vez. E, no terceiro culto, o Espírito de Deus foi derramado sobre a congregação.

O juiz Platt morava numa aldeia pequena dentro do município e muitos de seus filhos ainda não eram convertidos. No fim do culto, quando desci do púlpito, a srta. Sackett me esperava embaixo da escadaria e indicou-me um banco — a igreja ainda tinha aquelas bancadas quadradas antigas — no qual estava uma jovem grandemente tomada pela emoção. Falei com ela e descobri tratar-se de uma das filhas do juiz Platt. Ela estava sob profunda convicção de pecado. Sentei-me ao lado dela e dei-lhe algumas instruções — acho que, antes de sair do templo, ela já estava convertida. Era uma jovem muito inteligente e sincera e passou a ser uma crente dedicada. Posteriormente, casou-se com o evangelista Underwood, conhecido pregador, especialmente nas igrejas de Nova Jersey e da Nova Inglaterra. Parece que ela e Maria Sackett passaram imediatamente a orar juntas.

Até aquela altura, porém, eu não vira muita mudança entre os membros mais velhos da igreja. O tipo de relacionamento que mantinham uns com os outros iria exigir bastante arrependimento e confissão até que pudessem participar da obra. O trabalho em Stephentown passou a exigir que deixasse New Lebanon e passasse a morar ali. Naquele período, um espírito de oração viera poderosamente sobre mim, da mesma forma que já operava na vida da srta. Sackett havia algum tempo. Esse poder espalhava-se de modo tão notório que logo a obra passou a progredir de maneira poderosa. Tanto assim que a Palavra do Senhor derrubava os corações dos homens mais fortes e tornava-os inteiramente indefesos, por ação do Espírito Santo. Poderia citar muitos casos ocorridos nesse período.

Um dos primeiros que me vêm à memória ocorreu num domingo, enquanto eu pregava sobre o texto "Deus é amor". Havia ali um homem chamado Jowles, fazendeiro genioso e de considerável destaque no município. Ele sentou-se quase à minha frente, próximo ao púlpito. A primeira coisa que observei foi que ele caiu e parecia estar em grande crise. Contorceu-se em agonia uns poucos momentos, gemendo com profunda emoção, mas depois aquietou-se e ficou quase imóvel. No entanto, parecia inteiramente desamparado. Continuou nesse estado até o final do culto e então foi levado para casa. Converteu-se pouco depois e tornou-se instrumento poderoso para influenciar seus amigos a virem a Cristo. Casos semelhantes passaram ser comuns naquela obra de avivamento.

Zebulon R. Shipherd, célebre advogado do condado de Washington, NY, começou a dar plantão no fórum de Albany e ficou sabendo do avivamento em Stephentown. Então, organizou seus compromissos de modo a que lhe fosse possível empenhar-se comigo na obra. Crente sincero, freqüentava todos os cultos, experimentando grande alegria. Estava presente quando as eleições de novembro foram realizadas no estado. Fiquei muito preocupado com a chegada do dia das eleições, pois temia que as emoções daquela data retardassem a obra espiritual. Exortei os cristãos a vigiar e orar grandemente, para que o trabalho não fosse interrompido pelas excitações daquele dia.

Preguei na noite seguinte ao encerramento das eleições. Então, ao descer do púlpito, o sr. Shipherd — que, aliás, era o pai de J. J. Shipherd, que estabelecera Oberlin — fez-me sinal para que eu fosse até o banco onde ele estava sentado, num canto do templo à esquerda do púlpito. Fui até ele e vi um dos cavalheiros que servira como mesário durante o dia, responsável pela contagem dos votos. Estava tão dominado pela convicção de pecado que não conseguia levantar-se do assento. Conversei e orei com ele e mostrou-se claramente convertido. Enquanto isso acontecia, uma porção considerável da congregação permanecera sentada. Quando me afastava, fui chamado para atender alguém que estava à direita do púlpito, onde um homem que também trabalhara na eleição, recolhendo os votos na urna, se encontrava na mesma condição de espírito. Estava demasiadamente dominado pela emoção para sair do lugar. Fui também conversar com ele e, se bem me recordo, sua conversão ocorreu antes de ele sair do templo. Cito esses episódios como exemplos do tipo do trabalho realizado naquele local.

Já mencionei que a família do sr. Platt era grande. Lembro-me de que era composta de 16 pessoas — filhos e netos — e todos se converteram. Creio que se uniram à igreja antes que eu partisse de Stephentown. Havia outra família no município, de nome Moffit, que também era grande e influente, mais que qualquer outra na região. A maioria de seus membros morava dispersa ao longo de uma rua que, se não estou enganado, tinha oito quilômetros de comprimento, numa região agrícola bastante populosa. Descobri que não havia uma única família crente ao longo de toda aquela rua, uma única casa que mantivesse um culto doméstico.

Marquei um horário para pregar em uma escola situada ali e, quando cheguei, o local estava superlotado. Usei como tema o versículo: "A maldição do SENHOR está sobre a casa dos ímpios" (Pv 3.33). O Senhor capacitou-me para discernir claramente o assunto e a mostrar como a maldição divina repousa sobre a casa dos descrentes. Revelei que entendia não existir uma única família de oração naquele distrito inteiro. A realidade era que o município estava numa situação terrível. A influência do sr. Bogue, seu ex-pastor e agora um incrédulo, produzira seus frutos naturais: sobrara muito pouca convicção da realidade espiritual entre os incrédulos da região. Acredito que aquele culto resultou em convencimento de pecado para quase todos os presentes. O avivamento propagou-se naquela vizinhança e lembro-me de que na família Moffit houve 17 conversões a Cristo.

Havia, no entanto, várias famílias no município que não freqüentavam os cultos, mas tinham muita predominância sobre o povo. Parece que a firme resolução de não comparecer nos cultos vinha da grande influência que o sr. Bogue mantinha sobre essas famílias. Entretanto, durante o avivamento, o sr. Bogue morreu, de maneira terrível. Chegou ao fim, então, a oposição que ele semeara entre aquelas famílias. No entanto, eu não conseguia imaginar um modo de fazer aquelas pessoas comparecerem às reuniões.

A srta. Seward, a quem já me referi, que residia em New Lebanon e havia se convertido em Troy, ficou sabendo das famílias que não freqüentavam a igreja e veio para Stephentown. Seu pai era homem bem conhecido e muito respeitado na cidade, recebido com deferência em qualquer casa da região. A srta. Seward foi visitar uma das referidas famílias. Acredito que tivesse amizade com as filhas do casal. Seja como for, conseguiu que elas a acompanhassem ao culto no domingo. Logo aquelas jovens passaram a interessar-se tanto pelos cultos que ninguém precisava persuadi-las a freqüentá-los. Continuaram a vir por conta própria.

A srta. Seward foi visitar outra família, obtendo o mesmo resultado. Depois, procurou outra e, finalmente, acredito, conseguiu a presença de todas as famílias que se haviam afastado da igreja. Converteram-se quase todas — ou talvez todas — antes de minha partida. A verdade é que quase todos os habitantes de influência filiaram-se à igreja e a cidade foi moralmente renovada antes que eu a deixasse, no outono de 1827. Jamais voltei a Stephentown, no entanto recebo notícias de lá e sei que o avivamento produziu resultados permanentes. As conversões revelaram-se reais e, segundo entendo, a igreja mantém excelente grau de vigor espiritual.

As doutrinas e os métodos eram os mesmos de outros avivamentos em que trabalhei. Os cultos eram caracterizados pela perfeita ordem e por grande respeito espiritual. Não houve indícios de desregramento, exagero, heresia, fanatismo ou qualquer outra coisa que se pudesse lamentar. Os resultados da convenção em New Lebanon não foram favoráveis à oposição movida pelo dr. Beecher e pelo sr. Nettleton. Conseqüentemente, não houve mais notícia alguma de qualquer oposição apoiada pela autoridade deles, nem em Stephentown, nem em qualquer outro lugar.

Assim como acontecera em outros lugares, as características notáveis desse avivamento foram: 1) predominância de um poderoso espírito de oração; 2) forte convicção de pecado; 3) repentinas e poderosas conversões a Cristo; 4) grande amor e intensa alegria dos convertidos; 5) cultura e estabilidade religiosa dos convertidos; 6) grande seriedade, atividade e proveito nas orações e esforços feitos a favor do próximo.

Esse avivamento ocorreu no município adjacente a New Lebanon, imediatamente após a convenção em que a oposição recebeu seu golpe mortal. Pessoalmente, raras vezes atuei num avivamento com mais satisfação e com menos oposição que em Stephentown. No início, os ouvintes ficaram um pouco irritados com a pregação, mas, a operação do Espírito Santo foi tão poderosa que não ouvi mais reclamações da parte de nenhum ouvinte.

O dr. Beecher, em suas memórias, alega que nós, envergonhados dos métodos que utilizávamos, os alteramos. E ele atribui a si mesmo e ao sr. Nettleton o crédito dessa suposta mudança. Assim, ungiram com lisonjas a própria alma. Isso é um grande equívoco, porém e posso afirmar com toda a sinceridade que a oposição deles nunca me envergonhou, nunca me convenceu de que eu estivesse errado e nunca me levou a mudar em nada a maneira de conduzir os avivamentos. Eu tinha a certeza de estar agindo corretamente. Permaneço com essa certeza. Considerava impertinente, intrometida e sem sentido a oposição que faziam ao meu trabalho. Considerava-a prejudicial a eles mesmos e à causa divina. Continuo pensando assim, mas nada disso eu teria incluído na presente narrativa se as biografias do dr. Beecher e do sr. Nettleton não me tivessem obrigado a registrar com franqueza minha opinião.

 

CAPÍTULO XVIII

OS AVIVAMENTOS EM WILMINGTON E NA FILADÉLFIA.

Durante minhas intensas atividades em New Lebanon, no verão anterior, o rev. Gilbert, de Wilmington, Delaware, cujo pai residia em New Lebanon, ali chegou para uma visita. Ocorrera no avivamento em New Lebanon um incidente tocante, envolvendo um irmão dele. Esse seu irmão mostrara-se muito irritado com o avivamento. Não sendo ainda convertido, acabou partindo da cidade, declarando, segundo eu soube, que não voltaria senão depois de passado o avivamento.

Logo depois de sua partida, receberam a notícia de sua morte, a qual, se não me falha a memória, ocorrera de maneira bem trágica. Em seus conceitos teológicos, o rev. Gilbert seguia a Escola Antiga, mas era homem bondoso e sincero. Seu amor às almas sem Cristo excluía qualquer rigor no que se referia até mesmo às questões mais delicadas de nossas divergências teológicas. Ouvira-me pregar em New Lebanon e vira os resultados, por isso expressou o desejo de que eu fosse a Wilmington naquele outono ajudá-lo na obra que ali desenvolvia. Tão logo vi que tudo estava em ordem em Stephentown e que podia ausentar-me, fui para Wilmington e comecei a trabalhar com o irmão Gilbert.

Antes de encerrar meus comentários a respeito de Stephentown, porém, devo dizer que, tanto ali quanto em New Lebanon, foram empregados os métodos de sempre e nenhum outro, pelos quais fomos abençoados na região central do estado de Nova York. O mesmo espírito de oração, poderoso e prevalecente, foi manifestado ali. A Palavra era confirmada pelo mesmo poder prodigioso outorgado pelo Espírito Santo e as conversões ocorriam da mesma forma e no mesmo estilo. Os convertidos pareciam sempre conscientes de sua decisão e mostravam-se fortes, zelosos e unidos. Não percebi haver entre eles nenhum sinal de heterodoxia, nenhuma tendência ao fanatismo, nem qualquer coisa censurável. Não me consta que tenha sido feita qualquer queixa, em qualquer momento e em qualquer lugar, a respeito da existência de alguma coisa desastrosa ou fora de propósito naqueles avivamentos, que eram notavelmente puros e poderosos e cujos resultados eram duráveis.

Se me lembro bem, acolhi numa só ocasião cerca de duzentos convertidos à comunhão da igreja. Nunca me esquecerei do interesse que os jovens da igreja sentiam pela srta. Sackett, a quem me referi no capítulo anterior. Parecia ser objeto de afeto especial da parte deles, pois fora ela quem me persuadira a ir até lá e viam sua alma sincera derramar-se a favor da salvação deles. Mostravam-se muito apegados a ela e, com muita ternura, estavam sempre ao seu redor. A srta. Sackett era jovem, sem afetação e de coração tão singelo quanto o de uma criança. Em seus esforços, porém, ultrapassara os limites do corpo. Em pouco tempo, suas forças se esgotaram e creio que morreu poucos meses após o avivamento.

Como já disse, fui para Wilmington e dediquei-me à obra que ali se realizava, na companhia do irmão Gilbert. Logo percebi que os ensinos que ele ministrara aos crentes impossibilitavam o avivamento e precisavam ser corrigidos para que a obra prosperasse. Parecia que tinham medo de tirar a obra das mãos de Deus ao mínimo esforço que fizessem. Mantinham os mais antigos conceitos doutrinários transmitidos pela Escola Antiga e, como conseqüência, acreditavam que Deus converteria os pecadores no tempo por ele determinado. Para eles, portanto, promover um avivamento, que significava levar pessoas à conversão por meio de intervenção e de forças humanas, era desonrar a Deus, fazendo o trabalho dele. Observei, também, que em suas orações não havia urgência em pedir um derramamento do Espírito — tudo isso resultado das doutrinas que lhes haviam ensinado.

Ficou claro que nada poderia ser feito a não ser que as doutrinas disseminadas pelo irmão Gilbert sofressem reparação. Por isso, eu passava horas, todos os dias, conversando com ele a respeito de seus pontos de vista. Debatemos de modo fraternal tudo que se referia ao assunto e, depois de cooperarmos um com o outro durante duas ou três semanas, percebi que a mente do irmão Gilbert estava preparada para consentir que as doutrinas que eu defendia fossem apresentadas à congregação.

No domingo seguinte, preguei sobre este texto: "Busquem [criai em vós —ARC/ARA] um coração novo e um espírito novo. Por que deveriam morrer...?" (Ez 18.31). Explanei minuciosamente o assunto sob o aspecto da responsabilidade do pecador e demonstrei o que era e o que não era um coração novo. Preguei cerca de duas horas e não me sentei até ter repassado o assunto de modo tão eficiente quanto a fluência e o tempo me permitiam. A congregação passou a interessar-se intensamente pelo tema e, por todo o recinto, um grande número de pessoas se colocava de pé. O templo estava superlotado e havia olhares de estranheza na assembléia. Alguns pareciam ofendidos e desgostosos e outros, vivamente interessados.

Não foram raras as vezes em que, quando eu ressaltava o contraste entre minhas opiniões e aquelas nas quais eles haviam sido instruídos, alguns riam, outros choravam e outros ainda mostravam-se obviamente aborrecidos, mas não me lembro de ninguém ter saído da reunião. Era uma estranha agitação. O irmão Gilbert arrastava-se de uma ponta a outra no banco atrás de mim. Escutava sua respiração forte e seus suspiros e não podia deixar de perceber que ele estava muito agitado. Fiquei consciente de ter afetado suas convicções, mas não sabia se ele estava disposto a enfrentar os comentários que seriam feitos pelos membros da igreja. Quanto a mim, estava pregando para agradar ao Senhor e não aos homens. Cheguei a imaginar que seria a última vez que pregava ali, mas pensava também que estava lhes dizendo a verdade — independentemente do resultado.

Esforçara-me por demonstrar que, se o ser humano fosse tão desamparado quanto indicavam as convicções doutrinárias deles, ele não poderia ser condenado pelos seus pecados. Se em Adão o homem perdera toda a capacidade de obedecer — não por ação ou consentimento próprios, mas por algo que Adão fizera — não fazia sentido tentar fazê-lo assumir a culpa por erros que ele não podia evitar. Tentei, também, demonstrar que, por aquela hipótese, a expiação não seria graça e sim uma dívida que Deus tinha para com a humanidade por tê-la posto numa situação tão deplorável.

De fato, o Senhor ajudou-me a demonstrar, com clareza irresistível, as falhas nos dogmas da Escola Antiga com seus resultados inevitáveis. Ao concluir, não ousei convidar o irmão Gilbert a orar. Orei eu mesmo para que o Senhor aplicasse e tornasse claramente compreensível a Palavra e outorgasse a todos os que ali estavam uma mente imparcial para pesar na balança tudo que fora dito, para acolher a verdade e para rejeitar o que estivesse errado. Então, encerrei o culto e desci a escadaria do púlpito. O irmão Gilbert desceu atrás de mim. A congregação foi-se retirando com muita lentidão. Pareciam estar esperando alguma coisa.

Os corredores do templo já estavam quase vazios e o restante da congregação parecia em posição de espera, como se aguardasse que o irmão Gilbert comentasse o que fora dito no sermão. A sra. Gilbert, no entanto, saiu imediatamente e foi para casa. Ao descer do púlpito, notei que duas senhoras permaneciam sentadas à esquerda do corredor pelo qual tínhamos de passar. Eu já fora apresentado a elas e sabia que eram amigas e partidárias fiéis do irmão Gilbert. Mostravam-se um tanto magoadas ou ofendidas e muito atônitas. A primeira por que passamos, sentada perto da escadaria do púlpito, pegou no paletó do sr. Gilbert e perguntou-lhe em um sussurro audível:

— Sr. Gilbert, o que pensa disso? Ele respondeu no mesmo tom:

— Vale quinhentos dólares.

Sua resposta foi gratificante para mim e me deixou emocionado. Ela retrucou:

— Nesse caso, o senhor nunca pregou o evangelho!

— Pois bem! — respondeu ele. — Então lamento dizer que nunca preguei o evangelho.

Passamos adiante. A outra senhora disse-lhe mais ou menos a mesma coisa e ele também respondeu mais ou menos da mesma forma. Era o suficiente para mim. Fui caminhando até a porta e saí. Muitos ainda permaneciam na frente do templo, debatendo com veemência as coisas que eu dissera. A caminho da casa do sr. Gilbert, onde me hospedava, encontrei as ruas cheias de comoção e de pessoas discutindo o que eu pregara. Percebi que comparavam as opiniões e, pelo que escutei da parte daqueles que não me notavam passar, a impressão geral era decididamente favorável ao que eu dissera. Assim que cheguei à casa do sr. Gilbert, sua mulher veio interrogar-me:

— Sr. Finney, como ousou pregar semelhante coisa em nosso púlpito?

— Sra. Gilbert, não ousei pregar nada de diferente — respondi. Aquela é a pura verdade, vinda da parte de Deus.

— Ora, é verdade que, segundo a justiça, Deus tem a obrigação de providenciar a expiação pela humanidade — ela retrucou. Sempre pensei dessa forma, mas nunca ousei revelar meu ponto de vista. Acreditava que, se a doutrina pregada pelo sr. Gilbert era a verdade, Deus tinha de oferecer expiação e me salvar das circunstâncias em que era impossível eu socorrer a mim mesma e de uma condenação que eu não merecia. Nesse exato momento, entrou o sr. Gilbert.

— Está vendo, irmão Gilbert? — perguntei. Está vendo os resultados de sua doutrina dentro de sua própria casa? — E repeti o que sua mulher acabara de dizer.

Ele respondeu:

— Às vezes, eu a via como uma das mulheres mais piedosas que já conheci. — Pois bem! — exclamei. — Ela sempre pensou que Deus lhe devia, por questão de justiça, a salvação que Cristo lhe outorgara. Como podia ser cristã?

Cada um de nós falava com a maior seriedade e sinceridade. Quando fiz essa última observação, a sra. Gilbert levantou-se e saiu da sala. A casa ficou em completo silêncio e penso que não a vi durante dois dias. Mas, as coisas ficaram claras para ela, não somente quanto à verdade, mas também quanto ao estado de sua alma. Ela passou por uma revolução interior completa. A partir de então, a obra foi progredindo. O Espírito Santo operava admiravelmente, revelando a verdade. Os pontos de vista do irmão Gilbert foram alterados. Mudaram também seu estilo de pregação e sua maneira de apresentar o evangelho. Pelo que eu saiba, ele defendeu os ensinos da Escola Nova até o dia de sua morte, abandonando o que ensinava a Escola Antiga.

O efeito de meu sermão foi marcante sobre muitos membros daquela igreja. Já descrevi a experiência da senhora que perguntou ao sr. Gilbert o que ele pensava a respeito do que eu pregara. Posteriormente, ela me disse que ficara tão ofendida ao ver seus conceitos religiosos derrubados por mim que prometeu a si mesma nunca mais orar. Era seu hábito justificar-se lembrando sua natureza pecaminosa e tinha pontos de vista semelhantes aos da sra. Gilbert. Assim, minha pregação abalara todos os seus conceitos relativos à fé. Se estou bem lembrado, seu estado de rebelião durou umas seis semanas. Mas em seguida quebrantou-se, modificando suas opiniões e tendo uma nova experiência com Deus. Acredito que o mesmo aconteceu com muitos outros.

Fui convidado a pregar no púlpito do irmão Patterson, em Filadélfia, duas vezes por semana. Subia para lá de vapor (trem), pregava à noite e voltava no dia seguinte para pregar em Wilmington. Assim, alternava os cultos vespertinos entre Wilmington e Filadélfia. Viajando de barco pelo rio, a distância entre essas cidades ficava em cerca de 64 quilômetros. A obra surtiu tanto efeito em Filadélfia que me convenci de que, se essa era a vontade de Deus, meu dever era deixar o irmão Gilbert continuar a obra em Wilmington, para que eu pudesse dedicar todo o meu tempo ao trabalho na grande cidade de Filadélfia.

O irmão James Patterson, com quem eu já atuara em Filadélfia, sustentava os conceitos teológicos que então se ensinavam no Seminário Teológico de Princeton, posteriormente conhecidos como a teologia dos presbiterianos da Escola Antiga. Era um homem piedoso, porém, importando-se muito mais com a salvação das almas que com as questiúnculas da capacidade ou da incapacidade ou com qualquer um daqueles temas doutrinários a respeito dos quais os presbiterianos da Escola Antiga e da Escola Nova diferem entre si. A mulher de Patterson sustentava os conceitos teológicos da Nova Inglaterra, ou seja, acreditava na expiação geral, não na restrita e concordava com a ortodoxia da Nova Inglaterra, em contradição com a de Princeton. Deve ser lembrado que, nessa época, eu mesmo pertencia à Igreja Presbiteriana. Havia sido licenciado e ordenado por um presbitério composto principalmente de homens formados em Princeton. Já relatei as lutas que tive com alguns dos membros daquele presbitério, especialmente com meu professor de teologia, o rev. George W. Gale. Mencionei, ainda, que quando fui licenciado para pregar o evangelho, perguntaram-me se eu aceitava a Confissão de fé presbiteriana por conter a substância da doutrina cristã. Respondi que sim, dentro dos conhecimentos que tinha dela. No entanto, por não ter previsto que semelhante pergunta me fosse feita, nunca a examinara com atenção e acho que nunca a lera do começo ao fim.

Em minha controvérsia com o irmão Gale, nunca fizemos uso da Confissão de fé. Quando debatia com ele no tocante a determinadas questões, entendia que a luta era contra as opiniões de Princeton. Quando, no entanto, li a Confissão de fé e meditei sobre ela, percebi que, embora eu pudesse admitir aceitá-la, da mesma forma que multidões de presbiterianos por conter a substância da doutrina cristã conforme ensinada na Bíblia, não deixava de perceber várias questões que eu não poderia interpretar pela ótica de Princeton. Portanto, sempre dava a entender aos ouvintes que eu não aceitava aquela interpretação. Ou, pelo menos, que, se ela era considerada a interpretação correta, eu discordava inteiramente dos termos em que se apresentava. Tomo por certo que o irmão Patterson entendia isso antes de eu me dispor a cooperar com ele, pois não expressou nenhuma surpresa quando adotei aquela linha no púlpito. E, realmente, ele não levantou a mínima objeção.

O avivamento firmou-se tão poderosamente em sua congregação, que o interesse dele aumentou muito. E, à medida que via as bênçãos divinas envolvendo a Palavra da maneira em que eu a apresentava, ele me apoiava com firmeza e nunca, em hipótese alguma, levantou objeções contra qualquer conceito por mim apresentado. Às vezes, quando voltávamos do culto, a sra. Patterson observava, sorridente: "Está vendo, sr. Patterson, que o sr. Finney não concorda com você quanto às questões sobre as quais conversamos tão freqüentemente?". E ele, na grandeza de sua fé e amor cristãos, respondia: "Pois bem, o Senhor abençoa essa obra".

O interesse cresceu tanto que a congregação ficava superlotada em todos os cultos. Certo dia, o irmão Patterson disse-me:

— Irmão Finney, se os ministros presbiterianos desta cidade descobrirem suas opiniões teológicas e o que o irmão está pregando ao povo, irão expulsá-lo da cidade como se fosse um lobo.

— Não posso deixar de pregar o que prego — respondi. — Não posso pregar outra doutrina. E, se insistem em me expulsar da cidade, que o façam e assumam a responsabilidade. Mas não acredito que consigam livrar-se de mim.

Os ministros, no entanto, não tomaram a atitude que o rev. Patterson temia. Ao contrário, quase todos me recebiam em seus púlpitos. Quando ficaram sabendo o que acontecia na igreja do irmão Patterson, que até membros de suas igrejas mostravam grande interesse pelo que ali era pregado e que havia avivamento entre algumas delas, convidavam-me também a pregar em suas igrejas. Assim, se não estou enganado, preguei em todas as igrejas presbiterianas, exceto a da rua Arch. Houve muitos casos maravilhosos de conversões naquele avivamento e também muitos casos de amargura extrema por parte de pessoas que, individualmente, se opunham à obra.

Já mencionei que me encontrei com o sr. Nettleton em Nova York, durante o outono, após a convenção em New Lebanon e que ele estava ali para publicar suas cartas. Na ocasião, eu estava a caminho de Wilmington e passei alguns dias com meus amigos em Nova York. O sr. Nettleton realmente publicou as cartas, que foram imediatamente enviadas para Filadélfia, onde foram postas em circulação. Por certo, a intenção era prejudicar as minhas atividades ali. Posso imaginar que, em alguns casos, as cartas encorajaram a oposição, mas, pelo que me lembro, provocaram também, naquela cidade, uma reação contra o irmão Nettleton. Quando liam as cartas, as pessoas comentavam: "Vejam bem! Se o sr. Finney está errado, o sr. Nettleton é o maior e principal dos delinqüentes. Ele mesmo defendeu essas opiniões e empregou esses mesmos métodos durante muitos anos. Por que, agora, está condenando a atuação do sr. Finney? É melhor escutarmos o sr. Finney".

Naquela época, Filadélfia formava um só bloco, ou quase isso, no tocante aos conceitos teológicos mantidos em Princeton. O rev. Skinner sustentava, até certo ponto, opiniões que, posteriormente, vieram a coincidir com as da Escola Nova e diferiam bastante das doutrinas pregadas ao seu redor, nas igrejas presbiterianas vizinhas, a ponto de suspeitarem que ele não fosse totalmente conservador. Sempre considerei um fato extraordinário a questão da ortodoxia por mim defendida não se ter revelado uma pedra de tropeço naquela cidade e nenhum ministro ou igreja lançar qualquer objeção contra ela.

Preguei na igreja holandesa do dr. Livingston e descobri que ele simpatizava com minhas opiniões. Encorajou-me, com toda a sua influência, a pregar segundo o que Deus me ordenara. Em todos os lugares e em todas as ocasiões, não hesitei em expor os conceitos teológicos que sempre apresentara às igrejas. Acredito que o próprio irmão Patterson ficou surpreso por ninguém me fazer oposição aberta por causa de minhas convicções teológicas. O fato é que eu não as apresentava em tom de controvérsia, apenas as incluía em minhas instruções aos crentes e aos descrentes, de modo tão natural que não havia probabilidade de despertar muita atenção senão da parte dos teólogos mais exigentes.

Entretanto, muito do que eu falava era novidade para os ouvintes. Por exemplo, certa noite eu preguei a respeito do seguinte texto: "Pois há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens: o homem Cristo Jesus, o qual se entregou a si mesmo como resgate por todos. Esse foi o testemunho dado em seu próprio tempo" (1Tim.2.5,6). Tratava-se de um sermão a respeito da expiação e apresentei minha opinião a respeito de sua natureza e universalidade. Procurei expor, do modo mais enfático possível, as diferenças entre minhas opiniões e as sustentadas pelos teólogos que defendiam a expiação limitada. O sermão atraiu tanta atenção e despertou tantos sentimentos que fui convidado com insistência a pregar sobre o assunto em outras igrejas. E, quanto mais eu pregava a respeito do tema, mais as pessoas queriam ouvir-me, a ponto de eu pregar sete noites sucessivas em sete igrejas diferentes. Não ouvi falar de nenhuma oposição às opiniões por mim apresentadas — fato notável para mim e para o irmão Patterson.

Segundo parece, as pessoas tinham ouvido falar muita coisa contra o hopkinsianismo [doutrina teológica esposada por Samuel Hopkins] e as duas colunas que sustentavam essa doutrina eram: 1) o ser humano deve estar disposto a ser condenado ao inferno para a glória de Deus e 2) Deus é o autor do pecado. Em minhas pregações, às vezes fazia alusão a esses temas e aproveitava a ocasião para condenar o hopkinsianismo e dizer que essa doutrina parecia muito difundida ali. Falava que, diante do grande descuido deles em buscar a salvação da própria alma, tinha-se a impressão de estarem dispostos a ir para a perdição eterna. Dizia-lhes, também, que certamente sustentavam que Deus era o autor do pecado porque sabiam que tinham uma natureza pecaminosa. Eu repetia os dois temas muitas vezes e dedicava tempo a estudar e a pregar sobre eles.

Repetidas vezes, fiquei sabendo que os ouvintes comentavam: "Pois bem, ele não é hopkinsiano". Eu realmente sentia ser meu dever — e até achava necessário — desmascarar todos aqueles esconderijos de pecadores, persegui-los e tirá-los de trás das trincheiras da ortodoxia. O avivamento propagou-se e firmou-se poderosamente. Os locais de reunião estavam sempre superlotados. Havia interessados em demasia para que pudéssemos atendê-los a contento. Foi em fins do outono que passei a hospedar-me em Filadélfia e continuei as atividades ali, sem interrupção, até aproximadamente o primeiro dia de agosto, no verão seguinte.

Já mencionei que houve oposição ferrenha por parte de alguns indivíduos. Lembro-me de um homem cuja esposa sentia forte convicção de pecado e tendo em vista a situação de sua alma. Ele ficou tão enfurecido que entrou no templo durante o culto para tirá-la de lá à força.

Outro caso notável do qual me recordo foi o de um alemão, cujo nome não lembro, que comercializava tabaco. Sua mulher era uma pessoa muito amável e culta e ele mesmo, segundo descobri posteriormente, ao conhecê-lo melhor, era um homem inteligente. No entanto, era cético e não tinha a mínima confiança na religião. A mulher, porém, freqüentava nossos cultos e ficou muito preocupada com a situação da própria alma. Depois de uma severa luta mental, que durou muitos dias, converteu-se ao Senhor. Era assídua nas reuniões e demonstrava grande interesse pelas coisas espirituais, fato que logo atraiu a atenção do marido, que passou a levantar objeções contra a sua fé. Fiquei sabendo que se tratava de um homem de temperamento agressivo, de muita força atlética e muito resoluto em seus propósitos.

A oposição do marido aumentava à medida que ela se interessava cada vez mais pela vida espiritual. Ele chegou a proibi-la de freqüentar os cultos. Ela, então, veio aconselhar-se comigo, querendo saber que atitude tomar. Respondi-lhe que sua primeira obrigação era diante de Deus e que, sem dúvida, tinha de obedecer aos mandamentos divinos, embora estes estivessem em conflito com as ordens do marido. Aconselhei-a a evitar ofendê-lo em qualquer questão, quando isso era possível sem implicar desobediência a Deus. Ela não devia, em circunstância alguma, faltar em sua obrigação para com o Senhor para atender à vontade de um ímpio.

Falei-lhe que, por ele ser incrédulo, suas opiniões sobre os assuntos religiosos não contavam e que ela não podia orientar-se pelos conselhos do marido. Disso ela parecia ter bastante consciência. Tratava-se de um homem que não dedicava a mínima atenção à vida espiritual, a não ser para fazer oposição a ela. Seguindo meus conselhos, aquela mulher freqüentava os cultos sempre que tinha oportunidade. Ela recebia instrução e logo ali alcançou a liberdade do evangelho, passando a ter muita fé e paz de espírito e a desfrutar da presença de Deus. Aquilo deixou o marido bastante desgostoso e ele chegou a ameaçar-lhe a vida, caso ela voltasse a freqüentar os cultos. Ela, porém, já o vira zangado tantas vezes que não estava certa de que ele cumpriria a ameaça. Respondeu-lhe com calma, dizendo que, custasse o que custasse, ela estava decidida a cumprir seu dever diante de Deus e que esse dever consistia em receber a necessária instrução religiosa. Por isso, freqüentaria os cultos sempre que pudesse, sem negligenciar seus deveres para com a família.

Certo domingo, ao anoitecer, quando soube que ela iria ao culto, o marido renovou a ameaça de lhe tirar a vida. Ela contou-me, depois, que não imaginara as palavras do marido serem mais do que uma simples ameaça. Respondeu-lhe, então e com calma, que seu dever lhe fora claramente revelado e que não havia motivo para ficar em casa naquele horário, a não ser para cumprir as exigências exorbitantes do marido. E ficar em casa em semelhantes circunstâncias seria inconsistente com seu dever diante de Deus e diante dela mesma. Assim, foi ao culto.

Quando voltou, encontrou o marido numa crise de raiva. Logo que ela entrou, ele trancou a porta, tirou a chave e puxou uma faca, jurando que lhe tiraria a vida. Ela subiu as escadas correndo. Ele pegou um lampião para segui-la, mas a empregada, assustada, apagou a chama com um sopro quando ele passou à sua frente. Assim, ficaram no escuro. Ela subiu e correu pelos quartos do segundo andar, conseguiu descer para a cozinha e de lá para o porão. Ele não conseguiu encontrá-la. Ela escapou pela janela do porão e foi para a casa de uma amiga, onde passou a noite. Tomando por certo que o marido se envergonharia do que fizera na véspera, voltou ainda cedo para casa, e encontrou as coisas na maior desordem. Ele quebrara alguns móveis, num ataque de fúria.

Mal entrou, ele trancou a porta de novo e, puxando a faca, lançou-se ao chão de joelhos e levantou as mãos para fazer o terrível juramento de que tiraria imediatamente a vida da mulher. Ela olhou para ele, atônita e fugiu. Subiu correndo as escadas, mas havia luz suficiente para ele segui-la. Ela correu de quarto em quarto até entrar no último, de onde não havia como fugir. Virou-se para olhá-lo de frente e, no momento em que ele ia esfaqueá-la, atirou-se ao chão de joelhos, levantou as mãos ao céu e clamou por misericórdia, para ela e para ele. E Deus o fez parar. Segundo ela me contou, ele olhou para ela por um instante, deixou cair a faca, prostrou-se no chão e, por sua vez, clamou por misericórdia. Naquele momento, sentiu-se quebrantado e confessou seus pecados contra Deus e contra ela, implorando a ambos que o perdoassem. É claro que ela o perdoou e confio que Deus o tenha perdoado também.

A partir de então, ele tornou-se um homem maravilhosamente transformado, um dos cristãos convertidos mais zelosos que conheci. Apegou-se fortemente a mim e, um ou dois anos mais tarde, quando soube que eu estava para chegar a Filadélfia num barco a vapor, foi a primeira pessoa a dar-me as boas-vindas. Antes de eu partir de Filadélfia, naquela primeira ocasião, levei o casal a afiliar-se à comunhão da igreja e batizei seus filhos. Já faz muitos anos que não os vejo, nem recebi mais notícias deles.

Embora houvesse, individualmente, casos de amargura e oposição notáveis, provocados por idéias errôneas a respeito do que eu pregava, não sofri nada que pudesse comparar-se com o peso da oposição levantada pelo dr. Beecher e pelo sr. Nettleton. Os pastores tratavam-me com bondade e, que eu me recorde, em nenhum caso falaram publicamente contra a obra que estava sendo realizada — acho que nem em particular a criticavam. Deve ter sido muito grande o número de convertidos. Depois de pregar vários meses na igreja do irmão Patterson e, em maior ou menor grau, em quase todas as igrejas presbiterianas da cidade, acharam melhor que eu ocupasse uma posição mais central e pregasse com regularidade em um só lugar.

Na rua Race, havia uma grande igreja alemã, cujo pastor era o sr. Helfenstine [Samuel Helffenstein]. Os presbíteros da congregação e seu pastor pediram-me que ocupasse o púlpito deles. Penso que, na época, aquela igreja tinha o maior templo na cidade. Foi ali que continuei a pregar com regularidade durante vários meses. Estava sempre cheia e dizia-se que acomodava 3 mil pessoas com o recinto superlotado até nos corredores. Tive a oportunidade de pregar para grande número de professores da escola bíblica dominical. Dizia-se que os professores de todas as partes da cidade geralmente acompanhavam meu ministério.

No auge do verão de 1828, ausentei-me por um breve período a fim de visitar os pais de minha mulher, no condado de Oneida. Depois, voltei a Filadélfia e trabalhei ali até a metade do inverno. Não me lembro com exatidão, mas acho que, ao todo, trabalhei em Filadélfia cerca de um ano e meio, tempo em que o fervor do avivamento não sofreu diminuição. Os convertidos multiplicavam-se por toda a cidade. Eram tantos que nunca tomei conhecimento do número exato, nem mesmo consegui fazer uma estimativa razoável. De todos os lugares em que trabalhei, em nenhum deles fui recebido mais cordialmente que ali. E em nenhum outro lugar os crentes, especialmente os novos convertidos, deram melhor testemunho. Que eu soubesse, nunca houve conflito ou divisão entre eles e jamais chegou ao meu conhecimento que alguma influência desastrosa tenha sido provocada por aquele avivamento. Numa cidade grande, os convertidos podem multiplicar-se grandemente, mas não se pode fazer estimativa do tamanho do avivamento. Somente nas cidades pequenas, nas quais todos os habitantes são conhecidos, é que se pode contar o número dos que são levados à conversão.

Durante o avivamento em Filadélfia, ocorreram muitos fatos interessantes. Lembro-me de certa jovem, filha de um pastor batista seguidor da Escola Antiga, que freqüentava a igreja do sr. Patterson. Durante meu ministério ali, ela demonstrou uma impressionante convicção de pecado. Suas convicções eram tão profundas que caiu em grande desespero e aflição. Contou-me que, desde a infância, aprendera do pai que, se ela fosse uma das eleitas, seria levada a converter-se na ocasião própria e que ela nada poderia fazer por conta própria antes de converter-se e de sua natureza ser transformada pelo Espírito de Deus, a não ser ler a Bíblia e orar, pedindo um novo coração.

Ainda bem jovem, ela sentiu forte convicção de pecado, mas seguia a instrução do pai: lia a Bíblia e orava, pedindo um novo coração, pensando que era somente isso que lhe era exigido. Ficou esperando ser levada à conversão e, assim, receber a evidência de pertencer aos eleitos. Em meio do seu grande empenho pela salvação, surgiu a questão do casamento e ela prometeu a Deus que não se casaria com ninguém até que estivesse convertida. Disse-me que, ao fazer a promessa, esperava que Deus apressasse sua conversão. Mas, as suas convicções desapareceram. Ela não se converteu e a promessa continuava pesando em sua alma, pois não ousava quebrá-la.

Quando estava com cerca de 18 anos de idade, um jovem pediu-a em casamento. Ela consentiu, mas, por causa do voto que fizera a Deus, o casamento não poderia ser realizado antes que ela se convertesse. Os dois se amavam muito e ele insistia em que o casamento fosse realizado sem demora. Mas, sem contar-lhe o motivo verdadeiro, ela ficava adiando o casamento. Se estou bem lembrado, os adiamentos somaram cinco anos, enquanto ela esperava a conversão.

Certo dia, o jovem cavalheiro caiu da charrete em que viajava e morreu instantaneamente. Esse acontecimento despertou no coração da jovem profunda mágoa contra Deus. Passou a acusá-lo de agir com crueldade para com ela. Havia esperado pela conversão e mantivera-se fiel à promessa de não casar-se antes de estar convertida. Obrigara seu amado a esperar todos aqueles anos até que ela estivesse pronta e ela, também, ficara esperando que Deus a levasse à conversão. Então veio Deus e tirou a vida dele, enquanto ela permanecia sem se converter! A jovem ficou sabendo que o rapaz era universalista e, por isso, passou a desejar ardentemente que o universalismo fosse a verdade, pois não conseguia acreditar que Deus tivesse condenado seu noivo ao inferno. E, se ele o tivesse feito, ela não saberia conviver com isso.

Ela passou muito tempo lutando com Deus antes de começar a freqüentar nossas reuniões e acreditava que a culpa por não se ter convertido era de Deus, não dela mesma. Quando ouviu minha pregação e viu que seus refúgios de mentiras foram derrubados, percebeu que já deveria ter entregado o coração a Deus há muito tempo. Disposta a resolver a situação, assumiu sua culpa, tendo a certeza de que a instrução dada por seu pai fora totalmente errada. Lembrando-se, então, de como culpara a Deus e de quanto blasfemara contra ele, naturalmente clamou desesperadamente por misericórdia.

Arrazoei com ela e tentei mostrar-lhe a longanimidade divina, encorajando-a a esperar, a crer e a tomar posse da vida eterna. Mas ela sentia-se tão consciente do pecado que não parecia entender o que eu dizia. E lançou-se, dia após dia, cada vez mais ao desespero. Depois de me dedicar muito a aconselhá-la, passei a afligir-me bastante com o caso dela. Tão logo os cultos eram encerrados, ela aparecia e seguia-me até em casa, queixando-se e cansando-me com seus apelos para que eu demonstrasse simpatia e compaixão cristã pela sua alma.

Essa situação prolongou-se por muitas semanas. Certa manhã, ela veio visitar-me. Estava acompanhada por uma tia que ficara muito preocupada com a sua situação, temendo que a sobrinha estivesse à beira da loucura. Eu mesmo achava que seria esse o resultado, se ela não decidisse crer. Catharine — esse o nome da jovem — entrou em minha sala com o seu jeito desesperançado de sempre, mas tinha um olhar selvagem, que indicava um estado emocional crítico. E creio que, então, o Espírito de Deus sugeriu à minha mente que eu adotasse uma postura inteiramente diferente diante dela. Falei-lhe:

— Catharine, você afirma acreditar que Deus é bom.

— Oh, sim! — respondeu ela. — Nisso eu acredito.

— Pois bem! — continuei. — Você me tem revelado freqüentemente que a bondade de Deus não permite que ele tenha misericórdia de você, que você pecou tanto que seria uma desonra para Deus perdoá-la e salvá-la. Você tem-me confessado muitas vezes que acredita que Deus perdoaria você se a sabedoria dele o permitisse, mas que esse perdão seria uma ofensa contra ele, contra seu governo e contra seu universo e que, portanto, ele não pode perdoar você.

— Sim — ela respondeu. — E nisso que acredito.

— Então, sua dificuldade é que você espera que Deus peque, que aja de modo tolo e que se prejudique a si mesmo e ao Universo para salvar você — ponderei.

Ela abriu bem os grandes olhos azuis e fixou-os em mim. Parecia surpreendida, parcialmente indignada. No entanto, continuei:

— Sim. Você está em grande angústia porque Deus não fará uma coisa errada, porque ele persistirá em ser bom, independentemente do que aconteça com você. Você experimenta essa aflição na alma porque Deus não pode ser persuadido a violar o conceito de retidão e justiça e não salvará você de um modo que contrarie as leis que ele criou. Você considera-se mais importante que Deus e o Universo inteiro e não se sentirá feliz, a menos que Deus se torne infeliz e torne infelizes todas as pessoas por sua causa.

Insisti nesse argumento, enquanto ela olhava para mim, atônita. Depois de alguns momentos, mostrou-se submissa como uma criancinha. Então falou:

— Aceito essa condição. Que Deus me envie para o inferno se ele julgar ser essa a melhor coisa a fazer. Não quero que ele me salve às custas dele próprio e do Universo. Que ele faça o que bem pareça aos seus olhos.

Levantei-me de imediato e saí da sala. E, para ficar longe dela, fui para a rua, entrei numa charrete e saí dirigindo. Quando voltei, ela já havia ido embora. Naquela tarde, porém, ela e a tia voltaram para declarar o que Deus fizera pela alma de Catharine. Ela transbordava de alegria e paz e foi uma das convertidas mais submissas, humildes e dedicadas que já vi.

Lembro-me de que outra jovem — uma belíssima moça de uns vinte anos de idade — veio visitar-me, sentindo grande convicção de pecado. Entre outras coisas, perguntei-lhe se estava convencida de ter sido tão iníqua a ponto de Deus, em sua justiça, ter motivos para enviá-la ao inferno.

— Sim! Mereço mil infernos — respondeu em tom contundente. Estava vestida elegantemente, até mesmo com certo luxo. Tive com ela uma conversa profunda e ela mostrou-se quebrantada de coração e entregou-se a Cristo. Tornou-se uma cristã muito humilde e quebrantada. Fiquei sabendo que ela foi para casa, apanhou as muitas flores artificiais e ornamentos com os quais se enfeitava e dos quais se orgulhava muito, passou pela sala com todos eles na mão. Alguém lhe perguntou o que ia fazer com aquelas flores e ornamentos e ela respondeu que iria queimá-las.

— Nunca mais os usarei — afirmou.

— Se você não quiser usá-los, poderá vendê-los. Não precisa queimá-los

— disseram-lhe.

Ela, porém, respondeu:

— Se eu os vender a outra pessoa, ela terá tanto orgulho e ficará tão vaidosa deles quanto eu fui com eles. Por isso, vou queimá-los. — E, realmente, lançou-os numa fogueira.

Poucos dias depois, ela visitou-me e contou-me que, de passagem pelo mercado, penso que naquela manhã, observou uma senhora ricamente vestida. Sua compaixão foi de tal maneira despertada que ela foi até aquela senhora e pediu licença para falar-lhe. A senhora permitiu e ela lhe disse: "Madame, não tem orgulho de suas roupas? Não se sente tão vaidosa a ponto de negligenciar a salvação de sua alma?" Disse que ela mesma irrompeu em lágrimas ao dizer isso e contou àquela senhora um pouco de sua experiência — de como fazia demasiada questão de ter roupas finas e de como isso quase arruinara sua alma. E acrescentou: "Ora, a senhora é uma mulher belíssima e está vestida com elegância. Será que não está tendo a mesma mentalidade que eu já tive?"

Aquela senhora chorou e confessou que, de fato, aquilo era um tropeço para ela e temia que seu apego às roupas luxuosas e à sociedade lhe arruinasse a alma. Confessou que negligenciara a salvação por não saber como livrar-se do círculo social no qual se movimentava. A jovem perguntou-me, então, se eu achava errado o que ela dissera à senhora. Falei-lhe que não, que eu desejava que todos os cristãos fossem tão fiéis quanto ela e esperava que ela nunca cessasse de advertir as mulheres contra algo que quase lhe arruinava a alma.

Na primavera de 1828, estando o rio Delaware bem cheio, os madeireiros desciam com suas balsas da região das terras altas, para onde haviam ido a fim de extrair as toras durante o inverno. Naquele tempo, havia uma grande faixa de terras ao longo da região norte da Pensilvânia, que muitos chamavam "região da madeira", que subia em direção aos mananciais do rio Delaware. Durante o verão e o inverno, muitos madeireiros ocupavam-se em extrair toras da região. Boa parte dessas toras era enviada até Filadélfia, flutuando pelo rio, quando as águas subiam. (Eles extraíam as toras quando as águas do rio estavam baixas). Quando a neve derretia e vinham as chuvas da primavera, jogavam todas no rio e as deixavam descer flutuando até onde pudessem formar balsas com as próprias toras ou embarcá-las de outras maneiras para o mercado em Filadélfia.

Muitos dos madeireiros criavam famílias na região e havia uma vasta extensão de terras no interior, onde quase não havia povoados e a terra não era ocupada senão por aqueles madeireiros. Naquele tempo, não havia escolas nem igrejas ali, nem a mínima assistência espiritual. Fiquei conhecendo um pastor nascido na região dos madeireiros que até os vinte anos de idade nunca havia participado de um culto e também era analfabeto. Os homens que desciam com as toras de madeira freqüentavam nossos cultos e, vários deles, converteram-se a Cristo. Voltaram para a floresta e começaram a orar, pedindo o derramamento do Espírito Santo e a contar às pessoas o que viram em Filadélfia, exortando-as a aceitar a salvação.

Seus esforços foram imediatamente abençoados e o avivamento começou a propagar-se e a enraizar-se entre aqueles madeireiros. Esse acontecimento persistiu de modo muito poderoso e notável. A obra estendeu-se de tal modo, que, em muitos casos, pessoas que eram quase tão destituídas de conhecimentos religiosos quanto os pagãos e que não haviam freqüentado nenhum culto, tornavam-se convictas do pecado e convertiam-se. Homens que estavam cortando árvores em lugares distantes, onde moravam em cabanas, sozinhos ou em dois ou três, eram tomados de tamanha convicção que eram induzidos a sair andando sem rumo e perguntando o que deveriam fazer; então, convertiam-se. E assim o avivamento foi-se propagando.

Os convertidos manifestavam a máxima simplicidade. Para mostrar o que acontecia na região, certo pastor idoso, que conhecera um pouco a situação do lugar, contou-me que havia ali um homem que tinha uma choça pequena, só dele, onde dormia à noite, depois de cortar suas toras durante o dia. Começou a sentir que era pecador e essa convicção foi-lhe pesando a ponto de quebrantar-se, confessar seus pecados e arrepender-se. O Espírito de Deus revelou-lhe sobre a salvação o suficiente para que o pastor percebesse que ele já estava convertido. Mas, nunca freqüentara uma reunião de oração em toda a sua vida e, que se lembrasse, jamais tinha ouvido uma oração. Seus sentimentos eram tão fortes que ele sentiu-se constrangido a dar testemunho disso a alguns conhecidos que extraíam toras em outro local. Quando chegou ali, porém, descobriu que muitos deles já haviam passado pela mesma experiência e estavam realizando reuniões de oração. Passou a freqüentar as reuniões, escutava-os a orar e, finalmente, começou a orar também. Sua oração era esta: "Senhor, tu me derrubaste e espero que me mantenhas no chão. E já que foste tão bem-sucedido comigo, espero que consigas obter o mesmo com outros pecadores".

Já mencionei que essa obra começou na primavera de 1828. Na primavera de 1831, eu estava de volta a Auburn. Dois ou três homens da região madeireira foram visitar-me para se informarem sobre um meio de levar alguns pastores para lá. Disseram que nada menos que 5 mil pessoas se haviam convertido na região, que o avivamento se estendera por 130 quilômetros e que não havia um único ministro do evangelho para cuidar da obra. Nunca estive na região, mas, com base em tudo que ouvi, considero aquele um dos avivamentos mais notáveis deste país. Foi levado a efeito de modo independente do ministério e entre uma classe inculta, mas os ensinos da parte de Deus eram tão evidentes e maravilhosos que sempre entendi que aquela obra nunca foi manchada pelo fanatismo, pelo descontrole ou por alguma coisa censurável.

É possível que algum aspecto não me tenha sido explicado com exatidão, mas aqui relato os acontecimentos conforme os entendi. "Vejam como um grande bosque é incendiado por uma simples fagulha" (Tg 3.5). A fagulha acesa no coração daqueles poucos madeireiros que visitaram Filadélfia propagou-se por toda a floresta e resultou na salvação de uma multidão de almas.

Descobri ser o irmão Patterson um dos homens mais leais e santos de todos aqueles com os quais já havia cooperado. Sua pregação era extremamente sincera. Mas, em seus sermões, freqüentemente faltava conexão entre as coisas que dizia e o texto que escolhera. Ele me dizia sempre: "Quando prego, prego de Gênesis a Apocalipse". Lia um texto bíblico e, depois de fazer algumas observações — ou talvez nenhuma — a respeito dele, outro texto vinha-lhe à mente e sobre este fazia observações muito pertinentes. Então lembrava-se de outro texto e, assim, seus sermões consistiam em comentários incisivos de textos que iam surgindo em sua memória. Era um homem alto, de porte notável e de voz poderosa. Pregava com lágrimas descendo pela face e com tanta sinceridade e emoção que chamava a atenção de todos.

Era impossível ouvi-lo pregar sem nos impressionarmos com seu senso de sinceridade intensa e de grande honestidade. Foi só ocasionalmente que o ouvi pregar e, da primeira vez, fiquei triste, imaginando que a natureza dispersiva de sua pregação não surtiria qualquer efeito. No entanto, logo percebi meu engano. Descobri que, a despeito de suas divagações, sua grande sinceridade e sua unção faziam com que a verdade fosse fixada no coração dos ouvintes. Acho que nunca o ouvi pregar sem descobrir na platéia pessoas profundamente convictas de pecado. Antes de atuarmos juntos, ele realizava uma campanha de avivamento religioso todos os invernos — pelo que me contou, por 14 invernos sucessivos.

Os membros de sua igreja eram crentes de oração. Enquanto cooperava com ele, lembro-me de que, por um curto período, foi sentido um empecilho no caminho. A obra parecia emperrada e comecei a sentir-me alarmado, com medo de que algo tivesse entristecido o Espírito Santo. Certa noite, numa reunião de oração, um dos presbíteros levantou-se e fez a seguinte confissão: "Irmãos, o Espírito de Deus tem se entristecido e eu o entristeci. Adotei o hábito de orar a favor do irmão Patterson e da pregação, aos sábados à noite até a meia-noite. Durante muitos anos, dediquei as noites de sábado para implorar a bênção de Deus sobre os trabalhos do domingo. No sábado passado, estava cansado e não orei. Achava que a obra estava progredindo tão bem que eu podia dar-me ao luxo de ir para a cama sem buscar a Deus e sem pedir sua bênção. No domingo, tive a forte convicção de que entristecera o Espírito e percebi que ele não se manifestara na congregação. Senti que eu havia pecado e que era meu dever fazer esta confissão. Não sei se mais alguém entristeceu o Espírito de Deus, mas eu estou certo de que o fiz".

Já falei sobre a ortodoxia do irmão Patterson. Quando comecei a cooperar com ele, senti-me pesaroso com o que ele dizia às pessoas que se mostravam convictas de pecado. Por exemplo, na primeira reunião que realizamos com os interessados no avivamento, o número de presentes era muito grande. Passamos algum tempo conversando com eles, pessoa a pessoa, oferecendo orientação. De repente, o irmão Patterson levantou-se, muito emocionado, e disse: "Meus amigos, vocês já se colocaram na direção de Sião e agora os exorto a avançar com firmeza". Em seguida, fez uma preleção que durou apenas alguns momentos, na qual deu a nítida impressão de que agora aquelas pessoas estavam no caminho certo — era só continuar a cumprir seus deveres religiosos e estariam salvas.

Suas declarações causaram-me grande dor. Pareciam incentivar a justiça própria e levar aquelas pessoas a pensar que tinham elevada espiritualidade e cumpriam seu dever para com Deus. Elas podiam pensar que, se continuassem a cumprir seus deveres religiosos, como faziam até então, seriam salvos. Esse não era, de modo algum, meu diagnóstico da condição deles. Sentia-me desgostoso por ouvir semelhantes afirmações e, perplexo, tentava descobrir uma forma de neutralizá-las.

Assim, tão logo ele se sentou — ou talvez eu deva dizer, no final da reunião — quando, segundo o costume, eu resumia os resultados de nossa conversa, fiz um pequeno discurso, referindo-me ao que o irmão Patterson tinha dito. Observei que eles não deviam entender erradamente o que ele e usinara: que as palavras dele eram aplicáveis apenas aos que realmente eram convertidos e tinham intenção firme de chegar a Sião, aos que haviam entregado o coração a Deus. Elas não se aplicavam àqueles que, embora convencidos de pecado, ainda não se haviam arrependido, crido e entregado o coração a Deus. Quem pensasse assim, em vez de estar a caminho de Sião, estaria virando as costas para Cristo, resistindo ao Espírito Santo e rumando para o inferno. E, a cada momento que resistissem, estariam tornando-se piores. Enquanto se mostrassem insubmissos, sem arrependimento e sem fé, estariam pecando contra a luz maior. O Senhor deu-me uma visão muito nítida do assunto.

O irmão Patterson escutou com a máxima atenção. Nunca me esquecerei da sinceridade com que me observava nem do interesse com o qual acompanhava minhas explicações. Continuei minhas considerações até ver e sentir que a impressão causada pelas palavras do irmão Patterson não somente fora corrigida, mas também que eles estavam sentindo uma forte pressão para mostrar submissão a Deus. Foi então que os conclamei a ajoelharem-se e, ali mesmo, naquele momento, dedicar-se ao Senhor, renunciando a todos os pecados e entregando-se à disposição da bondade soberana, com fé no Senhor Jesus Cristo. Expliquei-lhes, com a maior clareza possível, a natureza da expiação e da salvação apresentada no evangelho. Passei, então, a orar com eles e tenho motivos para acreditar que um grande número deles se converteu ali mesmo. A partir de então, nunca mais ouvi qualquer coisa censurável da parte do irmão Patterson, nada que abalasse meus sentimentos ao orientar os pecadores interessados no evangelho.

De fato, percebi que ele estava notavelmente apto para aprender e sua mente estava aberta a esclarecimentos retos e justos. Parecia ser especialmente rápido em apossar-se daquelas verdades que precisavam ser apresentadas aos pecadores. E tenho por certo que, até ao dia de sua morte, nunca mais apresentou conceitos semelhantes àqueles que já mencionei e que me deixaram tão aflito na ocasião. Respeito e reverencio seu nome. Ele era um cristão amável e fiel ministro de Jesus Cristo.

 

CAPÍTULO XIX

Avivamento em Reading

Achava-me em Filadélfia, no coração da Igreja Presbiteriana, onde os conceitos de Princeton eram aceitos quase universalmente. Preciso dizer, ainda mais enfaticamente — se isso é possível — que a maior dificuldade com que deparava na promoção dos avivamentos provinha da instrução errônea dada ao povo, principalmente aos pecadores desejosos de conhecer o caminho da salvação. A verdade é que, em toda a minha vida ministerial, em cada localidade ou país onde trabalhei, sempre me achei diante dessa dificuldade, em maior ou menor grau. Estou convicto de que as pessoas são enganadas a tal ponto que há multidões vivendo no pecado, quando poderiam ter-se convertido se fossem instruídas na verdade.

A base do erro a que me refiro é o dogma que diz que a natureza humana é pecaminosa por si mesma e que, por isso, os pecadores são inteiramente incapazes de tornarem-se cristãos. Reconhece-se, quer expressamente, quer de modo virtual, que os pecadores talvez queiram ser cristãos, que realmente eles querem ser cristãos e que até mesmo freqüentemente tentam ser cristãos.

Tem sido a prática e, até certo ponto, continua a ser assim, os pastores pregarem o arrependimento e conclamarem as pessoas a arrependerem-se, mas apenas para resguardar a ortodoxia, revelando ao pecador no final que ele não pode arrepender-se por si mesmo, tanto quanto não poderia criar um mundo. O pecador, no entanto, tem de forçosamente fazer alguma coisa. E os pregadores, apesar de todo o seu conservadorismo, não têm coragem de revelar ao pecador que ele nada pode fazer. Por isso, levavam-no a orar por um novo coração, incentivando a justiça própria. O estranho é que, embora esses pastores digam ao pecador que ele é totalmente depravado e que todos os seus atos e pensamentos são pecaminosos, dizem-lhe também que ele precisa obter um coração novo. E, tendo ele esse desejo e sendo incapaz de produzir para si mesmo um novo coração, induzem-no a orar por isso.

Esses pastores, às vezes, determinam que o pecador cumpra seus deveres religiosos, pratique o bem, leia a Bíblia e faça uso dos meios da graça. Resumindo: determinam-lhe que faça tudo menos o que é ordenado por Deus. Deus ordena que o pecador se arrependa agora, creia agora e tenha seu coração transformado agora. Mas os pastores receiam apresentar-lhe as exigências divinas dessa forma, mostrando urgência, porque ensinam que o ser humano não é capaz de realizar essas coisas. Por isso, apresentam-lhe um meio-termo: em vez de conclamar o pecador a arrepender-se, a crer, a mudar o coração, a submeter-se e a voltar-se imediatamente para Deus, levam-no a praticar obras meramente externas, chamando a isso dever, para fazê-lo acreditar que assim chegará à conversão.

Como exemplo do que encontrei neste e em outros países, durante o tempo em que estou no ministério, farei referência a um sermão que ouvi do rev. Baptist Noel, em Inglaterra. Era ele homem virtuoso e ortodoxo, na acepção da palavra. O texto que ele usou foi este: "Arrependam-se, pois e voltem-se para Deus, para que os vossos pecados sejam cancelados, para que venham tempos de descanso da parte do Senhor", (At 3.19,20). Em primeiro lugar, o rev. Noel apresentava o arrependimento não como uma mudança voluntária, mas como uma transformação involuntária — que consistia na tristeza pelo pecado, um mero estado da sensibilidade. Depois, insistia em que o dever do pecador era arrepender-se e o conclamava a reconhecer os direitos de Deus sobre ele.

No entanto, estava pregando a uma congregação ortodoxa e não poderia deixar de lembrar-lhes que não se podiam arrepender e que, embora Deus o exigisse, o pregador estava convicto de que aquilo era impossível, visto que somente Deus lhes podia conceder o arrependimento. "Vocês perguntam, portanto, o que fazer. Vão para casa!", foi a resposta. "E orem, pedindo o arrependimento. Se ele não vier, orem de novo. Se ainda assim não vier, continuem orando até que ele venha". Essa foi a situação em que ele os deixou. A congregação era grande e os ouvintes muito atentos. Foi difícil conter a vontade de gritar para que se arrependessem e fazê-los entender que simplesmente orar pelo arrependimento não é o bastante.

Na ocasião, eu estava em Filadélfia e realmente, durante toda a minha vida ministerial, constatei ser comum que ministros e crentes professos tomassem por certo que o pecador é incapaz de fazer o que Deus exige deles e o encorajassem a fazer outra coisa. Não ousavam dizer ao pecador que aguardasse passivamente a operação divina, sem se preocupar em fazer outra coisa. Por isso encorajavam-no a empregar os meios da graça e a orar até o momento determinado por Deus para sua conversão.

Semelhantes instruções afligiam-me grandemente e boa parte de meus esforços no ministério têm consistido em corrigir tais conceitos e em insistir com o pecador que faça sem demora o que Deus exige dele. Quando alguém que ainda não se converteu me pergunta se o Espírito de Deus não tem nenhum papel no processo da conversão, eu respondo: "Sim, na realidade, não é você quem atua. O Espírito de Deus está operando agora em sua vida para que você faça exatamente o que ele quer. Está se empenhando para levá-lo ao arrependimento, para levá-lo a crer e trabalhará não para que sejam vistos em sua vida simples atos exteriores, mas para transformar seu coração".

A igreja, em grande medida, tem ensinado o pecador a começar pelo lado de fora da religião, por aquilo que chamam cumprimento externo do dever, a fim de conseguir a transformação interior da vontade e da disposição mental. Quanto a mim, sempre considerei essa postura absurda, herética, heterodoxa e extremamente perigosa. Sempre ensinei que não pode haver virtude alguma nas ações exteriores do pecador sem que seu coração seja transformado. Nenhum ato externo, baseado na justiça própria, pode conquistar o favor de Deus. E, sem o coração transformado, todos os esforços externos do pecador não passam de hipocrisia, ilusão e abominação.

Descobri inúmeros casos em que o resultado desse ensino incorreto é a má interpretação do dever do pecador. Posso dizer que encontrei milhares de pecadores, de todas as idades, vivendo essa ilusão. Imaginam que nada é exigido deles, senão que orem por um coração novo, vivam uma vida de moralidade, leiam a Bíblia, freqüentem os cultos, empreguem os meios da graça e deixem com Deus a total responsabilidade por sua conversão.

Partindo de Filadélfia, no inverno de 1829, mudei-me para Reading, cidade situada a cerca de 60 quilômetros a oeste de Filadélfia. Nesse local, ocorreu um incidente que mencionarei no devido contexto e que ilustrou de modo marcante o tipo de ensino a que me tenho referido e suas naturais conseqüências. Em Reading, havia algumas igrejas alemãs e uma igreja presbiteriana. O pastor desta era o rev. Greer [John Ferguson Grier]. A pedido dele e dos presbíteros de sua igreja, fui para lá, a fim de trabalhar durante algum tempo. Logo descobri, porém, que nem o dr. Greer nem qualquer membro de sua igreja faziam a mínima idéia do que necessitavam ou do que era, na realidade, um avivamento.

Pelo que me informei, nenhum deles tivera a oportunidade de testemunhar um desses movimentos espirituais. Além disso, todos os esforços empreendidos para promover o avivamento naquele inverno foram prejudicados pelo plano de se realizar, semana sim, semana não, um baile do qual participariam muitos membros da igreja. Um dos presbíteros de maior destaque na igreja do dr. Greer ajudava a organizar o baile. Nunca soube se o dr. Greer alguma vez chegou a opor-se a isso. Durante os dias da semana, não havia pregação na igreja e penso que nenhum outro encontro religioso.

Quando descobri a situação, considerei que era meu dever dizer ao dr. Greer que os bailes teriam de ser suspensos imediatamente, senão eu me negaria a ocupar seu púlpito. Os bailes, freqüentados pelos membros da igreja e organizados por um de seus presbíteros, não se harmonizavam com minha pregação. Ele, no entanto, respondeu: "Vá em frente! Siga seus métodos". E assim fiz. Pregava três vezes no domingo e creio que quatro vezes durante a semana. Prossegui nesse ritmo por cerca de três semanas, antes de mencionar outras reuniões.

Creio que a falta de reuniões de oração devia-se ao fato de os membros da igreja não terem o costume de orar em grupo. Entretanto, anunciei nos três cultos do terceiro domingo que uma reunião para os interessados no avivamento seria realizada na sala de preleções, no subsolo da igreja, na segunda-feira à noite. Expliquei com a maior clareza possível o objetivo da reunião, especificando o tipo de pessoa que deveria participar: somente os que estivessem seriamente preocupados com seu estado espiritual e desejassem receber instrução a respeito do que fazer para alcançar a salvação. O dr. Greer não levantou objeção alguma, pois deixara tudo a meu critério. Acho, porém, que ele imaginava que ninguém iria aparecer depois de um convite daquela ordem, pois comparecer àquela reunião seria reconhecer publicamente a ansiedade pela salvação da alma e mostrar-se pronto para atender imediatamente a essa necessidade espiritual.

Aquela segunda-feira foi um dia frio e com bastante neve. Pelo que eu observara, a convicção de pecado alcançara a congregação. No entanto, não estava certo de que um grande número de pessoas compareceria à reunião, pois era novidade para eles. Ao anoitecer, porém, dirigi-me ao local onde ela seria realizada. O dr. Greer entrou e a sala de preleções, que era grande — acho que tinha quase o tamanho do salão de cultos da igreja — estava cheia! Ao olhar ao redor, ele notou, surpreso, a presença dos membros mais ímpios da congregação. E a surpresa foi maior quando viu ali também a camada mais respeitável e influente da igreja. Ele nada comentou publicamente, mas, dirigindo-se a mim, disse: "Nunca dirigi uma reunião como esta. Assuma o controle e dirija-a à sua maneira".

Iniciei o encontro com uma breve explicação do que pretendia: conversar com cada um deles, por breves momentos, para que me dissessem com franqueza o que sentiam — quais eram suas convicções, resoluções e dificuldades. Para me fazer entender, fiz esta analogia: se estivessem doentes e chamassem um médico, este desejaria ser informado dos sintomas, saber o que sentiam. "Não posso aplicar minha instrução ao seu estado de alma sem que vocês o revelem a mim", disse-lhes. "O que desejo, pois, é que vocês revelem, com um mínimo de palavras, exatamente como estão se sentindo neste momento. Vou passar entre vocês e dar a cada um a oportunidade de declarar, em poucas palavras, seu estado de alma". Então fui passando de pessoa em pessoa.

O dr. Greer não disse uma só palavra, mas seguia-me, permanecendo de pé ou sentando-se ao meu lado, ouvindo tudo o que eu dizia a cada pessoa. Ficava bem perto de mim, pois eu falava em voz baixa, para não ser ouvido pelos outros, a não ser por aqueles que estavam próximos. Descobri haver forte convicção de pecado e muito sentimento religioso entre os que ali estavam. E o peso dessa convicção fazia-os sentirem-se muito pressionados. Poucas vezes participei de uma reunião mais solene. O convencimento do pecado firmara-se entre todas as classes: superiores e inferiores, ricas e pobres.

O dr. Greer ficou grandemente comovido. Embora nada dissesse, ficou claro que suas emoções eram intensas. Não fazia idéia de que a sua congregação houvesse chegado a semelhante estado espiritual. Percebi que, por vezes, era-lhe difícil controlar os seus sentimentos. Mesmo assim, não proferiu uma palavra sequer. Depois de passar tanto tempo em conversas particulares quanto o horário permitia, voltei ao púlpito e fiz um pronunciamento aos ouvintes em geral. Conforme era meu costume, fiz um resumo das reações mais interessantes que ouvira nas conversas pessoais. Omitindo nomes, narrei os casos mais típicos e analisei-os, usando-os como ilustração para instrução e ensino.

Procurei desfazer os falsos conceitos e os erros cultivados por eles, esclarecer sobre a falsa esperança de simplesmente esperar que Deus os levasse à conversão. E, num discurso de pouco mais de meia hora, expus a situação com tanta clareza quanto me era possível. Em seguida, exortei-os a submeterem-se, a crer e a consagrarem-se com tudo que possuíam — ali mesmo — a Cristo. Então orei com eles. Chamei os que se sentiam prontos a assumir de imediato o compromisso de viver apenas para Deus, de se entregarem à misericórdia divina em Cristo e de abrir mão de todo o pecado renunciando a ele para sempre em todas as suas formas. Eles deviam ajoelhar-se não com a expectativa de que seriam as minhas orações que os salvariam. Eu queria que, enquanto orasse, eles se entregassem a Cristo e fizessem, de coração, tudo quanto os exortava a fazer. Pedi que se ajoelhassem somente os que estivessem dispostos a fazer o que Deus requeria de cada um, conforme eu já explicara.

O dr. Greer parecia muito surpreendido com a prova a que os submeti e com a insistência para que se submetessem de imediato. Tomei o cuidado de analisar cada caso, para que ninguém se ajoelhasse sem que fosse em total sinceridade. Percebi que o Espírito de Deus insistia tão fortemente com eles que, se eu pudesse fazê-los entender exatamente o que Deus queria deles, muitos sem dúvida alguma seriam levados pelo Espírito de Deus a tomar a decisão naquele momento, ali mesmo.

Tão logo percebi que me entendiam perfeitamente, pedi que se ajoelhassem. Eu também me ajoelhei. O dr. Greer ajoelhou-se ao meu lado, mas nada disse. Apresentei em oração diante de Deus a situação em que eles se encontravam e confirmei o propósito que tinham feito de se submeterem, crerem e de se consagrarem a Deus. Sentia-se que a congregação estava permeada de reverência e do temor a Deus e envolta num silêncio tumular, excetuando-se minha voz em oração e os soluços, suspiros e choro que eram ouvidos, em menor ou maior volume, por todo o recinto. Em seguida, levantei-me e todos se colocaram de pé. Sem falar mais nada, impetrei a bênção final e encerrei a reunião.

O dr. Greer tomou-me cordialmente a mão e disse, sorrindo: "Vou vê-lo amanhã de manhã". Ele foi para casa e eu voltei para o meu aposento. Penso que eram onze da noite quando um mensageiro chegou correndo para me avisar que o dr. Greer havia falecido. Perguntei como acontecera. Disse que o ministro acabara de se recolher à cama, quando lhe sobreveio uma crise de apoplexia, à qual não resistiu, morrendo imediatamente. Era um pastor grandemente respeitado e amado pelo seu rebanho e estou convicto de que essa estima era merecida. Era um homem de alta cultura e, tenho certeza, de piedade sincera. No entanto, sua formação teológica não o preparara bem para a obra do ministério, que é ganhar almas para Cristo. Era, ainda, um homem de certa timidez. Evitava o confronto com a congregação e não resistia suficientemente aos avanços do pecado no meio dela.

Sua morte súbita foi um grande choque, tornando-se assunto das conversas por toda a cidade. Embora, por todas as aparências humanas eu tivesse constatado que um bom número de pessoas se havia submetido a Deus no encontro de segunda-feira à noite, a morte do dr. Greer, em circunstâncias tão extraordinárias, lastimavelmente desviou a atenção do povo durante uma semana ou mais. Depois do sepultamento, porém e com os cultos vespertinos de volta ao seu andamento normal, a obra prosseguiu num ritmo poderoso, avançando de modo muito animador.

Muitos incidentes bastante emocionantes ocorreram nesse avivamento. Lembro-me de que, certa noite, depois de a neve ter caído espessa e severamente, deslocando-se de modo terrível pela força de uma forte ventania, fui acordado à meia-noite. Alguém me chamava para visitar um homem que sentia tão tremenda convicção de pecado que temia morrer se nada fosse feito a seu favor. Chamava-se Buck. Era homem robusto, muito musculado, de muita força de vontade e nervos de aço — fisicamente, um magnífico exemplar da raça humana. Sua mulher professava a fé, mas ele tinha sido uma espécie de Gálio, "não [demonstrando] nenhuma preocupação com isso". Assistira ao culto vespertino e o sermão o desmontara  por completo. Fora para casa num estado emocional terrível, sendo que suas convicções e aflições foram aumentando até vencerem sua força física. Seus familiares também receavam que ele morresse, caso não fosse ajudado por alguém. Assim, apesar da violenta tempestade de neve, mandaram um mensageiro buscar-me.

Levantei-me, vesti uma roupa adequada para enfrentar a tempestade e saí. Tínhamos de andar contra o vento uma distância de 250 a 300 metros. Ouvi os gemidos — ou uivos — daquele homem antes de chegar à sua casa. Quando entrei, ele estava sentado no chão e alguém — penso que sua esposa — amparava-lhe a cabeça. O olhar dele era indescritível. Por mais acostumado que eu estivesse a ver pessoas sofrendo sob convicção espiritual, preciso confessar que sua aparência foi um choque tremendo para mim. Ele estava-se contorcendo em agonia, rangendo os dentes e literalmente mordendo a língua por causa da dor que sentia. Quando me viu, gritou para mim: "Sr. Finney, estou perdido! Sou uma alma perdida!". E fez outras confissões que me deixaram ainda mais abalado. Lembro-me de que exclamei: "Se isso é convicção, como será o inferno?"

Recuperei-me do choque o mais depressa possível, sentei-me ao lado dele e ministrei-lhe instrução. De início, teve muita dificuldade para prestar atenção, mas logo consegui que se concentrasse no que eu dizia para entender o caminho da salvação em Cristo. Apresentei-lhe com firmeza o Salvador e o fardo que sentia sobre si não demorou a ser removido. Foi convencido a confiar no Salvador e, liberto, encheu-se de júbilo pela sua esperança em Cristo.

É óbvio que, dia após dia, minhas mãos, minha cabeça e meu coração estavam totalmente ocupados. Não havia pastor para ajudar-me e a obra propagou-se em todas as direções. O presbítero da igreja a quem me referi como sendo um dos organizadores dos referidos bailes não demorou a ter o coração quebrantado diante do Senhor e passou a participar da obra. E, como conseqüência, seus familiares logo se converteram. A obra entre as famílias dos membros daquela igreja que cooperaram com o avivamento foi completa.

Já mencionei que, naquele local, ocorreu um fato que bem ilustra os ensinos da Escola Antiga, dos quais já me queixei. Bem cedo, certa manhã, um advogado, membro de uma das famílias mais respeitáveis na cidade, foi até meu aposento. Parecia muito agitado. Percebi que era homem de muita cultura, um cavalheiro. Era a primeira vez que o via. Ele entrou, apresentou-se e declarou ser um pecador perdido — chegara à conclusão de que não havia esperança para ele. Informou-me, em seguida, que, quando estava na Faculdade de Princeton, ele e mais dois colegas de classe sentiram-se muito ansiosos a respeito da própria alma e foram procurar o dr. Ashbel Green, então reitor daquela universidade e perguntaram-lhe o que fazer para serem salvos. O doutor Green declarou estar muito contente com aquela iniciativa e mandou que ficassem longe de todas as más companhias, lessem a Bíblia de modo regular e orassem para que Deus lhes desse um coração novo. E acrescentou: "Continuem assim e o Espírito de Deus os converterá. De outra forma, ele se afastará de vocês e vocês voltarão aos vossos pecados".

— E como acabou? — perguntei.

— Fizemos exatamente o que ele nos mandou — respondeu o advogado. — Mantivemo-nos longe das más companhias e oramos para que Deus fizesse nascer em nós um novo coração. Mas, pouco tempo depois, as nossas convicções foram-se desgastando e cessamos de nos dedicar à oração. Perdemos todo o interesse. — E, em lágrimas, prosseguiu: — Meus dois companheiros foram levados ao túmulo pela bebedeira e, se eu não conseguir arrepender-me, terei o mesmo fim.

Essa declaração fez-me perceber que ele fazia uso de bebidas fortes. Mas, naquele horário estava sóbrio e terrivelmente ansioso a respeito da própria alma. Procurei demonstrar o erro a que foi induzido pelos ensinos da Escola Antiga. Ele resistira e entristecera o Espírito Santo ao transferir para Deus o que era responsabilidade humana. Procurei mostrar-lhe que a própria natureza da situação impedia que Deus fizesse o que exigia do pecador. Deus exigia arrependimento e não podia arrepender-se no lugar do pecador. Deus exigia que o pecador cresse e não podia crer no lugar dele. Deus exigia submissão e não podia submeter-se no lugar dele.

Em seguida, procurei fazê-lo compreender a atuação do Espírito de Deus ao dar ao pecador o arrependimento e um novo coração. Expliquei-lhe que se tratava de persuasão moral divina: o Espírito leva o pecador a enxergar os próprios pecados, insiste em que este abra mão deles, leva-o a tomar consciência da própria culpa e do perigo que está correndo e o conclama a fugir da ira vindoura. O Espírito apresenta ao pecador o Salvador, a expiação e o plano de salvação e convida-o a aceitá-lo. Perguntei-lhe se não percebia a urgência premente a respeito daquelas verdades reveladas, se não sentia um chamado urgente para submeter-se, crer e obter ali mesmo um novo coração.

— Oh, sim! — ele respondeu. — Vejo e sinto tudo isso. Mas não fui abandonado por Deus? Não perdi a oportunidade de receber a graça?

— Não! — respondi. — Está claro que o Espírito de Deus ainda está chamando você, ainda está tentando convencê-lo e a levá-lo ao arrependimento. Você mesmo reconhece que percebe essa urgência.

— É isso, então, que o Espírito de Deus está fazendo para me mostrar tudo isso? — ele perguntou.

Dei-lhe a certeza de que era assim mesmo. Ele devia entender que se tratava de um chamado divino e que aquela era a evidência definitiva de que ele não fora abandonado, que não desperdiçara a oportunidade da graça por causa de seus pecados. Deus continuava querendo salvá-lo. Em seguida, convidei-o a aceitar o chamado, a aproximar-se de Jesus, a tomar posse da vida eterna ali mesmo. Tratava-se de um homem inteligente e o Espírito de Deus estava sobre ele, ensinando-o e fazendo-o compreender o que eu lhe dizia. Quando percebi que o caminho estava totalmente preparado, convidei-o a ajoelhar-se e a humilhar-se diante de Deus. E ele assim fez. E, pelo que humanamente era possível perceber, experimentou uma conversão completa no mesmo instante.

— Oh! Se o dr. Green nos tivesse falado isso que você acaba de me dizer, se tão-somente tivéssemos recebido a instrução correta, todos nós teríamos nos convertido imediatamente! — disse ele depois. — Mas meus amigos e companheiros perderam-se e minha salvação é uma demonstração maravilhosa da misericórdia divina!

Ora, a instrução do dr. Green, substancialmente, é a mesma repassada há muitas décadas por milhares de ministros aos pecadores que buscam a salvação. Continua sendo, em essência, a instrução oferecida por muitos ministros da Igreja do Senhor em todas as denominações. Considero-a totalmente equivocada e receio que seja a causa da ruína de milhares de almas.

Lembro-me de um caso muito interessante, ocorrido com um comerciante de Reading, homem muito respeitável. Uma ramificação de seus negócios era a produção de uísque. Ele acabara de montar uma destilaria muito grande, na qual investira muito dinheiro. Fora construída com a melhor tecnologia da época, em grande escala e aquele homem estava-se aprofundando nesse negócio. Mas tão logo se converteu, abandonou totalmente a idéia de continuar no ramo. Chegou a essa conclusão espontaneamente, declarando: "Não tenho mais parte nisso. E vou desfazer a destilaria: não vou trabalhar nela nem vendê-la para que outros a façam funcionar". Sua mulher era virtuosa — uma das irmãs do sr. Buck, cuja conversão deu-se naquela noite de tempestade. O nome do comerciante era O'Brien.

O avivamento firmou-se poderosamente na família dele. Vários de seus familiares converteram-se. Não me recordo agora quantas pessoas foram levadas à conversão, mas acho que todos de sua família se converteram. Seu irmão e a esposa também se converteram e não tenho como calcular o número exato de parentes convertidos, mas foram muitos. O próprio sr. O'Brien, no entanto, tinha a saúde frágil e a tuberculose levou-o rapidamente deste mundo. Eu fazia-lhe visitas freqüentes e sempre o encontrava cheio de alegria.

Havíamos examinado os candidatos à comunhão da igreja e grande número deles seria admitido em determinado domingo, entre eles, os membros da família do sr. O'Brien. O domingo amanheceu e a família logo percebeu que o sr. O'Brien não sobreviveria àquele dia. Ele chamou a mulher para o lado da cama e disse-lhe: "Minha querida, vou celebrar o domingo no céu. Que toda a nossa família vá, com todos os amigos e se una à igreja aqui embaixo, enquanto vou me unir com a igreja lá em cima". Antes da hora do culto, ele já falecera. Alguns amigos colocaram-no na urna mortuária. A família e os parentes reuniram-se ao redor de seu corpo inerte e depois foram à igreja participar do culto. E, conforme o desejo do sr. O'Brien, uniram-se à Igreja militante enquanto ele se reunia à Igreja triunfante. Foi uma cena muito tocante, um fato comovente digno de ser mencionado à mesa da comunhão.

O pastor deles havia morrido pouco tempo antes e acho que foi naquela manhã que eu dissera ao sr. O'Brien:

— Dê um abraço no irmão Greer, quando você chegar ao céu. Ele sorriu com santa alegria e perguntou:

— Você acha que eu o reconhecerei?

— Sim, com certeza você o reconhecerá — respondi. — Transmita a ele meu amor cristão e diga-lhe que a obra está avançando gloriosamente.

— Eu vou dizer! Eu vou dizer! — prometeu.

Não lembro quantos de seus familiares se filiaram à igreja naquele dia, mas, eram em número considerável. Sua mulher estava sentada à mesa da comunhão e manifestava em seu semblante uma mistura de alegria e tristeza que só poderia ser esperada numa ocasião como aquela. Havia certo sentimento de triunfo santo manifestado nos parentes e amigos do sr. O'Brien, quando lhes foi ressaltado o fato de que o marido, o pai, o irmão e o amigo estavam sentados à mesa do Senhor nas alturas, enquanto que eles estavam sentados à mesa do Senhor na terra.

Houve muitos episódios comoventes e interessantes naquele avivamento, sob muitos aspectos. Ele ocorreu entre uma população que não tinha o mínimo conceito de avivamento religioso. Os alemães acreditavam que haviam sido cristianizados pelo batismo, mais exatamente ao receber a comunhão. Quase todos, quando eu lhes perguntava quando se haviam tornado cristãos, respondiam que tinham recebido a comunhão das mãos do dr. Muhlenberg ou de algum outro teólogo alemão. E quando lhes perguntava se pensavam ser isso a religião, respondiam que sim. Era o que acreditavam e assim pensava o próprio dr. Muhlenberg.

Por ocasião do enterro do dr. Greer, caminhei ao lado do dr. Muhlenberg e ele contou-me que havia cristianizado 1.600 pessoas por meio do batismo e da comunhão desde quando assumira o pastorado da igreja em Reading. Ele mesmo não parecia defender outro conceito, a não ser o de que para ser cristão bastava aprender o catecismo, ser batizado e tomar a comunhão. O avivamento ia de encontro àquele conceito. Em Reading, de início, quase todos pensavam assim. Sustentava-se, conforme fui informado — e não tenho a mínima dúvida de que era verdade — que, para eles, ser convertido, estabelecer o culto doméstico e dedicar-se à oração não somente era fanatismo como também significava afirmar que todos os seus antepassados estavam no inferno, pois jamais haviam praticado semelhantes coisas. Fui informado, também, pelos próprios membros da igreja alemã, de que seus ministros pregavam contra tudo isso e advertiam com severidade os que abandonavam o caminho de seus pais para buscar a conversão.

Penso que a grande maioria da congregação do dr. Greer converteu-se naquele avivamento. De início, enfrentei considerável dificuldade com a imprensa local. Acho que dois ou mais jornais diários eram publicados ali, na época. Fiquei sabendo que os editores eram dados à bebida: nas festas, ficavam tão bêbados que tinham de ser carregados para casa. O povo era bastante influenciado pelos jornais — refiro-me à população alemã, em especial. Os editores começaram a orientar o povo em questões religiosas e a publicar matérias contra o avivamento e contra meus sermões. Assim, a população ficou confusa. A situação agravou-se, dia após dia, semana após semana, até que achei ser minha obrigação pronunciar-me sobre o assunto.

Subi ao púlpito quando a igreja estava cheia até sua máxima capacidade e li o texto: "Vocês pertencem ao pai de vocês, o Diabo e querem realizar o desejo dele" (Jo 8.44). Passei, então, a explicar de que maneira os pecadores cumpriam o desejo do Diabo. Citei muitas formas em que a obra imunda de Satanás era realizada pelos homens — coisas que ele não podia realizar por conta própria. Depois de deixar essa questão bem clara, apliquei-a ao comportamento daqueles editores de jornais. Perguntei se não achavam que tais editores estavam cumprindo o desejo do Diabo — se não acreditavam que o próprio Diabo os estava manipulando para que fizessem exatamente aquilo. Depois, perguntei à congregação se era lícito que editores de caráter tão desprezível orientassem a vida religiosa do povo.

Revelei o que eu soubera a respeito do caráter daqueles homens, que eram freqüentemente levados para casa, bêbados, dos locais de depravação pública. Critiquei-os severamente por tentarem instruir o público no tocante aos seus deveres diante de Deus e do próximo. Falei que, se tivesse uma família ali, não permitiria que aqueles jornais entrassem em minha casa, que teria medo de recebê-los sob meu teto, pois os considerava por demais imundos para tocar neles com meus dedos. Eu os pegaria com uma tenaz e os jogaria na rua. Fiquei sabendo, na manhã seguinte, que muitos exemplares daqueles jornais apareceram jogados na rua. Nunca mais ouvi falar de qualquer oposição por parte dos tais editores. A partir de então, a imprensa diária manteve total silêncio sobre o avivamento e a obra prosseguiu.

Continuei em Reading até o final da primavera. Não sei quantas conversões aconteceram ali, pois, como já disse, nunca tive o hábito de contar nem publicar o número de convertidos. Houve muitas conversões notáveis. E, pelo que sei, a congregação manteve-se unida, grandemente encorajada e fortalecida, com grande acréscimo no número de membros. Depois de minha partida, não voltei a Reading.

De Reading, fui para Lancaster, Pensilvânia, onde residia então o presidente Buchanan. (Ele morou ali até sua morte.) A igreja em Lancaster não tinha pastor e vi que a fé não se desenvolvia ali. Nunca haviam experimentado um avivamento espiritual e, obviamente, não tinham idéia formada sobre o que isso significava nem estavam cientes dos meios apropriados para sua realização. No entanto, a obra de Deus foi imediatamente reavivada, e o Espírito Santo foi derramado quase imediatamente sobre o povo.

Hospedei-me na casa de um senhor idoso, chamado Kirkpatrick, um dos presbíteros locais — na realidade, o líder da igreja. Era muito rico e sua influência estava acima da de qualquer membro da igreja. Enquanto eu estava hospedado com sua família, a verdadeira situação espiritual daquela igreja foi-me revelada. Um pastor que anteriormente ministrara ali convidara o sr. Kirkpatrick a afiliar-se e assumir o cargo de presbítero. Devo esclarecer que os fatos que passo a narrar me foram relatados pelo próprio presbítero.

Certo domingo à noite, depois de ouvir dois sermões muito incisivos, aquele senhor não conseguiu dormir. Estava com a alma tão aflita que não pôde suportar até a manhã seguinte. Mandou chamar-me na calada da noite, declarou suas convicções e disse estar ciente de que nunca fora convertido. Contou-me que, quando foi convidado a afiliar-se à igreja e tornar-se presbítero, sabia que não era convertido. Sendo alvo de muita insistência, foi consultar o rev. Cathcart, idoso ministro presbiteriano de uma igreja não muito distante de Lancaster e explicou-lhe que, apesar de não ser convertido, estava sendo convidado a afiliar-se à igreja e de tornar-se presbítero. O dr. Cathcart, levando em conta todas as circunstâncias, aconselhou-o a afiliar-se e aceitar o cargo — o que ele realmente fez.

Na ocasião em que conversou comigo sobre o assunto, suas convicções eram muito profundas. Dei-lhe a orientação que considerava necessária e insisti em que aceitasse imediatamente o Salvador. Enfim, tratei-o como a qualquer pecador que se interessasse pela fé. Aquele foi um momento da maior solenidade. Ele prometeu aceitar a Cristo como Salvador. Da história de sua vida, nada sei daí em diante. Certamente era homem de bom caráter e, pelo que sei, nunca fez nada que desonrasse o cargo que ocupava. Os que têm conhecimento da condição da igreja pastoreada pelo dr. Cathcart, na época e no tocante à situação dos presbíteros, não estranharão o conselho que ele deu ao sr. Kirkpatrick. Coisas extraordinárias ocorreram durante minha breve estada em Lancaster, como a história que passo a narrar.

Certa noite, eu preguei sobre um assunto que me levou a insistir, de modo tão enfático quanto me foi possível, a respeito da aceitação imediata de Cristo. A igreja estava cheia, a ponto de não caber mais ninguém. No encerramento do sermão, fiz um veemente apelo para que os ouvintes tomassem uma decisão ali mesmo. Penso que solicitei aos que já haviam aceitado o Salvador que se colocassem de pé, a fim de que soubéssemos quem eles eram e fizéssemos deles assunto de nossas orações. Conforme fiquei sabendo no dia seguinte, dois homens, que tinham bom relacionamento um com o outro, estavam sentados juntos perto de uma das portas da igreja. Um deles ficou muito tocado com o apelo e não pôde conter a emoção, fato que seu vizinho presenciou. No entanto, o homem não se colocou de pé nem entregou o coração a Deus.

Eu insistia com eles, aplicando no apelo todas as minhas energias, a fim de despertar-lhes o pensamento de que talvez fosse a última oportunidade que alguns deles teriam na vida para decidir a questão. Numa congregação tão grande, não seria improvável que alguns, naquela mesma noite, decidissem seu destino eterno de uma ou de outra maneira. Não era improvável que, diante de Deus, a decisão feita naquela hora valesse por toda a eternidade. Depois de encerrado o culto, conforme fiquei sabendo no dia seguinte, aqueles dois homens saíram juntos e um disse ao outro:

— Vi que você ficou profundamente emocionado com o apelo do sr. Finney.

— Fiquei mesmo — respondeu o outro. — Nunca antes em minha vida me senti assim, principalmente quando ele nos fez lembrar que talvez fosse a última oportunidade que teríamos para aceitar a oferta da misericórdia divina.

Continuaram a conversar e, mais adiante, separaram-se, indo cada um para sua casa. A noite era escura e aquele que experimentara emoções tão profundas, impressionado com a idéia de que talvez estivesse rejeitando sua última oferta, tropeçou num paralelepípedo e quebrou o pescoço. Assim, ficou claro que, para ele, realmente aquela havia sido a última oportunidade. Isso foi-me contado um dia depois.

Estabeleci reuniões de oração em Lancaster e insisti em que os presbíteros da igreja participassem delas. Assim fizeram, atendendo ao meu pedido sincero, embora, como descobri depois, nunca tivessem participado de reuniões como aquelas. O interesse parecia aumentar dia após dia e as conversões multiplicaram-se. Não lembro o motivo de não ter passado mais tempo ali. Saí de Lancaster tão prematuramente que não há condição de formular um relato pormenorizado da obra naquela cidade.

 

CAPÍTULO XX

OS AVIVAMENTOS EM COLUMBIA, E NA CIDADE DE NOVA IORQUE

Em meados do verão, voltei de Lancaster para o condado de Oneida, estado de Nova York e passei um breve tempo em casa de meu sogro. Penso que foi durante aquele período, quando estava hospedado em Whitestown, que um fato despertou grandemente meu interesse. Um mensageiro veio de Colúmbia, que ficava no condado de Herkimer, com o pedido de que eu fosse trabalhar naquela cidade, pois a obra da graça já começara a desenvolver-se ali. As informações que me deu a respeito do trabalho realizado em Colúmbia foram tais que me senti forçado a atender ao seu pedido. No entanto, não pensava em demorar-me naquela cidade, já que recebera outros chamados mais urgentes para assumir obras de avivamento. Mas fui para Colúmbia, a fim de acompanhar o trabalho e prestar toda ajuda possível, ainda que por breve tempo.

Lá havia uma grande igreja alemã, cujos membros haviam sido recebidos, segundo o costume da igreja, mediante o exame de seus conhecimentos doutrinários, em vez de ser ouvida a narrativa de sua experiência cristã. Conseqüentemente, conforme fui informado, a igreja era composta de pessoas não convertidas em sua grande maioria. Era uma igreja grande e o pastor era um jovem chamado Hongin [Jacob W. Hangen], descendente de alemães proveniente da Pensilvânia.

Falando a respeito de si mesmo e da situação de Colúmbia, o pastor Hongin informou-me que estudara teologia com um doutor em divindade, um alemão, no lugar onde morava e que este de modo algum encorajava a religião experiencial. Um de seus colegas tinha inclinações religiosas e orava a sós no quarto. O velho professor, que não via isso com bons olhos, de alguma forma veio a saber do caso e advertiu-o contra semelhante prática, que considerava perigosa. Alegou que o aluno enlouqueceria se seguisse semelhante caminho e que seu professor seria o grande culpado se permitisse tal coisa.

O sr. Hongin confessou que não tinha religião alguma. Afiliara-se à igreja de acordo com o processo normal da época. Não tinha a mínima idéia de que, para tornar-se pastor, fosse necessário algo mais com referência à vocação e experiência religiosa. Sua mãe, no entanto, era uma mulher piedosa. Entendia melhor a questão e ficou muito aflita ao ver que um de seus filhos exerceria o sagrado ministério sem ser convertido. Depois de ele ter sido chamado para a igreja em Colúmbia, quando estava para sair de casa, a mãe teve com ele uma conversa bem séria, fazendo com que se impressionasse com a responsabilidade que assumiria e dizendo coisas comoventes, as quais penetraram profundamente em sua consciência. Ele revelou não ter conseguido libertar-se do que a mãe lhe dissera, que suas palavras passaram a pesar muito em sua mente e que suas convicções foram-se aprofundando até quase levá-lo ao desespero.

Ele ficou nessa situação por muitos meses. Não havia ninguém com quem pudesse conversar sobre o assunto, não conseguia abrir o coração. Depois de séria e prolongada luta, ele converteu-se, encontrou a luz. Percebeu o estado de sua alma e reconheceu a condição em que sua igreja e todas as outras se encontravam, devido à maneira em que nelas eram admitidos os membros. Sua mulher não era convertida e ele começou imediatamente a trabalhar para levá-la à conversão, o que, pela graça de Deus, não demorou muito a acontecer. A alma do sr. Hongin foi totalmente absorvida pela questão. Ele passou a dedicar-se à leitura da Bíblia e à oração e pregava com entusiasmo. Era, no entanto, um recém-convertido. Por isso, não recebera ainda a instrução de que necessitava e sentia-se um tanto desorientado quanto ao que fazer. Percorria todo o município a cavalo e, conversando com os presbíteros e os líderes da igreja, teve a satisfação de constatar que alguns de seus presbíteros mais destacados e várias mulheres entre os membros da igreja haviam passado pela experiência da conversão.

Depois de muito orar e pensar no assunto, tomou uma decisão. No domingo, avisou que num dos dias daquela semana seria realizada uma assembléia para a resolução de certas questões e, para essa reunião especial, desejava a presença de todos os membros. Sua conversão, suas pregações, as visitas e as conversas pessoais com o povo de todo o município já haviam obtido algum resultado, de modo que a religião havia-se tornado o tema comum das conversas. Assim, sua convocação foi atendida e no dia determinado a congregação compareceu em peso. O pastor expôs a verdadeira situação da igreja e apontou o erro que ela cometia quanto às condições exigidas para o ingresso de novos membros. Discursava ora em alemão, ora em inglês, a fim de que, dentro do possível, todos pudessem compreendê-lo. Depois de falar até levar o povo à emoção, propôs a desativação da igreja que então existia, a fim de que uma nova fosse organizada e insistiu em que essa medida era essencial para o progresso e bem-estar espiritual de seus membros.

Ele entrara em entendimento com os membros da igreja que considerava realmente convertidos para que, com sua proposta e apoio, dirigissem a votação a favor da desativação da igreja. Acho que um deles fez a proposta e os outros a apoiaram. Seja como for, a proposta foi apresentada e, diante disso, os membros convertidos colocaram-se em pé, conforme lhes fora pedido. Estes eram muito influentes na igreja e os demais, vendo que estavam de pé, foram-se levantando e, finalmente, a proposta foi aprovada por unanimidade. Então, o pastor declarou: "Agora, não há igreja em Colúmbia. E a nossa proposta é formar uma igreja de crentes, de pessoas realmente convertidas a Cristo". Em seguida, diante da congregação, relatou a própria experiência. Convidou sua mulher a falar e ela também deu seu testemunho. Os presbíteros e membros convertidos tiveram sua vez, um após outro, de relatar diante do povo sua experiência de conversão, até que todos tivessem falado.

Com esse grupo, formou-se uma nova igreja. O pastor então dirigiu-se aos que não eram considerados convertidos e disse-lhes: "Seus vínculos com esta igreja estão desfeitos. Vocês estão fora, no mundo. E, até que se tenham convertido e afiliado à igreja, não poderão batizar seus filhos nem participar das ordenanças". Um grande pânico tomou conta daquelas pessoas. Segundo acreditavam, não participar do sacramento e não batizar os filhos era uma perspectiva assustadora, pois fora dessa maneira que eles se haviam tornado cristãos.

O sr. Hongin passou, então, a trabalhar com todas as suas forças. Visitava, pregava, orava e realizava encontros de avivamento. O interesse do povo aumentava e a obra continuou assim durante algum tempo. Então, ele ficou sabendo que eu estava no condado de Oneida e enviou o mensageiro para buscar-me. Ele parecia um novo convertido de coração fervoroso e escutava minhas pregações com alegria quase irreprimível. Vi que a congregação era bem grande e estava sempre muito atenta. Dentro de minhas possibilidades de avaliação, posso dizer que a obra era muito próspera e saudável. Aquele avivamento continuou a desenvolver-se até alcançar e levar à conversão quase todos os habitantes do município. Galesburg, em Illinois, foi povoada por uma colônia proveniente de Colúmbia e acredito que todos os colonos, ou quase todos, converteram-se durante aquele avivamento.

Foi assim que o sr. Hongin narrou esses fatos. Percebi que suas opiniões eram firmadas no evangelho, que seu coração era cheio de calor e que o interesse da congregação pela vida espiritual era o que se podia desejar. Todos prestavam a máxima atenção às minhas palavras, com tamanho interesse, atenção e paciência que nos levava ao mais alto grau de emoção. O próprio sr. Hongin era como uma criança pequena, o convertido mais dócil, humilde e sincero que conheci. Aquela obra continuou mais de um ano, conforme fui informado e propagava-se cada vez mais entre aquela grande e interessante população de agricultores.

Depois de minha volta a Whitestown, fui convidado a visitar a cidade de Nova York. Tomei conhecimento de que grandes esforços haviam sido feitos para impedir minha ida àquela cidade. Conforme fiquei sabendo, os ministros presbiterianos tinham firmado um acordo mútuo de não convidar-me para pregar em suas igrejas. Isso devia-se, em parte, à influência do sr. Nettleton. Nunca procurei apurar essa história que, possivelmente, não era verdadeira. Nada soube a respeito, a não ser muito tempo depois. Seja como for, Anson G. Phelps, que se tornou conhecido por deixar, em seu testamento, grandes contribuições para as principais instituições beneficentes do país, sabedor de que eu não seria convidado para pregar em nenhum dos púlpitos da cidade, alugou um templo desocupado, na rua Vandewater e enviou-me um recado urgente para que fosse pregar ali. Atendi ao seu pedido e ali tivemos um avivamento poderoso.

Descobri que o sr. Phelps dedicava-se muito à obra e não hesitava em custear qualquer despesa necessária para promovê-la. A propriedade por ele alugada não poderia ser usada por mais de três meses. Por isso, ele comprou, antes de se esgotarem os três meses, um templo na rua Prince, perto de Broadway. Esse templo, construído pelos universalistas, foi vendido ao sr. Phelps, que pessoalmente fez a compra e pagou por ele. Passamos, portanto, da rua Vandewater para a rua Prince e ali organizamos uma igreja, formada principalmente de crentes convertidos durante as reuniões evangelísticas na rua Vandewater. Continuei atuando intensamente na rua Prince durante alguns meses — acho que até o fim do verão. Houve muitas conversões interessantes, uma vez que as pessoas que freqüentavam nossas reuniões eram provenientes de todas as partes da cidade.

Durante o tempo em que trabalhei ali, impressionou-me a piedade do sr. Phelps. Enquanto continuamos na rua Vandewater, eu, minha mulher e nosso único filho fomos hóspedes em sua casa. Observei que, embora estivesse grandemente sobrecarregado com seus negócios, o sr. Phelps conseguia manter um elevado nível espiritual. Vinha para as reuniões diretamente do trabalho e participava delas de modo tão devoto, que demonstrava saber perfeitamente separar os negócios seculares da vida religiosa. À medida que o observava, dia após dia, passei a interessar-me cada vez mais por sua vida interior, conforme esta se manifestava em sua vida exterior.

Certa noite, por volta de meia-noite ou uma da madrugada, precisei descer a escada do andar superior para pegar alguma coisa para nosso filho pequeno. Supunha que toda a família estivesse na cama, porém surpreendi-me ao ver o sr. Phelps sentado diante da lareira, com roupas de dormir. Notei que eu interrompera suas devoções particulares. Pedi desculpas e falei que supunha que ele estivesse dormindo. Ele respondeu: "Irmão Finney, tenho muitos negócios prementes durante o dia e pouco tempo para a devoção pessoal. Tenho o costume de tirar uma soneca à noite e levantar-me para desfrutar um período de comunhão com Deus".

Depois de sua morte, ocorrida poucos anos atrás, soube-se que, durante essas horas noturnas em que permanecia acordado, ele mantivera um diário manuscrito que, mais tarde, foi encadernado em vários volumes. Esse diário revelava as operações por que passava sua mente e o verdadeiro progresso de sua vida interior. Esse fato interessou-me e afetou-me grandemente, fazendo com que eu me inteirasse mais daquilo que despertara tanto minha atenção e admiração enquanto fiz parte daquela família.

Naturalmente, eu nunca soube o número dos que se converteram enquanto estávamos nas ruas Prince e Vandewater, mas sei que foram muitos. E não devo deixar de narrar uma dessas conversões. Certo dia, uma jovem veio visitar-me. Sentia grande convicção de pecado. Ao conversar com ela, percebi que muitas coisas lhe pesavam na consciência. Se entendi bem, era filha única de uma viúva. Contou-me que desde a infância tivera o hábito de fazer pequenos furtos. Tirava das colegas de classe e de outras pessoas lencinhos, alfinetes de enfeite, lápis e tudo que tivesse a oportunidade de furtar. Ela especificou algumas dessas coisas em sua confissão e perguntou-me o que fazer a respeito. Disse-lhe que precisava devolvê-las e confessar seu erro àqueles de quem as havia furtado.

Sem dúvida, foi um grande desafio para ela. Suas convicções, no entanto, eram tão profundas que não ousava permanecer de posse daquelas coisas. Assim, passou a confessar seu pecado e a restituir o que havia furtado. Mas, à medida que cumpria seu intento, lembrava-se de mais e mais erros em que havia incorrido e continuava visitando-me para confessar o furto de quase todo tipo de objeto que uma jovem poderia desejar. Perguntei-lhe se a mãe sabia que ela possuía aquelas coisas. Respondeu que sim, mas que sempre dizia à mãe que eram presentes. Certa ocasião, ela disse-me: "Sr. Finney, acho que furtei um milhão de vezes. Vejo entre meus pertences coisas que sei que furtei, mas não posso lembrar-me de quem". Recusei-me totalmente a sugerir-lhe um meio-termo. Insisti em que ela restituísse tudo de que conseguisse lembrar a procedência ou que buscasse informação a respeito. Depois de cumprir minhas orientações, ela voltava para relatar o que fizera. Certa vez, perguntei-lhe o que as pessoas diziam.

— Algumas delas afirmam que sou louca, outras dizem que sou boba, outras ainda ficam muito emocionadas — ela respondeu.

— E todas perdoaram você? — eu quis saber.

— Oh, sim — disse ela. — Todas me perdoaram. Mas algumas acham que seria melhor eu não fazer o que estou fazendo.

Certo dia, ela contou-me que tinha consigo um xale que furtara de uma das filhas do então bispo de Nova York, Hobart, que morava na praça St. John, perto da Igreja de St. John. Como de costume, falei-lhe que devia devolver o xale. Poucos dias depois, ela voltou e relatou o que acontecera. Disse que dobrou o xale, embrulhou-o em papel e levou-o até a porta da residência do bispo. Tocou a campainha e, quando o empregado veio atender, entregou-lhe o pacote endereçado ao bispo. Não deu nenhuma explicação e saiu correndo até virar a esquina e entrar em outra rua, para evitar que alguém olhasse pela janela e descobrisse quem havia feito a entrega. Mas, depois de ter virado a esquina, a consciência a acusou e ela pensou: "Não agi de maneira correta. Outra pessoa pode ser acusada de ter praticado essa ação se eu não revelar ao bispo o que fiz". Com isso, deu meia-volta e pediu para falar com o bispo. Permitiram-lhe que o visse e ela foi levada ao gabinete dele. Então, confessou-lhe seu erro, bem como o que acabara de acontecer.

— E como o bispo a recebeu? — perguntei.

— Oh! — exclamou. — Quando lhe contei o que ocorrera, ele chorou, impôs a mão sobre minha cabeça e disse que me perdoava. E orou pedindo a que Deus me perdoasse também.

— E a partir de então você teve paz de espírito quanto ao problema? — inquiri.

— Oh, sim! — respondeu.

Esse processo continuou durante semanas — meses, penso eu. A jovem ia de lugar em lugar, em todas as partes da cidade, devolvendo as coisas que furtara e confessando o que fizera. Às vezes, sua convicção de pecado era tão grande que parecia que ela ia enlouquecer. Certa manhã, mandou-me um recado. Queria que eu fosse à casa de sua mãe. Fui e quando cheguei levaram-me ao quarto dela. Encontrei-a com os cabelos despenteados, caídos sobre os ombros, vestida descuidadamente, andando pelo quarto em atitude desesperada. Seu olhar alucinado indicava que ela estava quase enlouquecendo.

— Minha filha, qual o motivo dessa aflição? — perguntei. Enquanto caminhava, segurava na mão um Novo Testamento pequeno.

Voltou-se para mim e disse:

— Sr. Finney, furtei este Novo Testamento. Furtei a Palavra de Deus! Poderá ele me perdoar por isso? Não me lembro de quem o tirei. Foi de uma de minhas amigas da escola, mas faz tanto tempo que nem sequer me lembrava de que o havia furtado. Só hoje de manhã me dei conta disso e parece que Deus nunca irá perdoar-me por ter roubado sua Palavra.

Assegurei-lhe que não havia motivo para tamanho desespero.

— Mas, o que vou fazer? Não consigo lembrar-me de onde o tirei! — disse ela.

— Guarde-o como lembrança dos pecados que você cometia e leia-o agora, visando o bem que você pode alcançar com sua mensagem.

— Oh! — exclamou. — Se tão-somente pudesse me lembrar de onde o tirei, eu o devolveria de imediato.

— Se você se lembrar de onde o furtou, faça a restituição imediatamente. Devolva-o ou dê à pessoa de quem ele foi tirado outro do mesmo valor.

— Vou fazer isso, com certeza! — garantiu ela.

Todo esse processo emocionava-me muito. O estado de ânimo que resultava desse tipo de relacionamento era realmente maravilhoso. O resultado foi uma verdadeira humildade, um profundo conhecimento da própria condição e de seus pecados, um coração quebrantado, um espírito contrito e, finalmente, fé, alegria, amor e paz como um rio. Ela tornou-se uma das jovens crentes, mais encantadoras que alguma vez conheci.

Quando se aproximou a data combinada para minha partida de Nova York, fiquei pensando que alguém na igreja devia tomar conhecimento do que acontecera com aquela jovem, para que lhe pudesse prestar assistência. Àquela altura, tudo que fora conversado entre nós eu mantinha em segredo. No entanto, na véspera de minha partida, narrei ao irmão Phelps o que acontecera e ele ficou muito emocionado com a história e disse-me: "Irmão Finney, apresente-a a mim. Vou tornar-me amigo dela. Vou vigiar seus passos, para o bem dela". E assim ele fez, como fiquei sabendo posteriormente. Há muitos anos não vejo aquela jovem — acho que, depois de ter relatado o caso ao sr. Phelps, não a vi mais. Mas quando retornei de minha última viagem à Inglaterra, ao visitar uma das filhas do sr. Phelps, agora uma senhora casada vivendo na cidade de Nova York, ela mencionou o assunto no decurso de nossa conversa, a propósito de alguma coisa. Perguntei-lhe, então:

— Seu pai apresentou você àquela jovem?

— Oh, sim! Todas nós a conhecíamos — ela respondeu, referindo-se, penso eu, às mulheres da família.

— E o que você sabe a respeito dela? — perguntei.

— Oh! — ela exclamou. — É uma cristã muito sincera. Está casada e seu marido é comerciante nesta cidade. É membro da igreja e mora naquela rua. — E indicou o lugar, que ficava perto de onde estávamos.

Eu ainda quis saber:

— Ela tem demonstrado um caráter cristão firme?

— Oh, sim! É uma mulher excelente, de oração — foi a resposta.

Fui informado também — não me lembro como — de que ela, depois de sua conversão, nunca mais se sentiu tentada a furtar, nunca mais soube o que era ter semelhante desejo.

Aquele avivamento preparou o caminho em Nova York para a organização das igrejas presbiterianas independentes, compostas principalmente dos convertidos durante o avivamento. Muitos deles tinham pertencido à igreja da rua Prince. Depois de eu deixar a congregação na rua Prince, o rev. Herman Norton foi investido como seu pastor. Mais tarde, por algum motivo, ele deixou o trabalho, o templo foi vendido, vindo a igreja a desfazer-se e os membros filiaram-se em outras igrejas.

Para esclarecer muitas coisas que terei de revelar mais tarde, nesta altura da minha narrativa devo oferecer um breve relato das circunstâncias que envolveram a conversão do irmão Lewis Tappan e sua posterior relação com o trabalho por mim empreendido. Ele mesmo contou-me o que aqui exponho. Sua conversão ocorreu antes de eu o conhecer pessoalmente, nas circunstâncias que descrevo a seguir.

Ele era unitarista e vivia em Boston. Seu irmão, Arthur, grande comerciante de grãos e farinha em Nova York, era um cristão sincero e ortodoxo. Os avivamentos na parte central do estado de Nova York haviam causado um rebuliço entre os unitaristas. Os jornais, principalmente os publicados por eles, criticavam os avivamentos. Em especial, circulavam histórias estranhas, as quais retratavam-me como um fanático meio enlouquecido. Essas histórias haviam sido relatadas a Lewis Tappan pelo rev. Henry Ware Jr., ministro unitarista de destaque em Boston e Lewis acreditou nelas. Muitos dos principais unitaristas da Nova Inglaterra e de todo o Estado de Nova York davam crédito àqueles boatos.

Enquanto as histórias circulavam entre o povo, Lewis Tappan visitou seu irmão Arthur em Nova York e a conversa desviou-se para o tema do avivamento. Lewis ressaltou diante de Arthur o estranho fanatismo que se dizia ligado aos avivamentos, principalmente o que era dito sobre mim. Asseverou que eu proclamava publicamente ser "o general-de-brigada de Jesus Cristo". Circulavam histórias semelhantes a essa e Lewis insistia em que eram verídicas. Arthur não acreditava em nenhuma delas e declarou a Lewis que eram inventadas e que ele não devia dar-lhes crédito.

Confiando nas declarações do sr. Ware, Lewis quis apostar quinhentos dólares como conseguiria comprovar a veracidade daquelas histórias, principalmente a de que eu me apresentava como o "general-de-brigada de Jesus Cristo". Arthur replicou: "Lewis, você sabe que não faço apostas, mas vou lhe dizer o que farei. Se você conseguir provar, com um testemunho confiável, que essa história é verdadeira e que é verdadeiro o que se diz do sr. Finney, eu lhe darei quinhentos dólares. Ofereço essa quantia para que você investigue. Quero que você saiba que essas histórias são falsas e que sua fonte não é digna de confiança".

Sem duvidar de que pudesse apresentar as provas, já que as histórias eram sustentadas com tanta firmeza pelos unitaristas, Lewis enviou uma carta ao rev. Pierce, ministro unitarista de Trenton Falls, Nova York, indicado pelo sr. Ware, autorizando-o a gastar até quinhentos dólares na busca de testemunho suficiente para comprovar as histórias — testemunho que, se fosse apresentado no tribunal, levasse o réu à condenação.

O sr. Pierce empreendeu a busca às evidências. Depois de muito esforço, porém, nada conseguiu oferecer a Lewis, a não ser um artigo publicado num jornal universalista, impresso em Buffalo, no qual o autor asseverava que o sr. Finney alegara ser "o general-de-brigada de Jesus Cristo". Mas, não conseguiu obter, em lugar nenhum, a mínima comprovação de que eu falara as coisas a mim atribuídas na reportagem. Todos tinham ouvido dizer e acreditaram que eu dissera aquelas coisas em algum lugar e o sr. Pierce procurava provas de cidade em cidade por meio de correspondência, mas, não conseguiu comprovar aquelas afirmações em lugar algum.

Lewis contou-me que esse fato, juntamente com outros assuntos, o levou a pensar seriamente a respeito da natureza da oposição e da fonte daquelas histórias. Embora soubesse da ênfase atribuída pelos unitaristas àquelas histórias e como eram usadas como arma de oposição ao avivamento de Nova York e de outros lugares, sua confiança neles foi abalada. Assim, abrandaram-se seus preconceitos contra os avivamentos e contra os crentes ortodoxos e sua confiança na oposição unitarista desmoronou totalmente. Sentiu-se levado a analisar com muito cuidado e seriedade as obras teológicas publicadas pelos cristãos ortodoxos, comparando-as com as dos unitaristas. Como resultado, sentiu-se obrigado a abandonar suas opiniões unitaristas e aceitar os conceitos ortodoxos. A mãe dos Tappans era uma mulher muito piedosa e de oração. Nunca tivera a mínima simpatia pelo unitarismo. Vivera uma vida de muita oração e deixara nos filhos uma impressão muito forte.

Quando a confiança de Lewis Tappan nas doutrinas unitaristas e na oposição destes aos avivamentos e aos métodos empregados para levar pessoas à conversão foi abalada, seus ouvidos abriram-se para a verdade, o que resultou em sua conversão a Cristo. Sua oposição havia sido ferrenha e ele acreditava piamente que os supostos exageros e extravagâncias ocorridos nos avivamentos eram reais e que o unitarismo era a verdade. Seu irmão, Arthur, desejava muito que Lewis passasse a confiar na fé ortodoxa. Queria também trazê-lo à influência evangélica, a fim de levá-lo à conversão. E, logo que Lewis se converteu, tornou-se tão firme e zeloso no apoio às opiniões ortodoxas e aos avivamentos religiosos quanto se mostrara na oposição a eles.

Pelo que entendi, pouco depois de sua conversão foi para Nova York e tornou-se sócio de Arthur. Foi quando o conheci e tinha bastante amizade com o irmão. Próximo à minha saída de Nova York, depois de meus primeiros trabalhos ali, o irmão Tappan e vários outros bons irmãos mostraram-se insatisfeitos com a situação espiritual da cidade. Depois de muita oração e consideração, resolveram organizar uma nova igreja e introduzir novos métodos para levar as pessoas a Cristo. Conseguiram um local para realizar cultos e chamaram o rev. Joel Parker, então pastor da Terceira Igreja Presbiteriana em Rochester, para ajudá-los.

O irmão Parker chegou a Nova York e começou a trabalhar, penso que exatamente quando encerrei minha atuação na rua Prince. A igreja em Rochester ficou sem pastor. Em Nova York, então, organizaram a Primeira Igreja Presbiteriana Independente e o rev. Joel Parker ficou sendo seu pastor. Atuavam especialmente entre as pessoas que não tinham o hábito de freqüentar cultos e foram muito bem-sucedidos. Acabaram mobiliando o andar superior de alguns armazéns na rua Dey, de modo a acomodar uma grande congregação e ali continuaram os trabalhos.