O CORAÇÃO DE QUEM TEM SAUDADE

“Apalpamos as paredes como cegos; sim, como os que não têm olhos andamos apalpando”, Is.59:10

Neste mundo todos têm algo em seus corações. Na verdade, todos querem algo que deixaram para trás, todos desejam algo que as leis da vida não permitem ou pelas circunstâncias, ou por decisões que tomamos acertadamente. Uns deixam pais e mães para trás de si, outros deixaram casa e conforto, enquanto que outros têm mesmo de se separar de seus próprios filhos que ajudaram a gerar. No entanto, por muito penoso que sejam tais coisas, deveríamos olhar melhor não só para o egoísmo de tais sentimentos, mas antes para outras coisas também – e com muita perspicácia e precisão.

Tem um Ser ignorado neste nosso universo, que nunca nos abandona caso o achemos como Ele é. Não estou falando aqui de crença nem de fé de crente que sabe em que crê mas sem que seja real para ele fora da sua imaginação. Muitos se confortam apenas com a ideia de que Deus possa estar com eles e não se sentem em casa na Sua própria presença de forma real. Elias dizia: “Deus, em cuja presença estou…”

Ora, se o egoísmo nos faz pensar que amamos quando queremos é amar para ser amados, (não que não possamos ser amados, pois nós sermos amados será pura decisão de outros seres e não nossos, como amar aos outros será nosso único trabalho e obra), se é verdade que quem diz que ama busca seu próprio conforto e nunca o de quem dele precisa, podemos assumir que se pode amar por nossos familiares e pelo amor que Deus lhes tem também e não por nós próprios. A saudade é uma forma de amor-próprio que nunca se sabe expressar nem ser honesto – a menos que as circunstâncias possam obrigar a tal. A presunção também faz achar que seremos os únicos a poder fazer nossos familiares estarem bem. Na verdade, quando se busca o bem de quem amamos, buscaremos antes quem os possa assistir no que necessitam e acima de sermos nós a poder fazê-lo, caso O achemos pessoalmente também. Só há uma Pessoa que pode estar comigo sempre e com quem está distante de mim ao mesmo tempo – por eles e não por mim.

Se amassemos de verdade, buscaríamos quem pudesse assistir quem prezamos e amamos acima de querer estar com eles. O Senhor Jesus, um dia, chamou seus discípulos e os enviou uns para umas cidades, outros para outras e deu-lhes directrizes claras sobre o que deveriam ir lá fazer, Mat.10. Eles obedeceram e saíram cada qual para seu destino, deixando tudo para trás. Só que, nenhum deles sabia o que o próprio Jesus iria fazer quando eles houvessem saído dali e se houvessem ido. Creio mesmo que durante os meses ou os dias de ausência de suas próprias cidades, nem sequer iriam saber o que aconteceu com os seus – apenas sabiam que havia sido Jesus quem os enviara para longe deles.

No capítulo seguinte às instruções sobre suas tarefas, lemos assim: “Tendo Jesus acabado de dar instruções aos seus discípulos, Ele partiu dali a ensinar e a pregar nas cidades deles”, Mat.11:1. Se eu amasse meu próximo e minha família de facto, quanto eu desejaria que fosse Jesus a estar com eles em vez de ser eu que nem meu próprio fôlego possuo! Amar nossas famílias nem será desejar estar com eles, mas que Jesus vá ter com eles. E Jesus irá ter com eles se eu Lhe for obediente em busca das famílias de pessoas que nem conheço, os quais também foram obedientes a Jesus.

Conquanto isto seja um facto e nunca apenas uma crença que conforta enganosamente, vemos aqui que a única pessoa que pode realmente assistir quem prezamos e amamos, é precisamente a Pessoa mais ignorada de todo o Universo. E quando não ignorada, é apenas desejada por motivos obscuros e egoístas. É por essa razão que um coração que pensa mas não sobriamente, que ama mas ama mais a si mesmo, sente mas para se obscurecer e cegar quanto a realidades factuais, presume mas falsamente, é esse mesmo coração que se pode recusar a ver as evidências desta vida, encarando-as de frente e sobriamente, pois o que quer é ser amado acima de amar de facto. Lemos que “Deus é amor”, 1 João 4:8. Nunca ninguém conseguirá amar a menos que conheça o amor. Logo, quem não experimenta Deus factualmente, nunca saberá amar outro ser a não ser a si mesmo da maneira correcta, pois anda “apalpando as paredes como cego” que quer sentir para ter motivos para seguir adiante. “Amados, amemo-nos uns aos outros, porque o amor é de Deus; e todo o que ama é nascido de Deus e conhece a Deus. Aquele que não ama não conhece a Deus; porque Deus é amor”, 1João 4:7-9.

Queremos dizer aqui que não é agradável estar perto dos nossos? Não, de maneira nenhuma. Mas a verdade será que, mesmo estando perto dos nossos, nossas próprias mãos nunca os livrarão de falecer, de sofrer e de algo muito mau lhes vir a suceder. Quantas mães já assistiram à morte de seus filhos de forma impotente? Então devemos buscar e achar Deus por causa dos nossos? Não, também não! Que tal buscar Deus por Ele? O Ser mais querido deste universo, a única fonte do verdadeiro amor é a pessoa que mais se ignora e mais se busca por interesse. Seria bom que sentisse, também, um desejo igualmente enorme de conhecer seu Criador – tal como deseja de estar com os seus que não são seus, mas antes de seu Criador. Já basta de tratar nosso Criador como um objecto que existe apenas em nossas mentes. Amem.  

José Mateus
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